Meditação e mindfulness na endometriose

Atualmente palavras como mindfulness (atenção plena) e meditação estão se tornando frequentes na abordagem da endometriose

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(foto: Pexels)

A endometriose é uma doença enigmática que interfere na qualidade de vida e equilíbrio de cerca de seis milhões de brasileiras em idade fértil.

Mas por que algumas mulheres desenvolvem a endometriose e outras não? O que pode definir a gravidade da doença e a sintomatologia? Porque temos doenças semelhantes com manifestações diferentes e respostas diversas?

A medicina tem investigado todos estas perguntas, mas as teorias que associam a doença a fatores imunológicos, hormonais e/ou genéticos não conseguem explicar tudo. Alguns estudos apontam, inclusive, para perfis de comportamento mais propensos a desenvolver, como mulheres modernas que trabalham demais e colocam a carreira acima de qualquer necessidade, retardando a maternidade.

Diante disto, a teoria que consegue melhor explicar estas questões é a epigenética, uma ciência que busca compreender as mudanças reversíveis na expressão gênica, ou seja, os componentes que podem modificar como os genes são lidos sem alterar a sequência de nucleotídeos do DNA.

As modificações epigenéticas podem ser transmitidas ao longo das gerações, sendo herdadas no momento da divisão das células, atuando na formação de diferentes fenótipos entre os indivíduos.

Os benefícios da meditação para a saúde física e mental são a redução de estresse, a diminuição de sintomas depressivos, o controle da ansiedade, a potencialização do autoconhecimento e da autoestima, o desenvolvimento do foco nas atividades, a redução da perda da memória, a ampliação das emoções positivas e a redução de vícios.

O artigo de revisão O impacto do mindfulness no controle da expressão gênica: uma revisão integrativa mostrou o impacto da meditação e mindfulness nas células imunes e marcadores inflamatórios relacionados ao estresse.

Mindfulness é meditação, mas meditação não é mindfulness.

Os mais críticos dizem que mindfulness é meditação de americano, estilo fast-food. Quem a defende afirma que é um treino mental e traz os benefícios da prática milenar de forma laica, para o homem moderno.

Ensinamento de Buda, o termo mindfulness foi cunhado em 1979 pelo professor Jon Kabat Zinn, na Universidade do Massachusetts, nos EUA, onde também foram feitos os primeiros estudos em pacientes que sofriam com dores crônicas.

Adepto do budismo zen, Kabat Zinn sistematizou algumas técnicas que aprendeu após anos de meditação e ioga.

Mindfulness é essencialmente uma tomada de consciência do que está surgindo momento a momento, o que naturalmente inclui a prática da meditação.

Quando você está sendo consciente intencionalmente, está percebendo e prestando atenção a pensamentos, sentimentos, comportamentos e movimentos, e também aos efeitos dessas experiências em você, nas relações que você tem e nas situações de vida que você esteja vivendo.

Mindfulness seria o tornar-se consciente ao invés de fazer coisas simplesmente no automático, alimentando porventura padrões de pensamentos que influenciam no bem estar emocional e mental.

A meditação normalmente se refere a uma prática formal de meditação, geralmente praticada com a pessoa sentada ou deitada em uma superfície.

Existem muitos tipos de meditação, como a meditação da consciência da respiração, meditação da bondade amorosa, meditação com foco em repetição de mantras, meditação com visualizações, meditação baseada em repetição de sons, etc.

A meditação é uma prática intencional, em que você se atenta para aumentar a concentração, desenvolver uma atitude de calma e serenidade, e muito provavelmente desenvolver uma capacidade de equilíbrio ou inteligência emocional.

O autoconhecimento é a maneira que temos para entender a nós mesmos em todas as esferas da vida, permitindo que você descubra suas qualidades, capacidades, bem como seus pontos que devem ser melhorados, facilitando a compreensão do que você têm e realmente precisa.

O diagnóstico tardio da endometriose, assim como o diagnóstico precoce, podem ser prejudiciais e estigmatizantes nos dias de hoje. Definir o momento preciso e ajustar o equilíbrio entre fazer menos e mais deve ser o desafio.

Neste contexto entra o equilíbrio emocional e a inteligência emocional necessários ao médico e ao paciente.

Equilíbrio emocional é quando se tem consciência de todo o processo emocional, permitindo reconhecer, nomear e transformar nossas experiências emocionais sem transferir a responsabilidade sobre nossos sentimentos e sensações.

A inteligência emocional é um conceito da psicologia usado para designar a capacidade do ser humano de lidar com as emoções.

Já imaginou o que acontece com as mulheres ao receberem o diagnóstico de endometriose nesse mundo globalizado?

Elas vão imediatamente encontrar na internet informações de que a endometriose é uma doença que não tem cura, ou que o seu tão sonhado desejo em ser mãe pode estar comprometido e que vai ter que se acostumar a sentir dor ou usar remédio durante toda a sua vida.

Se continuar pesquisando sobre o tratamento vão perceber que, caso precisem de cirurgia, ela provavelmente não será única, com risco de colocação de bolsa protetora, mesmo se realizada com os melhores profissionais em grandes centros de forma particular com cirurgias que variam de 20 a 50 mil reais.

Ninguém está preparado para isto.

É verdade que temos muita informação e desinformação associada a endometriose e é por isso que a portadora de endometriose não pode perder o foco, pois esses e outros fatores geram um alto estresse psicológico que é capaz de potencializar os danos provocados pela endometriose, gerando um ciclo vicioso, em especial nos quadros dolorosos.

O artigo A Single-blind, randomized, pilot study of a brief mindfulness-based intervention for the endometriosis-related pain management, de um grande amigo, doutor Marco Aurelio Pinho de Oliveira e cols, especialista da endometriose, parece ser um dos primeiros neste formato randomizado a mostrar de forma objetiva o benefício da intervenção baseada em mindfulness no manejo da dor.

Os resultados mostraram que a intervenção ajudou a trabalhar a dimensão afetiva da dor, com necessidade de focar e valorizar experiências positivas e prazerosas mesmo com dor, embora tenha ajudado pouco na percepção da redução do estresse pelo paciente.

A melhora da dismenorreia (cólica menstrual) e da dispareunia (dor na relação sexual) não tiveram impacto significativo no trabalho.

Ansiedade e estresse interferem negativamente em qualquer quadro de dor crônica (não são privilégio da endometriose) e alteram negativamente a percepção que as pessoas têm de si mesmas e da própria dor.

É necessário avaliar caso a caso, e verificar o que veio primeiro: os sintomas psicológicos ou a dor crônica e demais desconfortos trazidos pela endometriose?

A prevalência de depressão em pessoas com doenças crônicas é alta e também foi constatada nas portadoras de endometriose, acometendo principalmente as que referem dor crônica e constante (aproximadamente 80%).

A cada dia percebo a importância de se utilizar todas as ferramentas disponíveis no tratamento das doenças sem precisar dividir a origem das terapias uma vez que os conceitos do oriente podem beneficiar e muito a ciência e a medicina convencional do ocidente.

O mindfulness, que tem raízes fortes no passado, está mais do que nunca atual e pode ajudar a resetar a nossa vida nesse terceiro milênio, iluminando caminhos de atenção plena a uma vida mais mindful.

Orientação à família (especialmente ao parceiro), grupos de apoio, psicoterapia, atividade física, práticas de relaxamento e controle da dor são algumas opções de estratégias para lidar com os sintomas e buscar maior qualidade de vida.

Precisamos sim é ter um embasamento mínimo para nos nortear sem esquecer conceitos tentando sempre agregar e não separar.