Monitorar mensagens trocadas em aplicativos pode colocar em risco a saúde dos relacionamentos

Manter o ciúme longe das relações é um desafio ainda maior em tempos que a vida de homens e mulheres pode ser monitorada por meio de curtidas e postagens na internet

por Rafael Campos 11/02/2015 10:00

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Não há como saber quando ela surgiu, mas uma anedota que vem circulando nos aplicativos de conversas entre celulares consegue dar a medida do quanto as redes sociais são levadas a sério, hoje, nos relacionamentos amorosos:

Ela: Se você me ama tanto, prove.
Ele: Como posso provar, meu amor?
Ela: Mate um leão.
Ele: Meu amor, isso é impossível. Como eu vou matar um leão?
Ela: Então me deixe ver as suas mensagens no WhatsApp.
Ele: Qual o tamanho desse leão?

Exageros à parte, não é de se espantar que o cabreiro moço da piada tenha adquirido coragem de forma tão repentina. Mas se o sentimento enciumado dos casais é algo conhecido desde que homens das cavernas tentavam fazer a raça humana evoluir, a internet permitiu que ele se tornasse ainda mais rápido, abrangente e, por que não dizer, arriscado. Às escapadas masculinas e femininas, somam-se prints de conversas comprometedoras.

 Zuleika de Souza/CB/D.A Press
Namorados na juventude, Mônica e Acácio se reencontraram há cinco anos por meio de uma rede social: confiança (foto: Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Do simples ato de curtir uma publicação, segue-se a desconfiança do outro: “Por que ele gostou disso?”. São fotos, comentários e postagens com conteúdos que, antes, poderiam ficar restritos aos amigos no bar, mas que, agora, chegam aos olhos de todo mundo. Inclusive — e, em muitos casos, principalmente — da pessoa com quem você divide a cama. A queda de braço é intensa, até porque, se quase todos sentem ciúme, quase todos fazem parte de alguma rede social. No Brasil, existem 89 milhões de usuários no Facebook e outros 45 milhões no WhatsApp.

Entre 2013 e 2014, o Twitter registrou aumento de 25,6% entre os brasileiros. Hoje, a ciência se debruça sobre a união das redes com a desconfiança existente entre os enamorados. De acordo com o estudo realizado no ano passado pelo doutorando da Escola de Jornalismo da Universidade de Missouri Russel Clayton, o Twitter pode se tornar motivo para que um relacionamento chegue ao fim. Ao entrevistar 581 usuários da ferramenta maiores de 18 anos, a pesquisa apontou que distúrbios existentes em namoros ou casamentos podem ter correlação com a plataforma. Para quem deseja comprovar isso, basta digitar as palavras “redes sociais, ciúme” na caixa de busca do site.

O Facebook também foi alvo do pesquisador. De acordo com a análise de Clayton, aqueles que usam a plataforma de maneira excessiva estão mais propensos a experimentar conflitos relacionados à rede social com os parceiros, o que pode causar danos ao casal, incluindo traição, separação e divórcio. “As redes sociais aparecem na nossa sociedade como um novo meio de manifestar o ciúme. O ciumento, de maneira geral, apresenta um medo enorme de ser trocado ou abandonado pelo outro”, garante Graziela Vanelli, psicóloga e autora do livro Amor, ciúme e infidelidade — Como essas questões afetam sua vida (Editora Letras do Brasil).

Apesar de estarem entre nós há um bom tempo, as ciumeiras provocadas pelas redes sociais estão longe de perder força: “Esse é um tema que sempre volta, porém, sob perspectivas diferentes. E, independentemente da abordagem, sempre gera muita polêmica”, garante o publicitário Patrick Simon, 25 anos. Ele e a namorada mantêm juntos o blog Estilo a dois, no qual discutem com os leitores os mais variados assuntos, inclusive o ciúme.

Ele cita uma postagem como exemplo. No tópico Grupos masculinos no WhatsApp/Como lidar? — que trata da quantidade de pornografia que circula entre os celulares dos homens —, há extremos que vão de leitoras recriminando a prática, checando inclusive o aparelho do namorado para saber o que ele recebe, àquelas que não consideram isso um problema. “Independentemente disso, é interessante como o universo digital é capaz de influenciar diretamente o contexto social da pessoa e do relacionamento”, completa.

O ciúme ataca diretamente um dos pontos fundamentais para manter um namoro ou casamento saudável: a confiança. “O que acontece quando o WhatsApp fica apitando constantemente? Desconfiança. A insegurança é o que mais atrapalha a relação saudável e, diante da quantidade de informação que recebemos hoje em dia, essa sensação tende a crescer”, afirma a coach de relacionamentos Margareth Signorelli. “A gente pode pensar que, antes, o nosso ciúme era estimulado três vezes em uma semana. Agora, são 30 vezes por dia”, pondera.

Em muitos casos, admitir que há um problema é a parte mais complicada, mas é primordial discutir o assunto para garantir a continuidade do namoro. E é melhor que isso aconteça desde o princípio. “A conversa deve ocorrer já no início. Muitas mulheres temem que isso possa ser entendido como cobrança. Porém, se o homem foge dessa discussão, prova que não é a melhor pessoa para se relacionar. Ela não quer impor nada, mas apresentar as próprias necessidades.”

"As redes sociais aparecem na nossa sociedade como um novo meio de manifestar o ciúme. O ciumento, de maneira geral, apresenta um medo enorme de ser trocado ou abandonado pelo outro” - Graziela Vanelli, psicóloga

Estilo a Dois/Divulgação
Patrick e Luiza mantêm o blog Estilo a dois, espaço em que discutem com os leitores diversos assuntos (foto: Estilo a Dois/Divulgação)

Regras claras desde o início
As regras estabelecidas entre os casais para lidar com as redes sociais não precisam ser estanques — há como se adaptar ao momento que o par está vivendo. No réveillon do ano passado, o administrador Fábio Ferreira dos Anjos, 33 anos, e a empresária Wivian Ferreira, 39, ficaram em casa, já que a pequena Júlia estava prestas a chegar. Juntos, falaram sobre o quanto a vida mudaria a partir do nascimento da filha. E a conversa também envolveu as redes sociais. “Aproveitamos para colocar nas nossas resoluções de ano-novo a diminuição do uso das redes sociais. Temos ficado longe do celular, até para aproveitarmos mais o tempo perto da Júlia”, garante Fábio. Desde o Orkut, eles se valem dessas plataformas e têm visões parecidas sobre elas — mas as usam de forma diferente.

“Sou tranquilo em relação ao ciúme nas redes porque isso vai da forma como o usuário se comporta. Se ele mantém um comportamento austero, faz com que as outras pessoas o respeitem mais. Nunca fui de expor a minha vida particular no Facebook”, assegura Fábio. Já a esposa foi mais radical. Apesar de manter o WhatsApp e ser usuária assídua de Instagram, ela deixou o Facebook por enxergar nele um motor para sentimentos ruins — inclusive o ciúme. “Eu sinto sim. Dependendo das situações, isso pode ocorrer. Mas, no nosso relacionamento, nunca aconteceu nada que pudesse causar uma briga ou distanciamento. Porém, há muita gente que sente isso por algo que não existe. Por isso decidi sair”, afirma.

Os dois garantem que homens e mulheres têm comportamentos diferentes quando iniciam uma relação. Fábio explica que os homens só mudam o status de relacionamento na rede quando há certeza de que é algo sério. “O que eu percebo, entre os colegas, é que eles se perguntam se vale a pena alterar o status na rede social, porque não sabem se aquele relacionamento dará certo. Mas quando é algo concreto, a situação o deixa mais seguro. Mas se é um affair que está começando a pegar corpo, ele fica na dúvida se muda ou não.”

Wivian diz que, por terem esse medo de compromisso mais sério, os homens fazem com que as mulheres tenham de ser mais incisivas. “A minha primeira cobrança quando começamos a namorar foi a mudança de status. É como perguntar: ‘Eu existo ou não existo na sua vida?’ E isso é muito comum entre as mulheres que conheço. É como se fosse uma aliança de compromisso.” Apesar de não ter um perfil próprio no Facebook, Wivian se mantém conectada por meio da conta do marido. “Eu saí da rede social por opção. Mas, às vezes, me sinto fora do planeta por não fazer parte dela. Então, uso a conta do Fábio para me informar e isso também é uma forma de acompanhá-lo, ver quem está seguindo.”

Como há um acordo entre o casal, o fato de Wivian usar a rede do companheiro não é um problema, segundo os psicólogos. Porém, quando a devassa acontece sem o conhecimento do cônjuge, a questão se torna mais grave. “As redes sociais mudaram a dinâmica de muitas relações, mas isso não significa que ela seja a causa da infidelidade. Na verdade, se a pessoa é ciumenta, ela pode potencializar o sentimento de desconfiança e insegurança”, assegura Marleide Mendes Borges, psicóloga na Clínica Terapêutica Viva — unidade Brasília.

Compartilhar é outro verbo que dá tônica aos relacionamentos, mas isso nunca deve ser encarado como cerceamento da liberdade — o consenso deve sempre nortear as discussões. Para Graziela Vanelli, a individualidade precisa ser respeitada, assim como o respeito aos acordos que o casal fizer. A psicóloga diz que, se o parceiro for infiel, não há por que invadir as redes sociais para provar: as atitudes da pessoa no dia a dia vão denunciar esse comportamento. Segundo a profissional, a infidelidade será demonstrada no olhar, na conversa com outra pessoa, nos compromissos que marca e não cumpre.

“Mas se for paranoia do ciumento, melhor não invadir nada. O companheiro fiel também demonstra a fidelidade nos gestos, olhares e respeito. Resumindo: não devemos devassar a vida alheia. A percepção dos dados de realidade, que todos podem e devem desenvolver, mostrará o que, de verdade, a pessoa procura.” Mesmo assim, há muita gente que não resiste ao celular do cônjuge dando sopa. Ou considera uma intervenção divina quando a página do e-mail fica aberta. Contudo, o que antes soava como destino pode assumir contornos de doença.

Reprodução Facebook
Rodrigo e Luana começaram a namorar depois de um encontro marcado pelo Tinder: amor tatuado na pele (foto: Reprodução Facebook)
De acordo com Marleide Mendes Borges, o ciúme patológico começa a dar sinais quando causa sofrimento psíquico e distorce a realidade. Segundo a profissional, é normal que muitos homens e mulheres interajam entre si, principalmente na internet. Mas, quando existe a desconfiança exacerbada por parte de um dos parceiros sem fundamentação, quando uma das partes começa a dar mais atenção ao perfil do outro do que ao seu próprio, fica horas buscando indícios infundados ou dispõe de muito tempo para investigar a vida e as contas de amigos do parceiro sem motivo, se acende um alerta.

“Se existe tanta desconfiança a ponto de tentar burlar as leis e descobrir a senha do parceiro a qualquer custo, é hora de repensar os conceitos de relação e buscar entender o que está acontecendo entre o casal”, avisa Marleide. Alguém com comportamento obsessivo usará as redes sem receios. Para a psicóloga Marisa de Abreu, as plataformas não criam essas atitudes, mas são espaços para que as obsessões sejam expressadas.

“A obsessão trará problema quando o limite do outro em suportar comportamentos invasivos chegar ao limite. A ajuda psicológica se faz necessária quando o obsessivo passar a identificar prejuízos em sua vida ou quando a parte que esta sendo perseguida não souber mais como fazer para manter o relacionamento.” Mesmo que travestidos em bytes, o ciúme é antigo e capaz de fazer com que um namoro nem mesmo tenha tempo de se desenvolver. O advogado Victor Lisboa, 41 anos, garante que esse sentimento nunca fez parte dos seus relacionamentos. Ao contrário, eles sempre foi referência para o que não seria ideal.

“As redes sociais devem ser levadas a sério na medida em que alguém leva algo a sério no mundo real. Alguém que é ciumento fora da internet irá manifestar insegurança também por meio das redes, por serem um espaço que facilita e imediatiza a criação de novos contatos, a descoberta de afinidades entre pessoas”, acredita. Entre os relacionamentos de Victor, apenas um trouxe mostras de ciúme, o que indicou logo de cara a impossibilidade de dar certo.

“Foi a clássica situação de alguém entrar no teu perfil da rede social e ver as conversas. Não havia nada ali para ela descobrir, apenas situações que, por insegurança, ela poderia encarar como indícios daquilo que temia na imaginação. Considerei que esse gesto de invadir minha privacidade era sinal de alguém emocionalmente insegura e capaz de tudo, um indicativo de que o namoro não tinha um bom futuro.”

Para Victor, apesar de um relacionamento unir duas pessoas em um projeto comum, elas continuam sendo indivíduos e precisam ter uma esfera própria e autônoma fora da relação. “Escolhemos todos os dias ficar ao lado daquela pessoa e é importante lembrar dessa escolha para que o comprometimento seja constante e consciente. Por isso, a manutenção da esfera de privacidade de cada um é fundamental, pois é a forma de assegurar que a relação é uma escolha, e não algo que absorveu completamente a individualidade e privou a pessoa de autonomia.”

O advogado entende que, ao se colocarem como extensões da vida real, as redes sociais refletem as mudanças de comportamento. “Quando estamos solteiros, muito do que publicamos na internet está direcionado a criar oportunidades de novos contatos e flertes: apresentamos a nossa imagem pessoal nas redes sociais de modo que seja ela seja atraente, convidativa. Isso muda, assim como muda fora da internet, quando estamos namorando.” Em alguns casos, a exposição pode sair do controle e cada casal vai ter de aprender a lidar com isso.
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Wivian usa a senha de Fábio para acessar o Facebook: acordo garante tranquilidade ao casal (foto: Zuleika de Souza/CB/D.A Press)

Compromisso x insegurança
Há poucos dias, Rodrigo Zanotta, desenvolvedor web, e Luana Jahnke, fotógrafa, ambos de 24 anos, ficaram famosos no Brasil inteiro. Eles se conheceram por meio do aplicativo de relacionamentos Tinder há 10 meses e, para celebrar o amor, tatuaram o símbolo da plataforma no pulso. Apesar da atitude considerada radical, os dois têm visões bem centradas quanto à ligação das redes sociais com o namoro. “Eu e o Rodrigo temos um a senha do outro, mas é mais por praticidade do que por desconfiança. Como sou fotógrafa e boa parte dos meus contatos são feitos pelo Facebook, em alguns casos, já pedi para ele entrar no meu perfil e enviar alguma coisa que não consegui pelo celular, por exemplo. Ambos temos a liberdade de entrar no perfil do companheiro, mas, por opção, evitamos fazer isso”, garante Luana.

Rodrigo não nega que as redes possam ser um vetor de atritos nas relações - “curtidas e pedidos de amizade podem sim acabar criando um certo ciúme” -, mas, para ele, o casal é o principal responsável para que essas impressões não sejam transformadas em conflitos. “Quando nenhum dos dois der motivo para o ciúme ir mais longe, o sentimento pode ser facilmente controlado e até ignorado.” Apesar da repercussão do episódio da tatuagem, ele não teme continuar a mostrar o quão está feliz com Luana.

“Postamos momentos do casal, como saídas, eventos com amigos, presentes, coisas que marquem o nosso dia e achamos legal compartilhar. O que é de nossa intimidade diz respeito apenas a nós, e nada vai para as redes sociais”, garante o jovem. Ainda que exista cuidado, Luana acredita que há muita gente disposta a criar rusgas em um relacionamento simplesmente pelo prazer de cutucar. “Sempre tem um ou outro que gosta de alfinetar. Isso, infelizmente, sempre vai existir. Tem gente que se incomoda com a felicidade alheia. Nós não deixamos de postar e cantar nosso amor: somos felizes, apaixonados e gostamos que as pessoas vejam e entendam que é possível ter uma relação sadia como a nossa”, resume.

O sentimento de inveja que muitos casais percebem emanar dos solteiros é reflexo de uma sociedade ainda incapaz de ver a solitude como uma escolha. Frederico Mattos, psicólogo e consultor de relacionamento do ParPerfeito, afirma que existe uma pressão silenciosa para os solteiros firmarem um compromisso amoroso. “Parece haver uma correlação enganosa entre ‘estabilidade e vida de casal’ e ‘instabilidade e vida de solteiro’. No entanto, há pessoas solteiras estáveis e casais instáveis. Mesmo assim, segue essa rivalidade imatura de que estar num relacionamento é inevitavelmente sinal de bem-estar.”

Para a psicóloga Graziela Vanelli, é preciso entender a época em que vivemos e, principalmente, as liberdades que ela dá aos casais. Somente dessa forma, as redes sociais serão menos um problema e mais uma forma de aproximar os casais. “Chego à conclusão de que o ser humano é tão negativo que, mesmo evoluindo, não sabe viver. Na época da vovó, não existia o celular, as relações eram físicas, porém, não havia tanta liberdade entre os casais quanto se tem hoje. Liberdade de falar, olhar, tocar, fazer. Hoje, que desfrutamos dessa liberdade, segurança e assertividade, preferimos ficar no teclado.”

Quem sabe aproveitar essas mudanças pode colher frutos que vão bem além de uma curtida. O cineasta Acácio Campos Filho, 60 anos, e a comissária de bordo Mônica Branco Campos, 45, namoraram na juventude por três anos. Quando ela teve de se mudar para São Paulo, a relação acabou , mas o interesse não. “Ele me procurou depois disso, mas ficamos 15 anos sem notícias um do outro. Até ele me achar no Facebook, em 2010”, lembra Mônica.

“Eu disse: ‘Quando você pousar em Brasília um dia, me liga que a gente sai para conversar.’ E aconteceu isso. Acho que, se não fosse pela rede social, não estaria com ela hoje”, conta Acácio. E o que realmente aconteceu? “Nós nos reencontramos, nos reapaixonamos e nos casamos”, resume a comissária. A história de amor que começou antes mesmo das redes sociais teve seu desfecho por meio delas. Entretanto, apesar de entenderem que devem algo a Mark Zuckerberg, a plataforma não é capaz de trazer incômodo para os dois.

“Eu considero o Facebook uma ótima ferramenta, mas o uso de acordo com os meus valores. Só publico detalhes corriqueiros do nosso dia a dia, mensagens positivas. A nossa relação com a rede é muito aberta e limpa. Ele tem minha senha e eu tenho a dele, e isso não causa nenhum tipo de transtorno porque usamos de acordo com o que acreditamos”, explica Mônica. Acácio diz não ver problema algum em casais que, por exemplo, postam fotos de viagens a dois. Mas é contra quem transforma o mural do Facebook em muro de lamentações particular. E, para ele, isso pode trazer problemas a um relacionamento.

“Entre nós, não existe cobrança, desconfiança nem insegurança. Temos os nossos grupos no WhatsApp e ela não sabe quem está nos meus, não sei quem está nos dela e isso não importa. Temos uma relação de total confiança”, explica o cineasta, lembrando um detalhe importante: as redes sociais não distanciam o casal. “Ainda busco os valores antigos, aprendidos com pai e mãe, na qual essa privacidade tem de ser minha e dele, não preciso expô-la para o mundo. Isso é da nossa essência. Eu respeito a privacidade dele e ele compartilha do mesmo comportamento comigo”, afirma Mônica.

Desde que a Emenda Constitucional nº 66/2010 entrou em vigor, conseguir o divórcio é algo que depende apenas da vontade de um dos cônjuges, sem a necessidade da comprovação da separação de fato ou, ainda, da separação judicial. “Antes, a culpa era um elemento determinante para que a separação judicial pudesse ser proposta sem a necessidade de comprovação da ruptura da vida em comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua reconstituição”, explica a advogada Nathália Waldow. Mesmo assim, as redes sociais são usadas como forma de fundamentar o pedido de divórcio, principalmente nos casos em que há necessidade de garantir a segurança do patrimônio construído pelo casal.

Segundo Nathália Waldow, se a pessoa quer usar o conteúdo das redes sociais como prova, deve fazer cópia utilizando o próprio perfil. “É preciso levar a imagem até um cartório para que seja atestado que é fidedigna.” Entretanto, caso seja comprovado que houve invasão da privacidade do acusado, as coisas podem se inverter e o traidor passa a ser a vítima.

Nathália Waldow explica que, mesmo não fazendo diferença na hora do pedido, muitos divórcios têm nas redes sociais uma razão a mais para acontecer. “O fato de a pessoa ter traído o companheiro não influencia na decretação do divórcio. Nesses casos, as redes sociais serão um adendo que podem justificar o abalo moral ou a exposição sofrida. Vai ser mais importante o que o cônjuge sentiu ao ser traído do que a traição em si. As provas serão usadas para fundamentar o pedido de uma indenização ”, elucida.


Miguel Roberto Jorge, professor associado de Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina/ Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

1. Há algum momento no relacionamento em que seja justificável a devassa nas redes sociais do cônjuge?
Não. A invasão da vida privada de alguém nunca é justificável. Entretanto, é característico nas redes sociais a exposição pública de informações que, em outros tempos, eram consideradas privadas. Assim, na medida em que um indivíduo expõe detalhes da vida pessoal em rede social, o acesso de qualquer pessoa dos seus relacionamentos ou mesma estranha a eles, não mais se caracterizará como invasão e poderá trazer consequências.

2. O sexo pode ser afetado pelo ciúme? Por quê?
Qualquer emoção ou sentimento mais intenso pode afetar a libido. Entretanto, há indivíduos que se excitam com a ideia de que o parceiro esteja se relacionando sexualmente com outra pessoa.

3. Para a psiquiatria, o ciúmes pode gerar um transtorno? De que tipo?
Fazem parte da história da psiquiatria os quadros antes chamados de ciúme patológico. Eram observados em parte dos indivíduos com dependência do álcool (alcoolismo) ou com transtornos da personalidade (indivíduos exageradamente desconfiados ou mesmo paranoides). No Manual diagnóstico e estatístico dos transtornos mentais, publicado em 2013 pela American Psychiatric Association, há um quadro denominado ciúme obsessivo, descrito entre os transtornos relacionados ao transtorno obsessivo compulsivo e caracterizado como uma preocupação não delirante com a infidelidade percebida do parceiro.