Do metal ao rock cristão, Bauxita é um dos cantores mais ecléticos de BH

Músico retomou a banda black Dance Club, toca em igrejas evangélicas e tem a Bíblia como parceira

por Mariana Peixoto 06/06/2018 08:00
Túlio Santos/EM/D.A Press
"Se fui para Deus, por que só posso cantar dentro da igreja? Quando um padeiro se converte, ele não vai vender só pão crente. O açougueiro não vai vender só carne gospel.%u201D (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)

Sertanejo e pagode, não. Mas Bauxita já cantou (quase) tudo: MPB, rock, blues, soul, jazz, pop, progressivo, metal, reggae. Aos 49 anos – 32 como cantor profissional –, Ronald Hercules Messeder Esquerdo continua na ativa. Agora em duas frentes musicais: secular e cristã.

Há cinco anos integrante da Igreja Batista da Lagoinha – “convertido, batizado, larguei tudo para trás” –, Bauxita continua presente na noite de Belo Horizonte. Integra seis bandas, uma das quais reestreia na quinta-feira (7), no Distrital do Cruzeiro.

Formado em 1996 para tocar música dançante de primeira, o Dance Club contava com Adriano Campagnani (baixo), Guilherme Fonseca (guitarra), Jelber Oliveira (teclados) e Mário Castelo (bateria). Bauxita e Play dividiam os vocais. Completavam o time os dançarinos Sandro e Dalmo. A banda durou seis anos. Está parada há mais de 10, mas bastaram algumas conversas para que os músicos decidissem retornar com o Dance Club.

Esta semana, o combo se reúne para nova temporada de shows, que serão mensais (sempre às quintas-feiras), no Distrital. Morto em 2005, Castelo será substituído por Marcelo Ricardo. Jelber, que hoje mora na Bahia, aceitou participar do retorno – só não poderá vir à estreia e os teclados ficarão a cargo de Will Motta. “Soul, jazz, blues, a gente vai tocar de tudo. Michael Jackson, Marvin Gaye e James Brown, mas também Justin Timberlake e Bruno Mars para dar uma atualizada”, conta Bauxita.

Dono de voz potente, cantor de personalidade (se não a melhor voz masculina da geração 90 de BH) e com performance de palco à altura, Bauxita sempre fez de tudo um pouco. Atualmente, na seara dos covers, ele integra os grupos Rock Machine (rock clássico), Black Belt (rock e soul, com Glauco Mendes, baterista do Pato Fu) e Stratégia (reggae, samba-rock e MPB, com os irmãos Dinho e Alexandre Mourão, da antiga Omeriah). Também tem um projeto acústico e o Chazohn, banda cristã de rock pesado.

“A igreja sou eu, é você, não é um prédio. Jesus me deu a liberdade de fazer o que quiser. Só não faço nada para escandalizar a minha fé e a fé do outro. Canto Stairway to heaven (Led Zeppelin), que, pra mim, é música mais cristã do que muitas outras (realmente cristãs), mas não canto Sympathy for the devil (Rolling Stones)”, comenta.

ESFINGE Bauxita começa a contar sua carreira a partir dos 17 anos, quando formou o grupo Esfinge, “praticamente um Iron Maiden em português”. Como todo músico da noite, passou por diferentes bandas – Tridente, Tribo de Solos, Censura Livre, Beijo de Língua. Conseguiu destaque além do cenário cover quando integrou o Sagrado Coração da Terra. O grupo de rock progressivo criado por Marcus Viana teve repercussão internacional – Bauxita foi o cantor escolhido para interpretar o repertório do principal álbum do grupo, Grande espírito (1993).

Na carreira solo, cantou blues (época em que viajava com os grandes do gênero no país, Celso Blues Boy e Blues Etílicos), abriu para Ray Charles. Participou de bandas autorais mais pop (Jam Pow!) e de rock (Código B) que tiveram alguma repercussão.

Foi cabeludo, só vestiu preto, descoloriu o cabelo, emagreceu, engordou. Bauxita admite ter ouvido, mais de uma vez, que sua carreira poderia ter ido muito além do que chegou. “Já entrei em depressão por conta disso. Vários amigos fazendo sucesso, as pessoas falando que eu poderia estar lá. Hoje, acredito que tudo tem o seu tempo. Há uma música do Felipe Valente, que é cristão, que diz que o maior inimigo que temos somos nós mesmos. Vou aprendendo a lidar com esse inimigo. Muitas vezes, eu próprio me sabotei”, revela.

O cantor prefere não olhar para trás. “Estava arrebentado, deprimido, cheguei a pesar 54 quilos. Até que um amigo me chamou para ir para a (igreja) Batista da Lagoinha”, conta. Quando ouviu a proposta, Bauxita respondeu: “Crente? Não vou mesmo. Sou católico de pai e mãe. Espírita kardecista, candomblé, Santo Daime, já fui tudo, até macumbeiro.”

Só que ele decidiu aceitar o convite. Chegou num domingo, bastante debilitado. Emocionou-se de tal forma que até desmaiou. “Comecei a ir à igreja de segunda a segunda. Fui eliminando práticas antigas, drogas, mulherada, para me concentrar no processo de transformação.” Deixou todas as bandas. Música, naquele momento, só na igreja. A mudança foi tal que até curso de teologia ele fez.

BÍBLIA Mais forte, há três anos Bauxita descobriu que poderia voltar. Não da maneira de antes, mas “melhor”. “Minha voz melhorou. Hoje malho, pedalo, corro. Tomo uma cervejinha de leve, uma tacinha de vinho, pois o que a Bíblia condena é a embriaguez. Tenho estudado música, faço fonoaudiologia, não abuso mais. Outro dia, foram três shows na mesma noite (num deles, reuniu-se com Wilson Sideral, Affonsinho e Alexandre Araújo para uma noite de jazz e blues, em um festival em Ouro Preto).

Bauxita entende que é possível ter uma carreira fora da igreja. “Existe preconceito tanto de quem está fora da igreja quanto de quem está dentro. Quando comecei a cantar fora, o pessoal da igreja passou a me escalar menos. Outro dia, cheguei a falar que isso é sacanagem. Vivo e sempre vivi da minha voz, ela paga minhas contas. Se fui para Deus, por que só posso cantar dentro da igreja? Quando um padeiro se converte, ele não vai vender só pão crente. O açougueiro não vai vender só carne gospel.”

Hoje, Bauxita lida muito bem com os repertórios secular e cristão – com o Chazohn, aliás, vem preparando um álbum de músicas autorais. “Não vou cantar nada que vá ofender minha crença. Canto Come together (Beatles), Sunday bloody sunday (U2)... E Kashmir, pois Led Zeppelin é um divisor de águas na minha vida”, conclui.



BAUXITA E DANCE CLUB
Show na quinta-feira (7), a partir das 20h. Distrital do Cruzeiro, Rua Opala, s/nº. Ingressos: R$ 20. Informações: (31) 3284-0709

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