São Paulo – O artista chinês Ai Weiwei apresenta na capital paulista a maior exposição de sua carreira – a primeira no país – com um tour por obras clássicas e inéditas que expressam sua leitura das raízes brasileiras.
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Empilhadas, as vigas se estendem formando uma espécie de cordilheira de metal retangular. Diante delas destacam-se as enormes e impressionantes raízes de uma árvore típica da mata atlântica da Bahia. Extraídas já mortas graças a uma complexa operação, descrita em vídeo, foram trabalhadas por Weiwei com carpinteiros chineses e brasileiros.
Vários pedaços de couro pendurados nas paredes contêm citações em inglês, principalmente de brasileiros ligados à literatura e à cultura, com forte conteúdo social e político.
Duas figuras, exposta no subsolo, reproduz a escultura do corpo nu de Ai Weiwei deitado em um colchão, cercado por sementes de peônias. Ao lado, de costas, está o corpo de uma baiana nua. “Eles nunca se conheceram”, informa o curador Marcello Dantas, explicando que os moldes foram esvaziados em diferentes meses. A obra surgiu de sonhos eróticos que começaram a rondar Weiwei em sua chegada ao Brasil.
Outro destaque é Ex-votos, obra criada em Juazeiro do Norte, no Ceará, reunindo esculturas de madeira semelhantes aos objetos marcantes da devoção popular no Brasil.
“É um desafio enorme você dar conta de um artista dessa envergadura, com a ambição de fazer uma exposição desse tamanho, reunindo, ao mesmo tempo, obras históricas e nova série de obras dentro do Brasil, com uma pessoa de tão longe interpretando a cultura brasileira”, comenta o curador.
Entre o segundo e o terceiro andares, estão distribuídos artefatos e fotos que retratam a trajetória e as angústias de Ai Weiwei. É o caso do enorme barco de refugiados inspirado em seu apoio a imigrantes do Oriente Médio e da África que chegam em massa à Grécia. Ele “navegou” há uma semana pelo lago do Ibirapuera, como degustação da mostra.
Outra novidade é F.O.D.A., feita com 1,2 mil moldes em porcelana de quatro produtos ligados ao Brasil: fruta-do-conde, ostra, dendê e abacaxi. O título remete às iniciais de seus nomes.
A exposição, cuja concepção levou vários anos, chega ao Brasil durante o turbilhão político e social provocado pelas eleições presidenciais.
“É muito interessante termos chegado agora. Quando a gente planejou este projeto, não tínhamos a menor ideia do que estaríamos vivendo hoje no Brasil, a sociedade dividida, e nem que certos temas do Ai Weiwei seriam tão pertinentes neste momento”, afirma Marcelo Dantas.
O curador espera que a exposição gere reflexões “sobre a identidade brasileira, sobre como celebrar a diversidade e sobre a quebra do pensamento de que as coisas podem ser feitas de forma diferente. Isso já é suficiente.”
RAIZ WEIWEI
Oca. Parque Ibirapuera, Avenida Pedro Álvares Cabral, São Paulo. De terça-feira a sábado, das 11h às 20h; domingo e feriado, das 11h às 19h. Até 20 de janeiro. R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada).
MILITANTE
Ai Weiwei (foto), de 61 anos, é filho do poeta chinês Ai Qing (1910-1966), amigo de Jorge Amado e Pablo Neruda, perseguido pelo governo Mao Tsé-tung. Artista plástico, arquiteto, fotógrafo e curador, Ai é ativo militante pelos direitos humanos, marca de suas instalações, esculturas, fotografias, performances e vídeos. Em 2011, foi preso por autoridades chinesas por sua atuação nas redes sociais, ao denunciar o país por desrespeitar a liberdade de expressão e os direitos do cidadão. Passou 81 dias encarcerado. Em 2015, recuperou seu passaporte e se mudou para Berlim, na Alemanha. Em seus trabalhos, denuncia o descaso com os refugiados, o desrespeito à liberdade (uma de suas exposições ocupou o presídio desativado de Alcatraz, nos EUA), o desprezo pelo impacto das mudanças climáticas no planeta e a repressão política tanto na China quanto em outros países..