Técnica facilita cirurgia contra câncer no cérebro

Pela emissão de luzes, equipamento produz imagens que ajudam cirurgiões a delimitar com precisão as células comprometidas pelo tumor. A informação evita a retirada de estruturas sadias e reduz as chances de sequelas

por Paulo Lima 06/09/2013 11:00

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Embora a medicina tenha avançado nas técnicas cirúrgicas para o tratamento do câncer, preservar ao máximo as células sadias e retirar todas as que têm tumor continua sendo um desafio. Quando a doença se dá no cérebro, esse cuidado é envolto com a possibilidade de afetar as capacidades cognitivas do paciente. Pesquisadores das universidades de Michigan e de Harvard, nos Estados Unidos, aprimoram uma técnica que pode amenizar o problema. O estudo, publicado na revista Science Translational Medicine, mostra que, com um laser, é possível operar pacientes com glioblastoma multiforme, o tipo mais agressivo em seres humanos, sem deixar para trás células que poderiam gerar um novo tumor.

Valdo Virgo/CB/D.A Press
Clique na imagem para ampliá-la e saiba mais (foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)
O procedimento é uma adaptação da microscopia Raman, técnica que mapeia espécimes biológicas para identificar o câncer. Ela funciona com a emissão de luzes que identificam as células cancerígenas, mas sem muita precisão. Ao codificar um sinal da ferramenta que emite duas cores de luz, os pesquisadores conseguiram ampliar a resolução das imagens obtidas, o que facilita a identificação dos tecidos doentes (veja infográfico). Segundo eles, a nova ferramenta, chamada de stimulated raman scattering (SRS), permitirá uma abordagem mais segura durante as cirurgias.

“Com o sinal do SRS elevado, podemos rapidamente gerar imagens de alta resolução, que proporcionam detalhes da forma como as células são organizadas nos tecidos. A diferença mais óbvia entre o cérebro normal e o tumor infiltrado é a forma como as células são dispostas. Os tumores são cheios de células hermeticamente embaladas e de muitos vasos sanguíneos minúsculos. Já as células normais do cérebro são bem organizadas em regiões específicas, denominadas núcleos ou camadas que compõem o córtex”, esclarece Daniel Orringer, coautor do estudo e pesquisador da Universidade de Michigan.

Diretor do Centro de Câncer de Brasília (Cettro), o médico Murilo Buso explica que a técnica pode ter efeitos significativos para a melhora da cirurgia. Isso porque, embora a frequência da doença não seja alta, o glioblastoma multiforme é o mais agressivo entre os tumores cerebrais. “O tempo de vida, mesmo com a intervenção cirúrgica, é de em média 16 meses. Trata-se de um câncer infiltrativo, que é de difícil cura, pois fica junto aos tecidos saudáveis”, explica o médico, que diz não existirem causas aparentes para o desenvolvimento da doença, diagnosticada geralmente por ressonância magnética ou tomografia computadorizada.

Para a médica Daniele Ferreira Neves, do Centro de Tratamento Oncológico Oncoclínica, no Rio de Janeiro, a ferramenta SRS, caso seja aprimorado o estudo, poderá ser usada para identificar outros tipos de câncer cerebral. “Seria bem maior a chance de cura com a possibilidade de ter mais detalhes sobre a margem do tumor, que poderá ser retirado por inteiro”, explica. Hoje, segundo ele, há uma necessidade de combinação de intervenções pela dificuldade do procedimento cirúrgico. “Infelizmente, hoje, a otimização da cirurgia não é aplicável, por isso a necessidade de tratamento com radioterapia e quimioterapia para eliminar as células com câncer que não são extraídas durante a cirurgia”, explica a oncologista.

Divulgação/Universidade de Michigan
Segundo Daniel Orringer, a técnica identifica tumores escondidos entre as células sadias (foto: Divulgação/Universidade de Michigan)
De acordo com Buso, as técnicas atuais de visualização do câncer no cérebro são focadas no contraste, conseguido por meio de substâncias que mostram as células com tumor. Essas estruturas, retiradas durante a cirurgia, são diagnosticadas no microscópio e se diferenciam por ficarem mais brilhosas. “Mas nem sempre se consegue ver o limite tecidual, por isso a necessidade de um equipamento que evite, por exemplo, que o cirurgião retire tecidos saudáveis e venha a comprometer mais a saúde do indivíduo com sequelas graves”, afirma.

Próxima etapas

Segundo Daniel Orringer, da Universidade de Michigan, a maior surpresa durante a pesquisa foi saber que a SRS poderia revelar tumores em regiões do cérebro que parecem normais ao olho nu. “Com a ferramenta, foi possível mostrar uma clara fronteira entre os dois”. O pesquisador conta que havia uma frustração entre os integrantes da equipe devido à dificuldade em diferenciar o tumor cerebral durante as cirurgias. “Nós pensamos que a magnitude desse problema estava subestimada. Agora, estamos animados com a SRS porque ela oferece uma forma que poderá ajudar na remoção completa do câncer”, avalia.

Autor principal do estudo, Minbiao Ji diz que o próximo objetivo do grupo de pesquisadores é coletar imagens de tumores em cérebros humanos e implementar uma ferramenta com SRS que seja mais acessível no ato da cirurgia. “Como a SRS fica inviável para algumas salas de cirurgia por causa do tamanho do equipamento, já estamos estudando a viabilização de uma sonda de SRS que emita as luzes. Do tamanho de uma escova de dentes, ela teria componentes de baixo custo e fibra ótica e ajudará sobremaneira o médico e o paciente”, finaliza.

Desenvolvimento silencioso
De forma geral, os tumores cerebrais aparecem isolados e, quando diagnosticados, a doença já está avançada. Sintomas como dor de cabeça intensa, convulsão e diminuição dos sentidos em algumas partes do corpo podem sinalizar a enfermidade. Especialistas reforçam a importância da visita regular ao médico para que sejam possíveis o diagnóstico e o tratamento precoce da doença.