Sonhos podem contribuir para solução de problemas que nos acompanham ao longo da vida

Para a teoria junguiana, é importante observar a informação revelada no sono, que é uma mensagem do inconsciente

por Carolina Cotta 21/08/2014 15:30

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EM / DA Press
Desde tempos remotos, era comum que as pessoas não só cultivassem as mensagens dos sonhos, como os tomassem como guias e referências na condução das várias áreas da vida (foto: EM / DA Press)
Sonhamos sempre, embora quase nunca façamos uma reflexão sobre eles. Mas essas imagens simbólicas apresentadas durante o sono, e que interessa basicamente a quem sonha, podem ajudar na compreensão do que somos. Com a ajuda de um analista junguiano, então, que facilita a decifração de tais imagens, pode contribuir para um maior entendimento e, quem sabe, até a resolução de problemas que nos acompanham ao longo da vida. O sonho tem papel de destaque na teoria do psicanalista suíço Jung sobre a psique humana. Segundo Inácio Cunha, pHD em psicologia analítica junguiana, e organizador de seminário sobre o pensador realizado essa semana em BH, o tipo de vida atual, estruturada na razão e no pragmatismo, nos afastou da prática, tão comum ao longo do processo de desenvolvimento do ser humano, que é a de prestar atenção aos sonhos. “Tendemos a aceitar apenas as linguagens que a ciência pode explicar”, diz. Mas nem sempre foi assim.

Desde tempos remotos, era comum que as pessoas não só cultivassem as mensagens dos sonhos, como os tomassem como guias e referências na condução das várias áreas da vida. Havia, inclusive, centros de cura da Grécia Antiga em que toda a terapêutica era baseada nessa linguagem irracional. Segundo o especialista, também formado na Suíça, todas as pessoas sonham, e todas as noites. A questão é: por que nem sempre lembramos? “Uma possibilidade é o fato de não termos o hábito de cultivar a lembrança. O modo de vida da atualidade favorece a extroversão e toda a energia psíquica é direcionada para o mundo externo. Prestar atenção em um sonho, por outro lado, é um movimento inverso, que requer introspeção e reflexão”, defende o psicanalista, segundo o qual a real natureza dos sonhos permanece um mistério. "Tentamos compreendê-los pelos efeitos que têm sobre nós. Assim como não sabemos muito bem qual é a natureza da luz ou mesmo do amor, embora possamos sentir seus efeitos", explica.

O sonho tem uma linguagem que muitas vezes contraria a linguagem da consciência do indivíduo, que é aquilo que ele está acostumado a ver. “Podem ser imagens moralmente inaceitáveis. Certo é que há algo em nós que produz essas imagens, símbolos que não estão, necessariamente, em nossa vida consciente, embora seja algo que nos pertence. Santo Agostinho já dizia que, graças a Deus, ele não era responsável por seus sonhos”, conta. Mas é importante lembrar deles. Inácio sugere que as pessoas anotem, mantenham um diário de sonhos para poder consultar de tempos em tempos. A compreensão de um sonho nem sempre é imediata, mas há sempre um sentido que o permeia e que eventualmente pode se revelar. descortinar. “O inconsciente é uma fonte inesgotável de criatividade que jorra pérolas para nossa condição humana todas as noites sob a forma de sonhos. Entretanto, se essa informação não for acolhida adequadamente, retorna ao inconsciente sob a forma de esquecimento, e de modo muito rápido”, explica.

INCONSCIENTE
Jair Amaral/EM/D.A Press
Inácio Cunha, ph.D. em psicologia analítica junguiana, sugere que as pessoas anotem os sonhos para não esquecê-los (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
A psicologia de Jung é interessada nos processos psíquicos profundos, do inconsciente. Ao observar imagens de sonhos de outras pessoas e também provenientes de fantasias, delírios ou alucinações de pacientes, Jung percebeu que vários desses conteúdos tinham características compartilhadas pela humanidade como um todo. Isso era verificado em estudos da mitologia, material antropológico, ritos tribais, sistemas religiosos. Foi da observação de que a psique humana, independente do tempo histórico ou da localização geográfica, produzia imagens que guardavam uma certa correspondência entre si, que Jung cunhou a expressão inconsciente coletivo. Ele compreendeu que todos nós, seres humanos, temos um padrão de funcionamento da psique que é comum.

Já o inconsciente pessoal, como proposto por Freud no início do movimento psicanalítico, a compreensão era de que essa instância psíquica era apenas um depositário de material rejeitado ou reprimido. Segundo a psicóloga e psicanalista junguiana Andrea Fiúza Hunt, a ideia anterior à descoberta de Jung era a de que nascíamos sem nada e com o passar da vida criaríamos nossa história. Algumas coisas eram mantidas no plano de frente, no consciente; outras eram reprimidas, colocadas no inconsciente, por serem traumáticas, ou porque se esquecia. Era desse lugar que viriam os sonhos. Foi com Jung que os sonhos passaram a ser percebidos como algo muito além do que apenas a manifestação de desejos reprimidos.

A observação dessas mensagens era o que Jung, e hoje os analistas que trabalham em sua perspectiva, usava para observar como o inconsciente agiam sobre nossa vida diária. “Tratam-se de instrumentos fundamentais para compreender como o homem age. Os sonhos são parte de um arsenal de conhecimento à disposição de cada indivíduo e, quando surgem, comentam sobre sua atividade. É por isso que, anotado, o sonho pode nos ajudar.” Segundo Inácio, é importante refletir, ponderar e sobretudo tentar explicar seu significado. Ao lidar com os sonhos nas sessões analíticas, o importante é a relação e a percepção do paciente com as associações que fez daquela imagem.

Já os pesadelos são, por definição, sonhos ruins que causam um impacto negativo muito forte. Segundo Inácio, o inconsciente está muito interessado que a pessoa preste atenção naquela imagem e por isso ela vem com uma carga emotiva muito intensa. “Ao invés de simplesmente descartar as dificuldades emocional e psíquica, ou investir em demasia na busca de sua causa, à vezes é mais importante tentar entender a finalidade delas, pois, possivelmente, esse descompasso é motivado por alguma intenção alojada no inconsciente que clama por fazer do indivíduo um ser mais inteiro”, explica o psicanalista.