Idosos que andam e falam ao mesmo tempo têm mais chances de cair, revela pesquisa

Pesquisa do Uni-BH mostra que realizar as duas tarefas ao mesmo tempo aumenta a chance de tombo na terceira idade

por Pedro Ferreira 21/07/2015 15:34

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Falar e andar demandam uma mesma área do cérebro que, com o envelhecimento, tem suas funções diminuídas (foto: Free Images)

Você sabia que a maioria dos idosos com dificuldade de andar para ao responder a uma pergunta e somente depois volta a caminhar? A fisioterapeuta, gerontóloga, doutora em ciência da reabilitação e coordenadora do curso de fisioterapia do Centro Universitário de Belo Horizonte (Uni-BH), Rita Guedes, conseguiu a explicação. E faz um alerta: “As chances de uma pessoa idosa sofrer uma queda é bem maior quando, junto com o andar, ela precisa fazer uma outra tarefa que demanda atenção, como conversar, fazer cálculo ou falar ao celular, pois as duas atividades demandam uma mesma área do cérebro que, com o envelhecimento, também têm suas funções diminuídas”.

Foram três anos da pesquisa “Efeito da Dupla Tarefa na Marcha do Idoso”. Rita se baseou na sua tese de doutorado e concluiu que o idoso que anda e fala ao mesmo tempo tem que dividir as redes neurais e acaba comprometendo o seu jeito de andar, aumentando a chance de queda. Em Belo Horizonte, não são poucos os acidentes. Este ano, de janeiro até início de junho, o Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS) recebeu 1.175 pacientes com mais de 60 anos vítimas de quedas, sendo 735 dos casos se referindo a queda da própria altura, quando se está de pé, perde-se o equilíbrio e cai. Outros 233 foram parar no hospital por tropeçar ou escorregar. No ano passado, 3.358 vítimas com a mesma faixa etária deram entrada no HPS. Em 2013, foram 3.538. Cerca de 30% das pessoas com 65 anos ou mais caem pelo menos uma vez a cada ano, segundo pesquisas.

Rita Guedes estudou o comportamento de 81 idosos com idades entre 65 e 88 anos. Nos testes, ela usou um tapete especial, com mais de 5 mil sensores embutidos. Conforme a pessoa andava, o tapete mostrava a velocidade, o comprimento de cada passo e quantos passos ela dava por minuto. No primeiro momento, a fisioterapeuta pediu aos idosos que andassem sobre o tapete por um minuto. Eles iam e voltavam sem conversar. Depois de um descanso de cinco minutos, eles tinham de andar novamente e responder a uma pergunta: “Qual o melhor momento da sua vida e por quê?”.

A fisioterapeuta conta que o idoso, ao responder à pergunta, tinha que julgar qual foi o melhor momento da sua vida, colocar numa linguagem e numa forma gramatical para ela entender. “Eles precisavam articular todas as palavras para a resposta. Então, exige muito do cérebro, da mesma região que controla o ato de andar. E depois da análise que fiz, e como esse tapete mostra várias dessas características, eu identifiquei que eles andavam mais devagar, com passos mais curtos, e ficavam com mais tempo com os dois pés no chão. Tudo isso aumenta a chance de sofrer uma queda”, conclui a pesquisadora.

Doenças progressivas
Para um indivíduo jovem, o ato de andar é praticamente automático, segundo a fisioterapeuta. “O jovem consegue andar sem ter que prestar atenção no ambiente. Mas, com o envelhecimento, há uma série de modificações que ocorrem naturalmente, como diminuição de força, do equilíbrio, e alteração da postura. Isso vai tornando o jeito de andar mais instável e o idoso tem agora que prestar atenção ao se movimentar”, disse.

Doenças progressivas do sistema neurológico, como o parkinson, que afeta principalmente o cérebro, podem aumenta ainda mais as chances de queda nos idosos. “Prejudica ainda mais por ser uma doença que causa alterações no idoso e o deixa mais rígido. Altera o equilíbrio e projeta o centro de gravidade para a frente. Os pés ficam arrastando no chão, ele não tira os pés do chão para andar. Então, é um grande fator de risco. Umas das principais causas de queda é a doença de parkinson”, alerta a estudiosa.

O maior risco de uma queda para o idoso é sofrer fraturas. A estrutura óssea dele é mais frágil e de difícil recuperação, observa Rita. “As idades em que o indivíduo mais cai é na infância e na velhice. Na infância, a criança tem tecido adiposo, músculos fortes e ossos flexíveis. A criança cai e levanta e está tudo bem. Já o idoso, ele cai e sofre uma fratura. E com a fratura, vem uma série de complicações. Tem que ser hospitalizado para fazer uma cirurgia e pode ter uma infecção hospitalar. Só pelo fato de ficar acamado, ele pode ter uma pneumonia, ou dependendo do caso, levá-lo à morte”, explica.

Foi o que ocorreu com o ator Elias Gleizer, de 81 anos, que morreu em 16 de maio. Dois dias antes, ele havia saído de casa para ir ao dentista, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, e sofreu uma queda ao subir a escada rolante de uma galeria. O ator fraturou cinco costelas e perfurou o pulmão. Foi internado no Hospital Copa D’Or e não resistiu. A causa da morte, comunicada pelo hospital, foi por conta de complicações que levaram à falência circulatória após uma broncopneumonia. Gleizer pegou uma pneumonia e uma infecção hospitalar.

Muitas vítimas de queda sobrevivem e não voltam a andar. Segundo os médicos, a imobilidade é pior do que a cirurgia. Quando o idoso fica sem se movimentar, todas as alterações do envelhecimento ficam mais evidentes, reforça a fisioterapeuta. “O idoso que fica parado vai perder mais massa muscular e óssea, vai alterar mais o equilíbrio e fica mais difícil de ele voltar a andar. Tem idoso que sofre uma fratura e não anda mais. Fica na cadeira de rodas”, conta Rita Guedes.

Exercício físico para manter equilíbrio

Além do cuidado redobrado ao andar, a fisioterapeuta Rita Guedes recomenda aos idosos manter as suas funções, melhorar o equilíbrio, o que somente é possível com a movimentação. Ou seja, não ficar parado. “As pessoas pensam que o idoso não tem mais que se movimentar, que ele já trabalhou muito na vida e que deve ficar parado. E o ficar quieto acelera essa piora. Os ossos e os músculos ficam mais fracos. Aí, na hora em que ele for se movimentar, aumenta a chance de sofrer uma queda”, constata a pesquisadora.

Muita gente não deixa o idoso sequer se levantar da cadeira para pegar um copo d’água, faz tudo por ele, mas isso não é certo. “O idoso vai ficando no sofá e na cama e só vai piorando esse processo de perda da mobilidade. Se a pessoa vai para uma cadeira de rodas, ela vai diminuir essas capacidades e vai ficar mais difícil de ela voltar a andar. Então, a recomendação é movimentar com segurança”, diz.

Para idosos que têm bom equilíbrio, que são independentes, nada melhor do que fazer exercícios físicos, entrar numa aula de dança, por exemplo, e ter bons hábitos de vida e alimentares. Quem segue essa receita, segundo a pesquisadora, não vai ter tanta modificação do corpo com o envelhecimento. “Exercitar o corpo e a mente, pois o cérebro comanda os movimentos. Então, aprender uma nova língua, fazer uma atividade que desafia um pouco o cérebro, tudo isso contribui. Eu brinco: ‘sair do piloto automático’”.

Palavra de especialista
Leani Souza Máximo Pereira, orientadora do Programa de Pós-graduação em Ciências da Reabilitação do Departamento de Fisioterapia da UFMG

O desafio da prevenção

“A prevenção das quedas é um desafio para o envelhecimento populacional. Além das mudanças biológicas, devemos levar em consideração que as quedas são eventos multifatoriais e que podem ser desencadeadas por outros fatores intrínsecos da idade, como a diminuição da força muscular em decorrência do envelhecimento e potencializada pelo sedentarismo, diminuição da visão, do equilíbrio, alterações da cognição, presença de doenças associadas, uso inadequado de medicamentos e até de sintomas de dor. Fatores ambientais e comportamentais, como degraus estreitos, superfícies escorregadias e irregulares, tapetes soltos e iluminação insuficiente no domicílio e em locais públicos, andar de meias, usar bebidas alcoólicas e outros são fatores que contribuem para as quedas acidentais. Por outro lado, as quedas podem ser também o primeiro indicador de um sintoma de alguma doença que até então não se manifestou, ou o marcador do início de declínio funcional do organismo idoso, que futuramente vai prejudicar a independência e autonomia da pessoa. Ter independência funcional e autonomia é algo que todos nós valorizamos ao longo da vida e na velhice não é diferente: vamos prevenir as quedas para uma melhor qualidade de vida.”