Pesquisadores afirmam ser possível diagnosticar autismo com ressonância magnética

O objetivo é desenvolver, para o futuro, testes que facilitem o diagnóstico precoce e tratamentos personalizados

por Vilhena Soares 04/05/2016 15:00
Valdo Virgo / CB / D.A Press
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O diagnóstico de autismo não é simples. São necessários profissionais de saúde experientes, que observam o comportamento das crianças em busca de sinais como ausência de contato visual, nos primeiros meses de vida, ou dificuldade para realizar alguns gestos simples, como apontar o dedo para algo que chama a atenção, após o primeiro ano. Agora, pesquisadores americanos encontraram evidências de que, no futuro, outra ferramenta poderá tornar essa identificação mais rápida e precoce: um exame cerebral.

Em um artigo publicado na edição desta semana da revista Jama Psychiatry, os cientistas apontam diferenças significativas no funcionamento cerebral de crianças com e sem o transtorno. Os investigadores notaram que um conjunto de regiões, apelidado de circuito cerebral de percepção social, é menos ativo nos pequenos diagnosticados com transtorno do espectro autismo (TEA) e acreditam que essa distinção poderá ser usada para permitir um diagnóstico mais cedo do problema, o que aumentaria a eficácia das intervenções terapêuticas.

No estudo, os pesquisadores utilizaram um aparelho de ressonância magnética, tecnologia que tira fotografias do cérebro durante seu funcionamento, para examinar 114 meninos, com e sem o transtorno. Foram geradas 164 imagens cerebrais de cada um deles, com especial atenção a regiões ligadas às características que costumam ser prejudicadas no distúrbio, como o giro fusiforme, que está relacionado ao reconhecimento de faces. O resultado foi a identificação de um conjunto de áreas menos ativas nas crianças autistas.

Mais do que simplesmente dizer se uma criança tem TEA, o refinamento de um exame desse tipo poderá ajudar os médicos a identificar que habilidades de cada paciente serão mais afetadas, permitindo estimulações precoces mais personalizadas. “Podemos usar esses biomarcadores funcionais para identificar quais tratamentos serão eficazes para casos individuais e medir seu progresso”, afirma, em um comunicado à imprensa, Kevin Pelohrey, coautor do trabalho e professor da Universidade George Washington, nos Estados Unidos.

Vanguarda

Para Thiago Blanco, psiquiatra assistente no Hospital da Criança do Distrito Federal, estudos que buscam a identificação de marcadores biológicos para transtornos mentais compõem a vanguarda da produção científica em psiquiatria. “Considerando a medicina contemporânea, que tem dedicado cada vez mais importância à tecnologia em saúde, a carência desses recursos na psiquiatria implica em uma equivocada insegurança quanto à propriedade de um dado diagnóstico”, avalia o médico, que não participou do estudo.

Exames que se comprovem eficazes, acrescenta o brasileiro, poderão aumentar a qualidade do atendimento, uma vez que muitos médicos, devido a deficiências na formação, ainda podem se sentir inseguros em dar um diagnóstico de saúde mental.

Segundo Blanco, os cientistas americanos trabalharam com informações já conhecidas na área médica. “O estudo citado, assim como outros de mesma natureza, têm evidenciado que há, sim, alterações de conectividade cerebral bastante acentuados no autismo. Demonstram aquilo que já sabíamos pela observação dos deficits de interação social, comunicação e linguagem, tão marcantes na população portadora de TEA”, frisa.

Tempo
Apesar de o estudo ser promissor, Blanco acredita que outras pesquisas são necessárias até que um exame do tipo passe a ser usado na identificação do autismo. “Do ponto de vista diagnóstico, reconheço um avanço dado por estudos de neuroimagem, porém muito ainda precisa ser explorado a fim de que se confirmem padrões de especificidade dos achados para o autismo, que permitam o uso desses recursos”, complementa.

Os autores destacam que a pesquisa ainda é inicial, e o próximo passo é realizar a mesma análise com meninas. Para eles, vale a pena dar continuidade a essa linha de pesquisa, pois o tratamento poderia melhorar muito com diagnósticos e acompanhamentos feitos a partir da análise cerebral. “Esse tipo de imagem pode nos ajudar a avaliar, com base na observação de alguns dias, se uma criança vai se beneficiar de uma intervenção comportamental de 16 semanas. Essas informações vão ajudar os pais a economizar tempo e dinheiro”, acredita Pelohrey.

Blanco também se mostra otimista com a evolução da técnica. “Acho que pode funcionar como um método adjuvante bastante importante para identificação de risco para o desenvolvimento da doença, de forma cada vez mais precoce e, portanto, permitindo a adoção de estratégias de intervenção que atenuem a manifestação sintomatológica da doença e, eventualmente, até corrigir a curva de desenvolvimento de uma criança, evitando a manifestação da doença”, frisa.

Declínio mental aumenta resistência a novidades
A resiliência, capacidade de se adaptar a novas situações, é uma característica essencial para a sobrevivência dos organismos ou para a manutenção de algumas de suas características. Porém, essa habilidade tende a ser perdida com o tempo, prejudicando uma série de funções. Em um estudo com ratos, pesquisadores australianos encontraram pistas de que a redução dessa flexibilidade de uma parte do cérebro pode explicar por que pessoas idosas resistem tanto a incorporar novos hábitos e abandonar a antiga forma de fazer as coisas.

Tanto no ser humano quanto em ratos, a capacidade de fazer escolhas e de se adaptar ao ambiente está ligada a uma área do cérebro chamada corpo estriado, também associada ao planejamento e à tomada de decisão. Na nova pesquisa, publicada na revista Neuron, os pesquisadores investigaram se um declínio nessa região pode explicar a rigidez comportamental dos mais velhos.

Para isso, eles realizaram um experimento com camundongos velhos e jovens. Os animais foram colocados em uma câmara e treinados para pressionar duas alavancas: uma para receber alimentos à base de grãos e outra para receber um tipo de refeição semelhante, mas de sabor mais adocicado. Em seguida, os animais foram postos em outra caixa, com acesso apenas à refeição açucarada. Quando retornaram ao ambiente anterior, os roedores jovens voltaram a alternar a fonte alimentar, mas os mais velhos não. Acostumados ao doce, permaneceram nele.

Uma investigação no cérebro dos animais mostrou um declínio no corpo estriado, como esperado. Mas os cientistas conseguiram apontar uma região mais específica ligada à rigidez de hábitos, conhecida pela sigla PF-a-CIN. Segundo eles, é a deterioração nesse grupo de neurônios que parece causar uma resistência a mudanças.

Os autores acreditam que o declínio relacionado com a idade na via PF-a-CIN prejudica a capacidade dos ratos para se ajustarem às mudanças ambientais em tarefas de aprendizagem dirigidas a objetivos. “As questões de flexibilidade no envelhecimento têm sido descritos em outras tarefas de memória espacial e navegação. Aqui, nós descrevemos um problema de flexibilidade semelhante, a aplicado à ação dirigida a objetivos, que tem consequências mais prejudiciais para a vida cotidiana e potencialmente compromete a sobrevivência”, afirma, em um comunicado à imprensa, Jesus Bertran-Gonzalez, pesquisador da Universidade de Queensland e coautor do experimento.