Chegada dos 18 anos encerra ciclo e transição deve ser acompanhada de perto pelos pais

O marco encerra simbolicamente o turbilhão de transformações da adolescência e inicia uma etapa da vida com mais responsabilidade e autonomia

por Correio Braziliense 26/08/2013 12:00

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Viola Júnior/Esp. CB/D.A Press
"Caiu a ficha de que eu precisava me dedicar mais, de que não era mais criança. A faculdade também torna isso mais forte" Nicole Volken, estudante de engenharia ambiental (foto: Viola Júnior/Esp. CB/D.A Press)
A chegada dos 18 anos é um momento esperado por todo jovem. Chega o sinal verde para, por exemplo, dirigir, comprar bebidas alcoólicas e frequentar as animadas festas. Para além das novas liberdades, atingir a maioridade também traz deveres que antes poderiam não fazer parte do cotidiano. Muitas vezes, diante das novas atribuições, há quem se sinta perdido e encontre dificuldades de adaptação. “Pode haver frustrações e inseguranças. Até pouco tempo, ele estava com os dois pés na infância. Após a puberdade, com um pé na infância e outro na vida adulta. Depois, assustadoramente, com os dois na fase adulta”, afirma o mestre em psicologia da infância e da adolescência Caio Feijó.

A mudança, no entanto, não acontece instantaneamente. As transformações fazem parte de um processo que começa antes dos 18 anos e não para depois dele. Para enfrentar os desafios da passagem com mais tranquilidade, é importante que o jovem receba auxílio. “Ele deve contar com o apoio da família, da escola e do Estado em todas as etapas de transição para a vida adulta, pois ela não começa automaticamente ao se completar 18 anos”, afirma a socióloga Melissa de Mattos Pimenta.

As consequências que a maioridade traz também dependem do contexto em que se está inserido e variam dentro de cada sociedade. Condições econômicas e relações familiares, por exemplo, influenciam na forma como a transição para a vida adulta acontecerá e se refletem no processo de amadurecimento do adolescente antes mesmo de ele chegar aos 18 anos. “Estar preparado para a transição tem muito mais a ver com a condição socioeconômica do jovem, com o seu amadurecimento e com as suas perspectivas futuras”, explica Mattos Pimenta, também professora do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Carreira
Nesse turbilhão de mudanças, estão também escolhas que farão a diferença na vida adulta. Entrar na maioridade também representa o momento de escolher definitivamente uma profissão. Logo após completar 18 anos, em setembro do ano passado, Gabriel do Nascimento se viu perdido para fazer a opção. Depois de não ser aprovado no primeiro vestibular que prestou (para o curso de direito), ele começou a questionar qual objetivo teria a partir daquele novo momento. No cursinho pré-vestibular, quanto mais pesquisava sobre a carreira que deveria escolher, menos se sentia preparado para a definição. Pesava sobre a decisão de Gabriel a chegada dos 18 anos e a necessidade de uma decisão permanente. “O que eu decidisse precisaria se manter firme porque desistir depois representaria um atraso muito grande na minha vida”, avalia o jovem.

Até a aprovação em engenharia no último vestibular da Universidade de Brasília (UnB), foram oito meses em que o estudante chegou até a desistir da preparação para a prova e passou a estudar para concursos públicos. A facilidade com disciplinas de ciências exatas, entretanto, direcionou Gabriel para o curso de engenharias, no câmpus Gama da UnB. “Uma das minhas motivações foi o fato de que, nesse curso, só se escolhe a especialização depois de dois anos, depois de conhecer melhor a prática”, explica. Apesar das dificuldades, o universitário não reclama da obrigação de escolher tão cedo. “Tomamos decisões que não estamos preparados, mas entendo que isso nos faz ter mais maturidade.”

Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
A escolha da profissão foi uma das principais inquietações de Gabriel (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
As dúvidas quanto à escolha da profissão e outras decisões importantes podem ser menores, de acordo com a psicóloga Patrícia Spindler, se o jovem recebe apoio e é instigado a pensar nelas desde cedo. A exigência de uma nova postura precisa vir acompanhada de diálogo e de orientações que mostrem a importância e a necessidade desse processo. “As exigências precisam fazer sentido para o adolescente despertar o desejo de pensar em atividades de maior autonomia, de independência com responsabilidade”, explica.

Apoio familiar
Chegar aos 18 anos, para Gabriel, representou também uma mudança na visão que as outras pessoas tinham dele e de suas atitudes. “Só de estar dirigindo, por exemplo, eu percebi que a imagem muda, porque exige responsabilidade, cuidado. As pessoas notam isso.” O fato de a maioridade permitir ações que antes precisavam ser feitas escondidas, segundo o universitário, foi um dos principais fatores da nova etapa de vida. “Ao mesmo tempo que isso é bom, pode também ser um risco”, pondera.

Feijó alerta sobre a importância da participação dos pais nesse momento. De acordo com o psicólogo, a família precisa estar atenta e cobrar do filho que assuma e cumpra compromissos e responsabilidades, sem deixar de mostrar a ele que estará disposta a apoiá-lo quando for necessário. “Isso assusta porque ele vive a fase final da adolescência e tem ainda inseguranças com relação à autonomia.”

A estudante de engenharia ambiental Nicole Volken, 18, conta que a maioridade, aliada ao fato de ingressar no curso universitário, foi responsável por fazê-la perceber que entrava em uma nova fase de mais liberdade e, no entanto, de mais deveres. “Caiu a ficha de que eu precisava me dedicar mais, de que não era mais criança. A faculdade também torna isso mais forte”, afirma.

O momento não é mais de esperar que pais cobrem, mas de, por si só, buscar novas possibilidades, acredita Nicole. “Você sai de uma fase em que estuda porque seus pais estão ali cobrando e passa a outra em que entende que precisa se esforçar pelo seu futuro, seguir sua vida”, compara. A jovem universitária não notou mudança no modo como as pessoas mais próximas a tratavam, mas acredita que isso fica claro em alguns ambientes, como a universidade. “Os professores já nos tratam mesmo como adultos, ninguém vai contar aos seus pais que você está indo mal nas aulas”, diz.



Percepções individuais

“Do ponto de vista da vida civil, efetivamente acontecem mudanças com a chegada dos 18 anos, como a permissão para conduzir veículos e a responsabilidade plena pelos atos, o que habilita a pessoa a ser tratada como adulta do ponto de vista da lei. Isso não significa que todos os jovens vivenciem essa passagem da mesma forma ou que essa condição legal tenha o mesmo significado. Para um jovem que tem condições de ter um automóvel, pode ser algo muito significativo, enquanto, para um jovem cuja família não tem condições de presenteá-lo com um carro ou então de adquirir um com seus próprios meios, pode não ter a mesma importância.

Melissa de Mattos Pimenta, socióloga

Janine Moraes/CB/D.A Press
Apoiado pelos pais, Carlos quis trabalhar aos 15 anos. Parou quando foi aprovado no vestibular de história (foto: Janine Moraes/CB/D.A Press)
Decisões compartilhadas
Três anos antes de completar 18 anos, o estudante de história Carlos Carvalho, hoje com 18, começou a viver as transformações típicas da maioridade. Ele decidiu trabalhar. Seguiu no emprego até entrar na universidade no ano passado, quando passou a se dedicar somente aos estudos e a tarefas da própria faculdade. “Eu quis trabalhar, não era uma exigência e, desde então, as mudanças já começaram a acontecer. Quando cheguei aos 18, acredito que estava mais preparado”, conta.

Mesmo com a independência conquistada, Carlos não deixou de buscar nos pais referências para as decisões que precisa tomar. “Elas são minhas, mas sempre procuro tomá-las com auxílio deles”, conta. Confiar nos pais e nos professores pode ser um bom modo de avaliar se o caminho que se pretende seguir está correto. “Não é o momento propício para movimentos instintivos, ao contrário, é uma fase da vida que requer muito ‘pés no chão’”, afirma Caio Feijó, especialista em psicologia da infância e da adolescência.

A psicóloga Patrícia Spindler concorda que é importante ter o apoio da família para resolver as dúvidas e as dificuldades, mas ressalta que esse processo não pode ser totalmente ofuscado pela ação das famílias. “O jovem passa pela mudança mais tranquilamente se tiver esse espaço para expressar seus anseios”, explica. Outra preocupação dessa fase da vida é a tendência de os jovens acharem que estão imunes a episódios ruins e que podem fazer tudo. “É uma sensação de que ‘tudo posso’ com 18 anos. Não é bem assim, não se pode tudo. A partir dessa etapa, ele também tem o peso das novas responsabilidades”, ressalta Spindler.

A socióloga Melissa de Mattos Pimenta aponta para a necessidade de políticas públicas que facilitem o desenvolvimento dos jovens e a transição para a vida adulta. Permanência nas escolas, programas que tornem mais simples a profissionalização e facilitem o ingresso no mercado de trabalho formal são exemplos de iniciativas a serem fomentadas, de acordo com a socióloga. “Todo jovem pode e deve buscar recursos que o ajudem em seus projetos e reivindicar também o apoio institucional nas decisões e na trajetória de transição para a vida adulta”, afirma.