A ciência dos fito-hormônios no tratamento dos sintomas climatéricos

O novo olhar sobre a terapia de reposição hormonal liga-se aos riscos dos hormônios para mulheres no climatério, e outra percepção sobre plantas medicinais

Dungthuyvunguyen/Pixabay
(foto: Dungthuyvunguyen/Pixabay )

O período do climatério é identificado por inúmeras transformações e mudanças nos aspectos biopsicossociais que, se mal conduzidas, podem prejudicar a qualidade de vida e o bem-estar psicológico no dia a dia da mulher.

Apesar do climatério (período que se inicia aos 45 anos) ser representado pela diminuição dos níveis dos hormônios estrogênio e progesterona nas mulheres, levando à interrupção da menstruação e possíveis sintomas associados, como ondas de calor, secura vaginal e depressão, sua medicalização vem ocorrendo desde as últimas décadas do século 20, através da terapia de reposição hormonal (TRH).

A TRH é hoje reconhecida como o tratamento mais eficaz para redução ou eliminação dos sintomas do climatério, proteção óssea e cardiovascular, quando bem indicada e individualizada.

Menos de 20 anos depois do início da TRH, ela foi colocada em questão pela Women's Health Initiative (WHI), promovida, em 1991, pelo National Institute of Health (NIH) do governo dos Estados Unidos.

Em uma de suas pesquisas, o WHI alertava para os riscos de doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral, assim como trombose e câncer de mama associados à TRH, afirmando que os riscos eram, em muitos casos, superiores aos benefícios de alívio dos sintomas relacionados ao climatério.

A divulgação dos resultados desta pesquisa provocou forte reação da comunidade médica, gerando trabalhos sobre procedimentos e validação de outros recursos terapêuticos em substituição à TRH, principalmente plantas medicinais e alimentícias, utilizadas por diferentes sistemas médicos tradicionais, além dos questionamentos da pesquisa em medicina, como podemos ver pelos títulos destas publicações:

Como nós poderíamos estar tão errados? (Laine, 2002)

TRH X WHI: a estrela vai a nocaute (Gama ET Al., 2004)

Após a divulgação dos dados do WHI, houve muito interesse e procura pelos "hormônios naturais", com o viés de que, por serem naturais, não ofereceriam qualquer risco à saúde da mulher.

É importante ressaltar que tal evento se dá no contexto fortemente influenciado por uma visão de mundo intimamente articulada aos valores da liberdade sexual e da experiência sensível, expressando nesta direção o interesse e busca por práticas terapêuticas ligadas à natureza e a antigos sistemas médicos, como a Medicina tradicional chinesa (MTC), ayurveda, xamanismo, entre outros, reinterpretados e reapropriados culturalmente aos padrões ocidentais.

Uma das alternativas para a terapêutica de reposição hormonal ficou conhecida como "fito-hormônios", isto é, substâncias de origem vegetal com características hormônios-like.

No Brasil, cerca de 82% da população utiliza produtos baseados em plantas medicinais.

As principais plantas medicinais utilizadas como matérias-primas são: a Angelica sinensis (Oliv.) Diels, Cimicifuga racemosa (L.) Nutt., Glycine max (L.) Merr. (soja) e Dioscorea villosa L. (cará ou inhame), entre outras espécies.

Desta forma, as plantas medicinais utilizadas no tratamento do climatério em seu estado in natura - na forma de drogas vegetais secas rasuradas para serem administradas como chás, percebidas como produtos naturais que fomentaram o mercado das medicinas alternativas - não seriam, neste momento, suficientemente "científicas" para atender aos novos critérios de médicos e pacientes.

Alguns grupos de médicos e pacientes buscavam medicamentos "naturais", mas que tivessem sido submetidos ao processo técnico-científico para atender aos critérios de qualidade e segurança, segundo as especificações de controle de qualidade dos produtos fabricados em grandes laboratórios farmacêuticos.

Além de atender a tais critérios, o novo produto deveria, ao mesmo tempo, contemplar o modelo de precisão de "doses regulares" da biomedicina, sintetizando assim a cadeia de produção que envolvia os processos de purificação, quantificação e padronização de um novo medicamento.

Tal produto deveria ser originário de uma planta medicinal com conhecimento tradicional agregado, manter as características principais da planta de origem e atender às expectativas do paradigma mecanicista da biomedicina de "doses regulares", como um balizador de segurança e eficácia.

Esse preparado, denominado "extrato seco padronizado", foi resultado de purificações da planta, que teoricamente deveria conter as substâncias originais da espécie vegetal, porém melhoradas em sua performance químico-biológica, além de ter substâncias químicas de referência, com quantidades regulares, permitindo assim ao clínico prescrever o medicamento segundo estas substâncias de referência e, não necessariamente, pelas características da planta de origem.

A quantificação e a padronização passaram a ser atributos fundamentais nesta nova abordagem das plantas medicinais, atendendo a um só tempo os critérios de controle de qualidade de uma indústria farmacêutica e ao paradigma da biomedicina de doses regulares.

No processo de desenvolvimento do extrato seco padronizado, redes de pesquisa foram articuladas em diversas áreas de conhecimento, envolvendo profissionais com formação em etno-farmacologia, agronomia, botânica, fitoquímica, farmacologia e medicina.

A literatura leiga tem reservado grande espaço para os fitoestrogênios, substâncias à base de isoflavonas, sendo obtidas a partir do metabolismo da soja, com ação comprovada nos receptores estrogênicos.

No caso da soja (Glycine max), por exemplo, sua utilização como preventiva nos sintomas associados ao climatério partiu da observação da ligação entre o hábito alimentar nas populações de mulheres de origem japonesa e a baixa frequência de sintomas da menopausa, quando comparadas com mulheres ocidentais.

O consumo de soja na alimentação é saudável como aporte proteico, porém, não deve ser consumida como substituta do estrogênio, hormônio responsável pela reposição hormonal em mulheres menopausadas, como defendido por algumas sociedades médicas, como a Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, que faz questão em esclarecer que, mesmo possuindo propriedades naturais, podem apresentar ações deletérias, devendo ser utilizados para proporcionar alívio dos sintomas.

Estudos randozimados com grupo controle já demonstraram que o uso de soja para este fim não promove ganho de massa óssea, não protege o coração e os efeitos nos chamados 'fogachos', os calores, são autolimitados ou muitas vezes insuficientes.

A legislação brasileira passou a incentivar, nos últimos anos, a busca por novas alternativas, criando a Relação de Medicamentos Essenciais; indicados pelo Manual de Atenção à Mulher no Climatério, desde 2008.

Na busca do alívio dos sintomas e a partir do conhecimento dos efeitos colaterais da terapia de reposição hormonal, muitas mulheres recorrem à terapia alternativa, usando, como tratamento, os fitoterápicos e os fitormônios na regulação da produção hormonal, melhora da falta de libido, cansaço físico e mental e melhora dos sintomas da menopausa.

Segue algumas plantas medicinais utilizadas no combate dos sintomas climatéricos:

1. Erva-de-São-Cristóvão (Cimicifuga racemosa)

Esta planta é conhecida por auxiliar em aliviar as cólicas menstruais, porque é anti-inflamatória, anti-espasmódica e contém fitoestrogênios, mas não deve ser usada ao mesmo tempo que o tamoxifeno.

2. Árvore-da-Castidade (Vitex agnus-castus)

Restabelece o equilíbrio hormonal, atuando sob a glândula pituitária, e aumenta a produção de progesterone, mas não deve ser usada em caso de uso de bromocriptina.

3. Agripalma (Leonurus cardíaca)

Esta planta é emenagoga, por isso facilita a descida da menstruação, sendo potencialmente abortiva, não devendo ser usada em caso de suspeita de gravidez. Ela também protege o coração e tem propriedades calmantes e relaxantes, mas não deve ser usada ao ingerir medicamentos antipsicóticos e anti-inflamatórios não esteroides.

4. Pé-de-leão (Alchemilla vulgaris)

É eficiente para cessar a menstruação abundante que, para muitas mulheres, é comum durante o período do climatério, podendo ser combinada com outras plantas, como Angelica chinesa (Dong quai) e Cohosh-preto para um efeito mais rápido.

5. Ginseng siberiano (Eleutherococcus senticosus)

Auxilia na manutenção do bom humor, é antidepressivo e ajuda a recuperar a libido perdida. Além disso, essa planta ajuda a mulher a se adaptar às mudanças hormonais, diminuindo o estresse e aumentando a energia.

6. Amora Negra (Morus Nigra L.)

As folhas da amoreira auxiliam no combate aos sintomas da menopausa, especialmente contra as ondas de calor, porque contêm fitoestrogênios que diminuem a oscilação hormonal na corrente sanguínea.

7. Salva (Salvia officinalis)

Indicada especialmente para combater as ondas de calor na menopausa, ao ajudar na correção dos níveis hormonais, sendo eficaz e bem tolerada pelo organismo.

Apesar de não ser um forte adepto, percebo no dia a dia do consultório que alguns profissionais prescrevem formulações, como esta abaixo, com objetivo de ajudar no combate aos sintomas climatéricos.

Amora 500mg %2b Tribulus Terrestris 300mg Maca Peruana 300mg Yam Mexicano 150mg Passiflora 150mg Ginseng 40mg Ginko Biloba 60mg

Existem algumas medicações alternativas capazes de aliviar alguns sintomas climatéricos, como a sulpirida, clonidina, gabapentina, vitamina E, venlafaxina, fluoxetina e a paroxetina.

A recomendação dos especialistas é que a mulher menopausada, que tenha contraindicação para reposição hormonal à base de estrogênio, possa utilizar estas alternativas sempre orientadas por profissionais habilitados, ponderando os riscos e benefícios.

*Gustavo Safe é diretor do grupo formado pelo Centro Avançado em Endometriose e Preservação da Fertilidade, Ovular, Fertilidade, Menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à Saúde da Mulher com enfoque na Dor pélvica, Infertilidade, Preservação da Fertilidade, Endometriose, Endoscopia Ginecológica e Cirurgias Minimamente Invasivas.

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