Sim, estamos envelhecendo. Saiba como se planejar para o futuro e ter uma vida ativa na terceira idade

É possível chegar à maturidade independente, desde que você tenha se planejado financeiramente, e com saúde para seguir a vida morando sozinho ou numa casa de repouso, sem depender da família

por Carlos Altman 04/09/2017 12:20

Carlos Altman/EM
"Vivi a plenitude dos dias todos esses anos. Cuidei de meus pais até eles partirem e, tempos depois, percebi que era eu quem precisava de cuidados" (foto: Carlos Altman/EM)

“Casei-me com minha profissão, por isso não tive filhos. Na realidade, meus livros e artigos são os meus filhos, o meu legado nesta vida.” Quem escuta Célia Laborne Tavares, umas das primeiras jornalistas de Minas Gerais, falar não imagina que ela tenha 92 anos. Lúcida, alegre e com uma memória impecável, a escritora discorre sobre o passado sem rancor. Lembra-se dos tempos em que integrou a equipe de redação do antigo jornal Diário de Minas e colaborou no Caderno Feminino do Estado de Minas nos anos de 1970. Lembranças que não se foram e que estão presentes até hoje, e são contadas com a ajuda dos sobrinhos, nos blogs na internet.

“Vivi a plenitude dos dias todos esses anos. Cuidei de meus pais até eles partirem e, tempos depois, percebi que era eu quem precisava de cuidados.” Por decisão própria, hoje, Célia mora no Espaço Integridade – uma casa de repouso ou residência sênior – no coração do Bairro Cidade Jardim, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. “Na velhice, as pessoas precisam receber uma atenção especial. Depois que sofri um acidente doméstico e passei a me locomover com a ajuda de uma cadeira de rodas, fiquei dependente. Não queria incomodar meus parentes e aqui me sinto amparada”, emociona-se.

Deixar a casa em que viveu grande parte da vida e optar por compartilhar a vivência com pessoas da mesma faixa etária é hoje uma tendência nos países desenvolvidos. Mesmo no Brasil, cresce o número de pessoas que envelhecem de forma ativa, continuam produtivas, gostam de viajar, sair com os amigos, e preferem morar em uma casa de repouso do que viver sozinhas. Para ter uma ideia, só no Bairro Cidade Jardim são cerca de 10 casas, antigas mansões, que hoje abrigam dezenas de idosos.

A decisão de morar em uma residência sênior pode partir da família, a partir de uma negociação com o idoso, ou do próprio desejo de sair de sua casa e morar com outras pessoas. Especialistas ressaltam que a troca de experiências e a convivência com outros idosos podem favorecer a socialização do indivíduo e evitar problemas como solidão. Claro que se a pessoa decide morar sozinha, desde que ela tenha autonomia e saúde, não há o menor problema. Mas o preconceito que existia até alguns anos atrás em relação a casas de repouso está sendo derrubado.

Muitas pessoas se prepararam financeiramente ao longo da vida para poder escolher onde desejam envelhecer. Outras não. É nesse ponto que os especialistas alertam: “O planejamento deveria começar na idade adulta. Pensar no futuro e se organizar financeiramente para poder garantir a hospedagem em um ambiente que supre todas as necessidades na velhice”, afirma Adriana Leão de Carvalho, especialista em gerontologia e sócia do  Integridade –  Espaço de Atividades e Residencial  Sênior, com o marido, Hudson Félix Almeida.

Com 26 anos de experiência na área de envelhecimento, Adriana Leão observa que os números sobre a população idosa merecem atenção imediata dos governos e de toda a sociedade. “As projeções apontam que, em 2025, o número de idosos poderá chegar a 32 milhões (cerca de 17%) e, em 2050, a 66,5 milhões (cerca de 30% do total da população). O Brasil alcançará a sexta posição no ranking mundial de países com população com maior longevidade”, ressalta. E com as taxas de fecundidade brasileira decrescentes, estima-se que a virada no perfil da população brasileira ocorrerá em 2030, quando o número absoluto e o percentual de brasileiros com 60 anos ou mais serão superiores ao de crianças de até 14 anos. “Daqui a 14 anos, os idosos serão 41,5 milhões, correspondendo a 18% da população brasileira, enquanto as crianças serão 39,2 milhões, ou seja, 17,6%”, acrescenta a especialista.

DIVERSIDADE 

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Especialista em gerontologia, Adriana Leão de Carvalho e o marido Hudson Félix Almeida abriram o espaço Integridade (foto: Carlos Altman/EM)
 

Adriana Leão faz uma alerta: “Ainda existe um grande preconceito quanto à velhice e isso faz com que ela seja negada ou 'glamourizada', onde muitas pessoas se referem a ela como a 'melhor idade'. Mas nenhuma dessas visões é boa, porque impedem que ela seja contemplada na sua diversidade e na particularidade com que é vivida por cada pessoa. Pela dificuldade que têm em lidar com a velhice, poucos ainda se preparam para ela”.

É como a atriz Maitê Proença escreveu numa crônica: “Estamos envelhecendo, estamos envelhecendo, estamos envelhecendo, só ouço isso. No táxi, no trânsito, no banco só me chamam de senhora. E as amigas falam 'estamos envelhecendo' como quem diz 'estamos apodrecendo'. Não estou achando envelhecer esse horror todo. Até agora. Mas a pressão é grande.” A citação nos faz refletir sobre a velhice no país, ainda mais vinda de uma mulher que passou dos 70 anos e é exemplo para muitos, como padrão de beleza e juventude. 

Sim, estamos envelhecendo. Isso é fato comprovado por dados de pesquisas realizadas em todo o Brasil. O país do “futuro” não será de jovens. Mas de senhores e senhoras de cabelos brancos. Os brasileiros com 60 anos ou mais, ou seja, idosos, somavam 26,279 milhões em 2013, o equivalente a 13% da população, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É uma população que está aumentando rápido: em 2001, somavam 15,5 milhões. Estamos preparados para lidar com esse contingente de idosos? Teremos cuidados apropriados e suficientes para uma caminhada rumo a uma velhice tão longa e hoje tão ativa?