A alegria do cupido: juntar um casal traz satisfação também ao amigo em comum

Pesquisa feita nos Estados Unidos mostra que ajudar pessoas conhecidas a iniciarem um relacionamento amoroso beneficia também o autor da 'flechada'. Quer fazer o papel de cupido? Veja dicas

por Correio Braziliense 10/03/2014 10:30

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Carlos Vieira /CB/D.A Press
Maria Cristina e Horst começaram a namorar pela internet graças a uma amiga em comum, ex-noiva dele: apresentados por alguém de confiança (foto: Carlos Vieira /CB/D.A Press)
Para os gregos, Eros era a divindade responsável pela união amorosa entre os seres. Rebatizado de Cupido pelos romanos, seu mito recebeu diversas versões ao longo do tempo, até que o antigo deus assumiu, em cartões e anúncios publicitários, a figura de uma criança loira e com asas que carrega uma flecha sempre preparada para acertar um coração solitário. O mundo hoje, contudo, está repleto de Cupidos. São indivíduos que buscam juntar pessoas que, eles acreditam, darão certo juntas. Podem assumir a forma de amigos, tias, colegas de trabalho ou qualquer pessoa disposta a unir um casal.

Por serviço tão nobre, os Eros contemporâneos recebem como pagamento felicidade. Isso mesmo. De acordo com uma pesquisa feita nos Estados Unidos, quem colabora para uniões amorosas sente um elevado grau de satisfação. Para chegar a essa conclusão, Lalin Anik, pesquisadora da Universidade de Duke, e Michael Norton, da Harvard Business School, realizaram uma série de estudos em que procuraram correlacionar a habilidade de juntar casais com o bem-estar sentido no dia a dia.

Em um dos experimentos, por exemplo, eles convidaram 301 pessoas para responderem questionários nos quais avaliavam tanto a própria capacidade de bancar o cupido quanto como se sentiam geralmente. Esses e outros testes permitiram aos autores concluir que colaborar para o amor dos outros é uma atividade que costuma gerar grande satisfação e está associada a níveis mais elevados de felicidade. “Nós demonstramos que formar casais — criando laços entre outros — é intrinsecamente recompensador e remunera na forma de elevado bem-estar”, escrevem os autores no trabalho, publicado mês passado no jornal especializado Social Psychological and Personality Science.

Para especialistas, diferentes motivos podem levar a esse sentimento de alegria. A psicóloga Julie Maarraoui, que não participou da pesquisa, acredita que um fator pode ser a ideia de que estar só é algo ruim. Portanto, quando a pessoa colabora para que um conhecido saia dessa situação, sente que está contribuindo para a felicidade do outro. “Podemos, inclusive, observar que existem cada vez mais programas de rádio, televisão e internet sobre esse assunto”, lembra. A psicóloga clínica Solange Rosset aponta ainda outras possíveis causas. Os Cupidos podem, por exemplo, se sentirem com o dom da premonição, como se soubessem antecipadamente o que vai funcionar. “Eles se sentem competentes”, diz. É provável ainda que essas pessoas se sintam potentes e acima de problemas, entre inúmeros outros motivos que as levam a agir.

Confiança
 Janine Moraes/CB/D.A Press
Jaqueline não só junta casais como se torna conselheira deles (foto: Janine Moraes/CB/D.A Press)
Explicar por que trabalhar em nome do amor proporciona alegrias pode ser difícil. Mas é fácil ver que os Cupidos de hoje cumprem uma importante missão. Estudo realizado no ano passado por pesquisadores da Universidade de Chicago apontou que a maior parte dos casamentos realizados nos Estados Unidos entre 2005 e 2012 só aconteceu porque um amigo em comum apresentou os noivos. Exatamente o que aconteceu com a servidora pública Maria Cristina Feibert, 47 anos, e o corretor de imóveis Horst Feibert, 49, que se aproximaram graças a uma ex-noiva dele, que também era amiga de Maria Cristina. “Depois de eles se separarem, ela me falou muito bem dele e disse que nós daríamos certo. Por isso começamos a conversar”, conta a servidora.

Na época, Horst, que é alemão naturalizado americano, morava nos Estados Unidos. Por isso, o casal namorou a distância durante um ano. Depois disso, ela tirou licença e foi morar com ele na Flórida, onde se casaram. Voltaram ao Brasil, mas, como não pretendem morar aqui, abriram uma corretora de imóveis em Miami. “Eu não namoraria pela internet se não fôssemos apresentados por alguém de confiança. Mesmo nos falando duas vezes por dia, não daria para saber quem estava do outro lado da tela”, diz Maria Cristina.

Trabalhar para que finais felizes assim sejam cada vez mais comuns é uma das atividades prediletas da secretária do lar Jaqueline Mendes, 32 anos. Ela é uma espécie de especialista quando o assunto é ligar corações. Jaqueline conta que já juntou desde pessoas que não se conheciam até casais que haviam se separado. E não nega: fica muito feliz quando vê que foi a causa da alegria alheia. “Além de unir, eu sou conselheira dos casais durante os relacionamentos. Quando acontece algum problema, sempre me procuram, e eu busco saber o que está havendo para poder ajudar”, diz.

Jaqueline se lembra de uma história especial, quando uniu um casal de amigos — ela com 40 anos na época, ele, com pouco mais de 20. “Primeiro, eu os apresentei por telefone, e eles se falaram dessa maneira por algum tempo. Até que, um dia, quando ela veio me visitar, liguei para meu amigo e disse para passar na minha casa, para se conhecerem”, recorda, orgulhosa de que o casal está junto há mais de cinco anos.

Outro momento que julga especial foi a vez que ajudou um casal a se reconciliar. “Por motivos pessoais, ele se separaram. Tinham três filhos pequenos, e eu não podia ver aquela família se despedaçando. Puxei os dois separadamente para conversar e marquei um encontro em uma festa. Coloquei um na frente do outro e falei para eles tomarem vergonha na cara e conversarem”, ri, contente de que os dois estão felizes e juntos, “se amando” graças às broncas dela.

 Janine Moraes/CB/D.A Press
Após trabalhar para uniões que não deram certo, Glênis desistiu da tarefa (foto: Janine Moraes/CB/D.A Press )
Frustração

Após a ajuda inicial, contudo, o sucesso da relação depende completamente do casal. Segundo a psicóloga Julie Maarraoui, insegurança, ciúmes, sentimento de posse e “jogos emocionais” desgastam uma união que inicialmente seria considerada saudável. “Não há relação inabalável. O que existem são relações fomentadas diariamente”, explica. Por isso, um risco que os Cupidos correm é o de experimentarem uma sensação de tristeza por não terem “acertado” na união. “É importante sempre termos consciência de que qualquer situação na vida pode dar certo ou errado”, aconselha Maarraoui.

Algumas tentativas frustradas de ajudar encontros românticos levou a estudante Glênis Cardoso, 21 anos, a largar de mão da história de bancar o Cupido. Na primeira vez, ainda bem nova, durante a adolescência, admite que romantizou demais a situação, inspirada por um romance de Jane Austen: “Eu ainda estava no ensino fundamental. Achei que os dois fossem dar certo, mas eles saíram somente durante duas semanas, nos intervalos das aulas.” Depois, já no ensino médio, ela juntou dois amigos porque os achava “meigos e doces”, mas o relacionamento acabou dois anos mais tarde.

Na última tentativa que deu errado, ela estava convencida de que os pombinhos haviam nascido um para o outro. “Sabe aquelas histórias de amor que se repetem nas telas? Eu quase podia ver na vida real”, conta. Glênis tentou de tudo, quase mandou uma mensagem anônima via a rede social da universidade, mas nada de os dois engatarem o relacionamento. “No fim, o sentimento era de decepção. Temos que lembrar que não vivemos em um livro”, diz a estudante.

Dinheiro não
Uma conclusão interessante do estudo é que o nível de satisfação em ajudar a união romântica é muito maior quando feita de maneira aparentemente desinteressada. Quando realizaram uma simulação de laboratório em que voluntários podiam lucrar ao apontar casais que dariam certo, os participantes não se sentiram tão satisfeitos. Para os autores, isso indica que, nesse caso, o dinheiro não traz, mas afasta a felicidade dos Cupidos.

Como agir
Quer fazer o papel de Cupido? Veja algumas dicas da psicóloga Solange Rosset de como evitar erros ao apresentar duas pessoas:

» Saber bastante sobre a rotina dos dois, pois torna mais fácil fazer ligações que deem certo
» Juntar pessoas que têm mesmos interesses, mesmos valores e mesmos objetivos de vida facilita com que se entendam
» Formar um par que tenha disponibilidade para aprender com um o outro
» Após fazer a aproximação, deixar que os dois desenvolvam a relação da sua forma, mantendo uma distância segura. Um possível erro do Cupido é tentar, mesmo inconscientemente, permanecer no controle da relação do casal