Escritora Priscilla Warner dá a dica: escrever para acalmar e escapar do pânico

Um trauma sofrido quando tinha 15 anos fez a escritora norte-americana Priscilla Warner ser atormentada por mais de quatro décadas pela síndrome do pânico

por Rafael Campos 14/02/2014 15:22

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Apesar de ter uma família estruturada e um emprego de sucesso, um trauma sofrido quando tinha 15 anos fez a escritora norte-americana Priscilla Warner ser atormentada por mais de quatro décadas pela síndrome do pânico. “Meu coração acelerava, meu peito se contraía e eu sentia que não conseguia respirar. Minha garganta parecia que ia fechar, meu corpo ficava tenso e suado. A sensação é de que ia morrer”, conta. Antes dependente de medicamentos fortes, como o Valium e o Rivotril, além de vodca, ela encontrou a paz interior em terapias alternativas orientais, na meditação e na neurociência. Sua trajetória é contada no livro Respirar, meditar, inspirar (Editora Valentina), lançado este mês no Brasil. Em entrevista à Revista, a autora fala sobre como encontrou seu meio-termo para viver com a ansiedade e o que aprendeu com ela.

A senhora teve uma vida boa. Mesmo assim, sofreu por vários anos por conta da ansiedade. Por que acha que isso aconteceu?
A ansiedade produz muita energia. A fim de queimar essa energia, eu era uma pessoa ocupada, com uma carreira de sucesso, muitos amigos, muitas atividades e, felizmente, um marido dinâmico e filhos encantadores. Muitas pessoas que sofrem de ansiedade são grandes empreendedores, talvez porque sejamos extremamente duros com nós mesmos. Eu me forcei a ter sucesso em muitas áreas da minha vida, talvez para compensar o que eu sentia ser minha fraqueza — a ansiedade. E para mostrar uma cara corajosa para o mundo. Pensei que, se eu parecia bem do lado de fora, talvez ia começar a me sentir bem no interior. Mas, finalmente, percebi que não estava funcionando.

Quais tratamentos a senhora buscou para viver com sua ansiedade antes de encontrar a meditação?
Fiz psicoterapia para tentar entender por que estava tão ansiosa. Foi útil para falar sobre a história da doença mental em minha família e vários eventos que desencadearam a minha ansiedade. Eu me exercitava e tentava comer direito, sem muito açúcar, cafeína e álcool. Tomei medicação anti-ansiedade. Mas só quando escrevi este livro achei tipos específicos de terapia que abordavam as sensações físicas que a ansiedade estava produzindo no meu corpo. Aprendi a regular essas sensações. Agora, tomo pouca medicação porque reforcei a conexão entre o corpo e a mente.

Reprodução de internet
'Meu coração acelerava, meu peito se contraía e eu sentia que não conseguia respirar. Minha garganta parecia que ia fechar, meu corpo ficava tenso e suado. A sensação é de que ia morrer' (foto: Reprodução de internet)
A senhora acredita que a meditação é um bom caminho para todos os ansiosos? Por quê?

Acredito. O neurocientista que escaneou meu cérebro para o estudo no meu livro disse que a meditação é como um levantamento de peso do cérebro. Ela o treina para deixar de lado pensamentos que, caso contrário, fariam a mente ficar distraída e atormentada. Eu me sinto empoderada pela minha prática de meditação. Tenho a confiança que, mesmo em um dia atarefado, consigo sentar com meus pensamentos e deixá-los ir. Sinto uma conexão tranquila entre meu corpo e minha mente. No meu livro, os exames de ressonâncias magnéticas mostraram um aumento da circulação sanguínea em certas partes do meu cérebro ao longo de um período de oito semanas em que eu meditava. Em outras palavras, há um efeito causado pelo treino constante. Você pode se tornar mais hábil se viver com a mente clara. E uma mente clara leva a uma vida mais calma e focada.

O que você costumava sentir nos seus ataques de pânico?
Durante um ataque de pânico, meu coração acelerava, meu peito se contraía e eu sentia que não conseguia respirar. Minha garganta parecia que ia fechar, meu corpo ficava tenso e suado. A sensação é de que ia morrer. Com o tempo, fiquei com tanto medo de ter um ataque de pânico no trabalho ou em um lugar público que sempre carregava uma pequena quantidade de vodca comigo. Se eu tomasse um gole, meus pulmões pareciam banhados em um brilho especial. Parava o pânico, mas apenas temporariamente. Estava sempre com medo de que pudesse ter um ataque desses na frente dos amigos ou dos colegas de trabalho. Tomei medicação, mas ela me deixava cansada. Perdi a confiança em mim mesma porque achava que tinha um sistema nervoso com defeito. Como muitas pessoas com ansiedade, sofri em silêncio porque tinha vergonha de admitir meus medos, até mesmo para os entes queridos.

Como é sua vida agora?
Agora eu sei que eu sou apenas um ser humano! Todos nós experimentamos a felicidade, mas também ansiedade, mágoa, tristeza e medo. Estudar com mestres budistas me ajudou a ver que a vida pode ser muito desafiadora e difícil. Mas as terapias que procurei, juntamente com a meditação, me ajudaram a regular a respiração de meu corpo e a responder a situações de ansiedade. Agora tenho certeza de que qualquer ansiedade que sinto não vai me prejudicar ou chegar ao ponto de crise que costumava causar. Minha mãe morreu há três semanas, depois de uma longa luta contra o Alzheimer. Estou triste, mas percebo que essas emoções são simplesmente parte da vida. Eles são, na verdade, um belo exemplo de minha conexão com o mundo inteiro. Cada momento que vivenciamos vem e vai. Isso é um conforto para mim. Todos os momentos passam, mesmo os mais difíceis.

Como a meditação entrou em sua vida? E quando a senhora começou a sentir que ela a ajudava?

Li sobre um jovem monge tibetano que teve ataques de pânico na infância, Yongey Mingyur Rinpoche. Ele veio aos EUA e fui ao meu primeiro retiro meditativo com ele. Por cinco dias, lutei para ficar em silêncio e com a mente quieta. Ele me ensinou como meditar de uma forma a deixar a mente aberta, sem precisar ser dura comigo mesma. Ensinou-me também a variar minhas práticas meditativas de acordo com meu humor do dia — com olhos abertos ou fechados, enquanto estivesse sentada, andando ou deitada. Ao fim do primeiro retiro, dirigi até minha casa com um senso de calma e leveza que jamais havia sentido, somente quando tomava medicamentos para controlar minha ansiedade. Dentro de cerca de três semanas, depois de meditar todos os dias por 20 a 30 minutos, comecei a sentir uma confiança que a meditação poderia ajudar a equilibrar o meu humor. Em três meses, eu senti uma verdadeira convicção de que esta prática estava fazendo diferença na minha vida.

A senhora acha que a ansiedade pode ser bem usada?
Definitivamente, a ansiedade tem um propósito na vida. Eu realmente tive de me ajustar para ser mais calma. Eu me preocupava que a ansiedade fosse o fator motivacional na minha escrita, no meu nível de energia e nos meus relacionamentos pessoais. Pensei que ficar calma seria chato e que eu ficaria apenas sentada, sem fazer nada. Mas agora eu vejo que a calma me dá uma clareza emocional que me ajuda a decidir quanto devo gastar energia em alguém ou em alguma atividade. A ansiedade pode me inspirar a fazer coisas positivas agora, em vez de dar voltas em círculos sem propósito ou foco. A meditação me tornou uma pessoa menos reativa. Cria um espaço entre as suas emoções e as reações.

Os transtornos de ansiedade

De acordo com o DSM V, quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA, na sigla em inglês) e considerado a bíblia da psiquiatria, são 12 os transtornos de ansiedade. A reformulação apresentada em 2013 retirou o transtorno obsessivo-compulsivo da lista, criando uma categoria exclusiva para ele. Abaixo, veja mais sobre os tipos.

1) Transtorno de ansiedade de separação: ansiedade em excesso que envolve o distanciamento de casa ou de pessoas importantes;

2) Mutismo seletivo: transtorno psicológico que tem como característica a recusa em falar em situações determinadas;

3) Fobia específica: medo recorrente e persistente de um objeto ou circunstância específica, desencadeando uma reação ansiosa extrema;

4) Fobia social: caracteriza-se por manifestações de alarme, tensão, medo e desconforto quando o paciente é exposto à avaliação social;

5) Síndrome do pânico: transtorno de ansiedade em que acontecem ataques repetidos de medo de que algo ruim possa acontecer inesperadamente;

6) Ataque de pânico: período inesperado de medo intenso e desconforto. Os sintomas — variáveis — são sensação de desespero, ondas de calor, dificuldade em respirar, náusea, entre outros;

7) Agorafobia: medo de estar em espaços abertos ou em meio à multidão;

8) Transtorno de ansiedade generalizada: estado de ansiedade excessiva e persistente, independentemente do contexto, e com repetição por, pelo menos, seis meses;

9) Transtorno de ansiedade induzido por substância: transtorno derivado dos efeitos fisiológicos diretos de uma substância — drogas, medicamentos etc.

10) Transtorno de ansiedade devido a uma condição médica geral: ansiedade considerada derivada dos efeitos fisiológicos diretos de uma condição médica geral;

11) Outros transtornos de ansiedade específicos;

12) Transtorno de ansiedade não específico.