Com câncer raríssimo, jovem mineira encontra forças em campanha na internet e na amizade

Melhor amiga de Priscila Macedo mobilizou família e amigos para criar uma página e reunir os recursos necessários para o tratamento nos Estados Unidos

por Letícia Orlandi 27/06/2014 14:05

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Priscila, de 31 anos, já passou por vários tratamentos, mas ainda não conseguiu controlar o rabdomiosarcoma (foto: Reprodução / Facebook)
Em sua última visita ao Brasil, a gestora comercial Roberta Antunes Camargos, de 30 anos, não parou um minuto. Ela veio de Portugal, onde mora há oito anos, para fazer companhia à melhor amiga, Priscila Vila Real Macedo, de 31 anos, que estava internada para o tratamento de um câncer raro. Mas ela viu que, se ficasse ali 'só' acompanhando, não ia conseguir ajudar da forma como queria. “Eu vi minha amiga entregue à doença, sem ânimo, não se alimentava direito, ela estava perdendo as esperanças. Comecei a pesquisar por conta própria e descobri, com a ajuda de amigos fluentes em inglês e de vários e-mails e telefonemas, que um hospital norte-americano tem especialistas na doença e alcança um índice de cura de 80%”, explica Roberta.

A campanha está no ar com a página 'Vamos salvar a Priscila', criada no último dia 11 de junho, e que já conta com mais de 3.200 curtidas. Da meta a ser alcançada – R$100 mil -, 10% já foram arrecadados. “A partir daí, retomei a fé e passei a confiar na minha vitória sobre a doença. Agora sim, acho que é possível e que vamos conseguir”, afirma Priscila, que é mãe de três filhos – o mais velho, de 13; e um casal de gêmeos de 6. Para quem quiser ajudar, os dados são:

Banco do Brasil – Agência: 1228-9 / Conta Corrente: 35696-4 / Nome: Priscila Vila Real Macedo
Doações internacionais – IBAN: BR8300000000012280000356964 / SWIFT: BRASJPJT

Contudo, até chegar a esse ponto, a jornada da gerente de vendas não foi fácil. “Tudo começou quando senti um caroço no meu rosto. Fiz vários exames, passei por vários hospitais e, no primeiro semestre de 2013, tive o diagnóstico definitivo: rabdomiosarcoma alveolar de alto grau”, conta. Como havia perdido recentemente um tio para o câncer de intestino, a notícia caiu com uma sentença cruel. “Pensei nos meus filhos e na minha família. Foi desesperador”, acrescenta.

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Roberta (à esq.), criadora da campanha, é amiga de Priscila há 16 anos: "ficar parada ao lado dela não era suficiente" (foto: Reprodução / Facebook)
Ela já passou por dois tipos de tratamento quimioterápico e uma cirurgia. “Nesta intervenção, foi detectado que o tumor já havia se espalhado para o crânio e a mandíbula, e que não seria possível fazer a retirada completa. Depois disso, precisei mudar a quimioterapia. Ainda não sabemos se vai funcionar. E recebi a notícia de que não poderia passar por outra cirurgia, por enquanto. Isso me desanimou muito”, relata.

Com a chegada da amiga, de surpresa, as coisas começaram a mudar. Priscila chegou até a ficar confusa com o comportamento de Roberta, que conhece há 16 anos. "Ela veio com a promessa de não arredar o pé do quarto. E sumiu por alguns dias. Eu até perguntei o que estava acontecendo. Aí, ela marcou um encontro e já estava com tudo pronto – o contato com o hospital, os documentos que eu deveria preencher, a ideia da página, tudo! E disse que não ia deixar eu me entregar à doença, não ia aceitar. Ela me devolveu o pé no chão e a luz no fim do túnel”, emociona-se. Priscila passou a receber, desde que a mobilização começou, recados e doações de conhecidos, vizinhos e pessoas que ela nunca viu, de outros estados e países.

Sem medir esforços
Roberta chegou a perder o emprego que tinha em Portugal e precisou ficar 42 dias afastada da filha de 6 anos para conseguir articular a campanha. Ela conheceu Priscila ainda adolescente, aos 15 anos, por meio de primos que estudavam juntos. “Foi amor à primeira vista. Ela se tornou minha irmã”, relata. Ela já estava há dois anos e meio sem vir ao Brasil e, quando a doença se agravou, resolveu que era hora. “Perdi minha mãe, também com câncer, aos 7 anos. Os filhos mais novos da Priscila têm essa idade. O conjunto de sentimentos me fez largar tudo e organizar logo a viagem”, detalha.

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Priscila com os filhos: a esperança é de obter recursos para custear as despesas médicas nos Estados Unidos (foto: Reprodução / Facebook)
Quando chegou e 'tomou pé' da situação, Roberta achou que Priscila precisava de um outro tipo de ajuda. Foi aí que começou, com a ajuda de parentes e amigos, a pesquisa que chegou ao MD Anderson Cancer Center, referência mundial no tratamento de todos os tipos da doença. Ela só contou a novidade à amiga depois que havia recebido uma resposta do hospital com o valor necessário e os procedimentos para marcar a consulta. “Expliquei que ela também precisaria abraçar a causa, se animar, acordar cedo, se alimentar bem, atualizar a campanha junto comigo. No dia em que criamos a página e já tivemos mais de mil curtidas em 12 horas, tivemos um dos momentos mais felizes das nossas vidas”, comemora.

Outras ferramentas também vieram para ajudar, como grupos, em aplicativos e redes sociais, de mulheres que enfrentaram ou enfrentam o câncer. Neles, Priscila deixa de se sentir diferente. “Isso deu nova vida a ela. Já até consegui, antes de voltar para Portugal, levá-la a uma festa de família”, contou Roberta ao Saúde Plena pelo telefone. Agora, de novo a distância, ela diz que torce para que tudo corra bem até que Priscila possa ir para o Texas. “Nossa sorte é que ela tem uma família muito sólida. A irmã, que é atleta e estava cumprindo um contrato na Rússia, também veio para o Brasil. A mãe não sai do lado dela. Todos os que estão em volta estão muito esperançosos e esse fortalecimento emocional é fundamental”, conclui a idealizadora da campanha.

Conheça a página da campanha: Vamos salvar a Priscila

Soraia Piva / EM / DA Press
(foto: Soraia Piva / EM / DA Press)
Doença raríssima

A oncologista Helena Flávia Cuba de Almada Lima, médica da Oncoclínicas do Brasil, explica que os sarcomas são tumores malignos que começam nos tecidos moles do nosso corpo, os chamados tecidos conectivos – músculos, tecidos gordurosos, membranas que revestem vasos sanguíneos ou articulações, por exemplo.

São três os tipos de músculos humanos – os esqueléticos, que são nossos conhecidos e conseguimos controlá-los, como um músculo da perna ou do braço; o músculo cardíaco e os músculos lisos (que formam a parede dos órgãos internos), sobre os quais não temos controle. Os rabdomiosarcomas, especificamente, têm origem em células que vão se tornar músculos esqueléticos no futuro. “Essas células, os rabdomioblastos, formam-se no embrião por volta da sétima semana de gestação. Quando há uma alteração nessa fase, pode haver a formação do sarcoma. E é por isso que eles se desenvolvem de forma mais frequente em pacientes bem jovens. Cerca de 85% desses tumores aparecem em crianças e adolescentes”, explica a médica.

A especialista acrescenta que os tipos mais frequentes de rabdomiosarcoma são o embrionário e o alveolar. Só que o alveolar é ainda um pouco mais raro, afetando crianças acima de 6 anos e adolescentes. “Ou seja, a Priscila tem vários fatores de raridade para a doença”, relata. Pelas pesquisas que realizou, a gerente de vendas acredita ser a única portadora no Brasil.

Enquanto em crianças o tratamento tem um prognóstico melhor, desde que diagnosticado cedo, em adultos a taxa de cura é menos ampla. “O tratamento vai depender do tamanho e das características do tumor – se ele está localizado, se avançou para regiões adjacentes, se já houve metástase. Mas geralmente é uma intervenção trimodal – cirurgia, radioterapia e quimioterapia”, esclarece a oncologista. “É um tumor agressivo. Neste caso, como está localizado na região da cabeça, é possível, sim, que o tratamento dê resultado para o controle ou cura”, aponta.

Uma das dificuldades em relação ao rabdomiosarcomas é a falta de sintomas específicos. Geralmente a pessoa percebe após o crescimento do tumor, que passa a incomodar sob a pele, pressionar o olho ou causar uma obstrução nasal, por exemplo. Cerca de 40% dos tumores aparecem na região da cabça e do pescoço. “Não há uma forma de prevenção, porque esse tipo de câncer não é associado a fatores ambientais, externos. Há apenas alguns indicativos de síndromes familiares, também muito raras, associadas ao rabdomiosarcoma. E estudos em andamento para identificar mutações genéticas vinculadas ao desenvolvimento dos tumores, mas nada que já esteja disponível, hoje, para auxiliar o diagnóstico”, conclui Helena Lima.