Estudo identifica gene que deixa as pessoas com aparência mais velha

Após analisarem o genoma de cidadãos europeus, os especialistas concluíram que uma variação no gene MC1R favorece o surgimento das marcas associadas ao correr dos anos

por Vilhena Soares 04/05/2016 12:30
Valgo Virgo / CB / D.A Press
(foto: Valgo Virgo / CB / D.A Press)
A Certidão de Nascimento informa uma idade, mas a aparência dá a impressão de que alguns anos a mais se passaram. Pessoas que aparentam ser mais velhas do que de fato são podem agora colocar a culpa — ou pelo menos uma parte dela — na genética, afirmam cientistas de um centro de pesquisa da Holanda. Após analisarem o genoma de cidadãos europeus, os especialistas concluíram que uma variação no gene MC1R favorece o surgimento das marcas associadas ao correr dos anos. Para os autores do trabalho, publicado na edição desta semana da revista Current Biology, o achado pode ser usado em tratamentos médicos futuramente.

O estudo foi inspirado em uma investigação anterior da mesma equipe, que abordou a percepção da idade a partir da aparência física. Nesse experimento passado, notou-se que a idade aparente de um indivíduo é influenciada por uma combinação de fatores ambientais e genéticos, e que é possível estimar a saúde e a expectativa de vida de alguém a partir de sua idade aparente.

“Publicamos nosso primeiro estudo em 2008, e ele demonstrou que a idade percebida pode ser medida de forma científica. Estamos interessados em saber como algumas pessoas são capazes de aparentar uma idade mais jovem. Acreditamos que, desse modo, podemos aprender seus segredos e descobrir novas maneiras de ajudar a todos terem uma aparência mais jovial”, diz David Gunn, um dos integrantes da equipe e cientista da empresa Unilever.

No novo artigo, o time analisou o genoma de mais de 2.600 europeus idosos e comparou os dados colhidos com fatores estéticos, como a quantidade de rugas, a pigmentação da pele e a espessura dos lábios, a partir de imagens digitais dos voluntários. Como resultado, os especialistas notaram que os participantes com mutações no MC1R aparentavam ter, em média, quase dois anos a mais do que realmente tinham.

Gunn explica que o MC1R já foi relacionado à produção de cabelo, a processos inflamatórios, a reparações em danos de DNA e a algumas características da pele que a influência do gene nesses processos do organismo humano pode ser a explicação para o seu vinculo com a aparência. “Esse gene já foi associado também ao envelhecimento da pele, uma vez que influencia os níveis de pigmentação da melanina, proteína que determina a cor da pele. Quando nós encontramos esse gene, primeiro analisamos se esse aumento dos níveis de melanina, que dá uma melhor proteção ao sol, faria alguma diferença. No entanto, para a nossa surpresa, a cor da pele e a exposição solar, assim como o sexo, não parecem estar envolvidas na forma como esse gene influencia a idade aparente”, detalha.

Um fator
Para Gustavo Guida, geneticista do Laboratório Exame de Brasília, o trabalho europeu é interessante, mas precisa de aprofundamento para oferecer dados mais confiáveis. “É um estudo um pouco restrito, foi feito somente com uma população holandesa. O resultado precisa ser validado em outros grupos, de diferentes etnias, já que mais elementos genéticos, como um alelo (formas alternativas de um mesmo gene), podem influenciar na função do MCR1”, analisa o especialista, que não participou do estudo.

Ele ressalta ainda que a análise de função de genes é bastante complexa. “Para quase todos os genes que conhecemos, é difícil falar que suas funções estão totalmente esclarecidas. Você sabe qual é a estrutura e as formas que um gene é expresso, mas não como uma proteína interage com as outras. Por exemplo, um mesmo gene pode estar ligado aos dendritos, elementos cerebrais, e ter reações com glândulas dos testículos ou dos ovários. Por isso, trabalhos como esse precisam ser bastante aprofundados, para que todas as influências possam ser consideradas”, complementa.

Os autores do estudo lembram que o MCR1 é apenas um fator que pode determinar a idade aparente das pessoas, mas destacam que o trabalho pode ser considerado um pequeno passo na compreensão do envelhecimento. “Este é o primeiro estudo genético sobre idade aparente, por isso, os resultados são novos. Eu não diria que eles podem mudar radicalmente descobertas anteriores quanto aos efeitos da idade no corpo, mas eles demonstram que fatores genéticos influenciam a forma como nossa idade aparenta em nosso rosto. Com isso, podemos considerar o MC1R como o gene com o maior efeito sobre o envelhecimento facial”, argumenta Gunn.

Saúde
O trabalho terá continuidade. A equipe acredita que outros elementos do genoma ligados à aparência mais velha podem ser identificados futuramente. “Queremos descobrir mais genes ligados à idade aparente e verificar se eles também influenciam o envelhecimento dentro do corpo e se isso carrega consequências para a saúde”, antecipa Gunn.

O autor também destaca que o prosseguimento das investigações pode ajudar a proteger o corpo. “Acreditamos que o uso da percepção de idade é uma das melhores e mais emocionantes formas de medir o quão ‘bem’ as pessoas estão envelhecendo, então, e esperamos (que essa linha de estudos) leve a avanços para a saúde no futuro próximo”, adiantou o autor.

Gustavo Guida também acredita que a área clínica poderia se beneficiar de novos achados. “A ideia de buscar alelos que sejam responsáveis pela variação e o comportamento da pele é muito interessante. É difícil dizermos até que ponto podem ser consideradas válidos esses achados, mas, caso essa análise tenha continuidade e os dados cresçam, o interesse na área médica será grande”, opina.