
E veio também a necessidade de exames mais completos, que avaliem se há alguma dificuldade de enxergar no escuro, se há algum problema com o movimento e a noção espacial, além da pressão ocular e do fundo de olho, por exemplo.
Quanto mais cedo qualquer problema for identificado, mais fácil é o tratamento e melhor é o resultado.
Teste do olhinho e acompanhamento

O exame consiste na emissão de luz na pupila do bebê recém-nascido com o uso do oftalmoscópio, aparelho similar a uma lanterna. O reflexo vermelho indica que as principais estruturas internas do olho estão normais. Além de rápido e indolor, o teste permite o encaminhamento ao médico oftalmologista no caso de irregularidades na avaliação, para o diagnóstico precoce, aumentando a possibilidade de cura.
Érika explica que a região do cérebro associada à visão ‘cicatriza’, ou seja, se torna igual à de um adulto, aos 7 anos de idade. Caso seja identificado algum problema antes desse limite, as chances de recuperação de 100% da acuidade visual são grandes. “Às vezes recebo crianças com 8 anos e sou obrigada a dizer aos pais que chegaram um pouco tarde”, lamenta.
Quando um olho se desenvolve mais do que o outro, por exemplo, é bem comum que a criança se adapte e não perceba a diferença, a ponto de alertar os pais ou professores. “O cérebro escolhe a maneira mais fácil de enxergar e o olho que tem a deficiência acaba ignorado. A falta de diagnóstico pode levar à perda completa da visão neste olho”, explica Érika. Por outro lado, se a diferença for descoberta cedo, antes dos 7 anos, a colocação de um simples tampão já traz resultados em até 30 dias.

Uma visita ao oftalmologista pode evitar também a descoberta tardia de um tumor intraocular e da toxoplasmose congênita. “Atendi recentemente ao caso de uma criança de 2 anos que já havia passado por outros médicos e finalmente chegou a mim. Ela teve um dos olhos removidos devido a um tumor, passa por quimioterapia e corre o risco de perder a visão no outro olho. Uma visita anual ao oftalmogista poderia ter minimizado as consequências do problema”, relata a médica.
A recomendação da especialista é que, se o teste do olhinho aponta condições normais, a criança deve ser levada ao oftalmologista antes dos dois anos de idade. A partir daí, devem seguir a recomendação do profissional e retornar anualmente ou de dois em dois anos, dependendo do caso.
Mundo digital
Outro fator que não deve ser desprezado é a porcentagem da população com problemas oculares. Enquanto no Brasil estima-se que cerca de 30% das pessoas apresentem algum problema, nos Estados Unidos essa taxa está em 45%, em Cingapura alcança 75% e em Taiwan, impressionantes 90%. “Essa taxa vem crescendo e uma das razões – embora existam outros fatores – pode ser a exposição exagerada e precoce aos ambientes digitais, repletos de joguinhos e telas em geral”, relata Ricardo Guimarães.

O médico lembra também sobre a necessidade de atenção de pais, professores e profissionais de saúde à Síndrome de Irlen (saiba mais nesta matéria do Saúde Plena). Crianças na pré-escola, por exemplo, já são capazes de ver uma letra, associar ao som e reconhecê-las em palavras. Mas algumas delas, mesmo sendo participativas, espertas e apresentando normalidade nos exames de estrabismo e miopia, por exemplo, não se saem bem na leitura. Isso pode afetar a sua autoimagem e interesse pelo aprendizado, tornando o acesso à escola um pesadelo. Excluindo-se os déficits mentais e a cegueira, por exemplo, as principais causas de dificuldades na leitura são a Dislexia de desenvolvimento e a Síndrome de Irlen.
Embora a dislexia já seja reconhecida e tenha apoio multidisciplinar, a Síndrome de Irlen ainda carece de atenção. “Ela pode até impedir que a pessoa venha a ler algum dia”, ressalta Guimarães, lembrando que a síndrome afeta em torno de 12 a 15% da população mundial. Pesquisas realizadas em escolas de Belo Horizonte confirmaram essa prevalência também aqui no Brasil.
Como identificar?
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Nos Estados Unidos, por exemplo, o exame de rastreamento é feito com financiamento público aos 3, aos 5, aos 7 e aos 9 anos – isso quando não é anual. De acordo com o médico, o Brasil conta com alguns projetos isolados, mas nenhuma política pública abrangente que realmente incentive um exame mais completo da condição visual infantil. “Transferir para o professor a responsabilidade de detectar problemas de visão com o velho exame das letrinhas – o teste de Snellen - está longe do ideal. Muitas vezes os estudantes até decoram as letras para fazer a ‘prova’. Cada sala de aula tem uma luminosidade e cada criança é colocada a uma distância diferente do cartaz, provocando distorções nos resultados”, alerta o oftalmologista.
Bom começo
Em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ricardo Guimarães criou o projeto 'Bom Começo', que pretende ampliar o diagnóstico e o tratamento da Síndrome de Irlen, além de outros problemas relacionados à visão em todo o país. O Bom Começo já formou cerca de 1340 profissionais da saúde e educação, de 21 estados brasileiros. Com o treinamento, eles se tornam aptos a identificar e encaminhar as crianças que apresentam dificuldades específicas na leitura e escrita e que podem estar relacionadas à dislexia ou à Síndrome.
No caso da Síndrome de Irlen, é possível realizar o tratamento mesmo que ela seja descoberta em idade avançada. Entretanto, se for identificada mais cedo, as chances de uma vida escolar e profissional mais tranquila é maior. “Estamos em campanha para atualização da classe médica em relação à necessidade de examinar de forma mais completa a visão dos pacientes; e também para alertar os pais em relação ao exame precoce”, define o médico.
Para ampliar essa consciência, será realizado, em Belo Horizonte, no próximo mês de julho, o Congresso Brasileiro de Neurovisão. Para saber mais, acesse o site do evento: www.neurovisao.com