Fatores hereditários respondem por cerca de 32% dos casos de câncer

Tumores mais prevalentes são os de próstata, pele, ovário, rim, mama, intestino e útero

por Augusto Pio 06/03/2017 14:31
Cristina Horta/EM/D.A Press
"A importância do diagnóstico correto é que as mutações geradoras das síndromes genéticas de predisposição ao câncer podem ser avaliadas por meio do estudo das tendências familiares de cada pessoa" - André Murad, oncologista (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press)

Estudos recentes apontam que, ao contrário do que se supunha no passado, os fatores hereditários são a causa de cerca de 32% dos casos de câncer, podendo alcançar em alguns tumores, como o de próstata, até 54%. O alerta é do oncologista, professor, pesquisador e pós-doutorando em genética André Márcio Murad, coordenador da disciplina da oncologia da Faculdade de Medicina da UFMG e diretor clínico da Clínica Personal – Oncologia Personalizada e de Precisão.

De acordo com o especialista, o câncer é causado em 60% a 70% dos casos por fatores ambientais, associados ou não a fatores genéticos, que são classificados em químicos, físicos e biológicos. Como agentes químicos, destacam-se o tabaco, a dieta inadequada (dieta rica em gordura e proteína animais, hipercalórica, com excesso de carnes vermelhas, salgadas, embutidas, enlatadas ou artificialmente conservadas e pobre em produtos vegetais, como legumes, verduras, frutas e grãos), o álcool, alguns medicamentos e vários agentes ocupacionais, como solventes orgânicos, anilina, asbesto, além de fuligem de motores movidos a combustíveis fósseis e agrotóxicos e pesticidas.

Como agentes físicos, André ressalta a exposição à luz solar e à irradiação ionizante, como a exposição ao radônio, equipamentos de radioterapia ou compostos radioativos. Como agentes biológicos, destaca a infecção pelos vírus HPV (câncer de colo uterino) e o das hepatites B e C (câncer de fígado) além da bactéria Helicobacter pylori (câncer de estômago).

Até recentemente, supunha-se que a hereditariedade seria responsável por apenas 10% a 12% dos casos de câncer. Entretanto, de acordo com o oncologista, estudos recentemente publicados mostram que a incidência de câncer hereditário chega a 32% dos casos em média. “Um estudo recente publicado na prestigiada revista médica JAMA, que acompanhou 200 mil gêmeos univitelinos e bivitelinos nórdicos por um período médio de 32 anos, demonstrou que a incidência de câncer hereditário foi de 32% e os tumores mais relacionados foram de os de próstata, pele (incluindo o melanoma), ovário, rim, mama, intestino e útero.”

MUTAÇÕES


André salienta que a suspeita de síndromes genéticas de predisposição ao câncer deve ser feita sempre quando houver vários casos de um mesmo tipo ou tipos variados de câncer em parentes de uma mesma família e ocorrendo em idade abaixo dos 55 anos. “A importância do diagnóstico correto é que as mutações geradoras das síndromes genéticas de predisposição ao câncer podem ser avaliadas por meio do estudo das tendências familiares de cada pessoa e, principalmente, de modernos exames genéticos realizados de material retirado da saliva, que detectam essas mutações nos genes específicos, responsáveis por esses tipos de câncer.”

O oncologista explica que essa identificação é vital na prevenção e no diagnóstico precoce desses tumores, o que propiciará medidas preventivas, como orientação dietética, perda de peso, exercícios físicos e também de rastreamento periódico (que pode incluir exames clínicos, endoscópicos e radiológicos) e até mesmo cirúrgicas, como a remoção profilática do intestino grosso, tireoide e mesmo ovários e mamas, nos casos indicados.

O oncologista ressalta que esses exames são disponíveis em vários laboratórios do país, alguns inclusive cobertos pelos planos de saúde, sendo que existe um projeto de lei de autoria da deputada Carmem Zanotto (PPS/SC), que pretende obrigar o Sistema Único de Saúde (SUS) a cobrir o exame de detecção de mutação genética dos genes BRCA 1 e BRCA 2 em mulheres com histórico familiar de diagnóstico de câncer de mama ou ovário. “Esses testes já são oferecidos pelo SUS no estado do Rio de Janeiro, por meio da sanção da lei chamada de 'Angelina Jolie', em agosto do ano passado”, finaliza o especialista.