No Dia Mundial do Rock, relembre os discos que marcaram o ano de ouro do gênero, há 30 anos

Em 1986, bandas do cenário underground emplacaram trabalhos considerados primorosos pela crítica musical

por Diário de Pernambuco 13/07/2016 09:33
RPM / Reprodução
'Rádio pirata', do RPM foi um dos ícones de 1986 (foto: RPM / Reprodução )
Quando Luiz Schiavon introduzia nos palcos os primeiros acordes eletrônicos no teclado de 'Revoluções por minuto', aos gritos de "Revolução, revolução, revolução!", jovens ensandecidos entravam em catarse. Bastava Paulo Ricardo surgir, vestido com uma capa preta de ombreiras sobre uma blusa regata cavada, munido de um contrabaixo poderoso, para a histeria atingir o auge.
As cenas se repetiam a cada show do RPM. Quem não conseguia ir às apresentações recorria às lojas de discos para comprar um LP de 'Rádio pirata' ao vivo, um dos álbum emblemáticos do rock brasileiro em 1986. Os hits do disco, 30 anos depois, continuam, além de ácidos, atuais diante de uma crise moral no Brasil.

Hoje, no Dia Mundial do Rock, é possível dizer que em 1986 o rock brasileiro amadureceu, criou vertentes na música popular nacional e deixou uma herança única? Provavelmente, sim. Naquele ano, além do RPM, algumas bandas do cenário underground emplacaram trabalhos considerados primorosos pela crítica musical. 'Cabeça dinossauro' (Titãs), 'Selvagem?' (Paralamas do Sucesso), 'Doi' (Legião Urbana), 'Vivendo e não aprendendo' (Ira!), 'Capital Inicial' (Capital Inicial), 'Longe demais das capitais' (Engenheiros do Hawaii) e 'Heróis da Resistência' (Heróis da Resistência), são exemplos de um ano prolífico para o rock and roll brasileiro, hoje um gênero excluído do ranking das cem músicas nacionais mais tocadas das rádios do país. Avaliar o cenário musical de 30 anos atrás tem a ver, sobretudo, com o momento político e econômico em que o Brasil se encontrava. Engatinhando no pós-ditadura, o país buscava uma identidade em vários aspectos. O rock ecoou a necessidade de mudança.

“Em 1986, houve uma confluência de fatores políticos, com as eleições diretas dois anos antes, sociais e econômicos, culminando no surgimento de bandas do underground que chamaram a atenção do mercado fonográfico. “As grandes gravadoras redescobriram o rock, e o resultado disso foi uma safra de álbuns clássicos que até hoje são atuais”, diz o escritor e jornalista Ricardo Alexandre, autor de Dias de luta - O rock e o Brasil dos anos 1980 (Arquipélago, R$ 59,90). Do ponto de vista artístico, as gravadoras se sentiram mais seguras para ousar e bancar artistas que tocavam em clubes de música do circuito underground, marcados pelo preconceito. Já o público, com o Plano Cruzado, passou a comprar mais. "As gravadores descobriram um novo ‘iê-iê-iê’ e ousaram mesmo, produzindo álbuns de bandas conhecidas do cenário underground que tocavam, praticamente, em clubes de música populares, a exemplo do Madame Satã, em São Paulo. RPM, Titãs e Ira! foram bandas de rock que se apresentaram no local inúmeras vezes", destaca Alexandre.

Para o escritor, que classifica Selvagem? como o álbum mais marcante da época pela “contrariedade do momento”, os clássicos de 1986 permanecem atuais, embora ele ressalte que é injusto comparar o ano com 2016. “Hoje é infinitamente superior àquela época em termos de estrutura de gravação e tecnologia. Acho que temos músicos mais versáteis e com qualidade melhor, mas os picos de criatividade de 30 anos atrás sem dúvida alguma são mais originais”.

Lançamentos turbinaram a indústria

O sucesso dos álbuns lançados há 30 anos não ocorre por acaso. Há quase unanimidade no meio quando são analisadas as letras, críticas, pesadas e que despejavam refrões de luta, indignação e mudança, retratando o contexto do Brasil de 1986. Os trabalhos emplacaram hits que ainda hoje estão vivos na memória dos roqueiros.

A indústria fonográfica, aliás, talvez seja o melhor termômetro para medir o poderio das bandas que aportaram no cenário musical brasileiro em 1986. Somente o RPM vendeu, na época, mais de 2,5 milhões de cópias de Rádio pirata ao vivo. Ainda hoje, está entre os recordistas de vendagens no Brasil com 3 milhões de cópias, entre LPs e CDs.

“As empresas resolveram apostar em um produto mais original, até porque em anos anteriores as bandas queriam provar que podiam criar álbuns igual aos gringos. Os Paralamas do Sucesso, por exemplo, criaram algo que retratava a brasilidade e desejaram que o estilo chegasse aos anos 1990”, pontua Ricardo Alexandre, voltando a mencionar o destaque para Selvagem?.

As rádios também absorveram o impacto das bandas da época. Trinta anos atrás, os roqueiros concorriam com o início do fenômeno da axé music, nascida na década e que mostrou ao país nomes como Luiz Caldas, Chiclete com Banana, Banda Beijo e Sarajane, precursores do movimento baiano que tomou conta do Brasil anos depois.

Os hits eram pedidos e tocados diariamente nas emissoras espalhadas por todo o Brasil. Entres os destaques, despontavam os hits 'Alvorada voraz' (RPM), Aa uu (Titãs), 'Declare guerra' (Barão Vermelho), Música urbana (Capital Inicial), 'Toda forma de poder' (Engenheiros do Hawaii), 'Só pro meu praze'r (Heróis da Resistência) e 'Envelheço na cidade' (Ira!).

>>> OS DISCOS DE 1986

Rádio Pirata Ao Vivo - RPM
Talvez o LP de maior sucesso na década. Bateu 2,5 milhões de cópias vendidas. Praticamente todas as faixas são sucessos: Revoluções por minuto, Olhar 43, A cruz e a espada, Rádio pirata, Alvorada voraz, Flores astrais (Secos & Molhados), London london (Caetano Veloso).

Selvagem? - Paralamas do Sucesso
Foi o terceiro álbum de estúdio de Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone. Chegou após show épico na primeira edição do Rock in Rio, em 1985, e inundou as rádios com hits como Alagados, Melô do marinheiro, Você (Tim Maia).

Cabeça Dinossauro - Titãs
Foi o terceiro álbum de estúdio, após a prisão de Arnaldo Antunes e Tony Bellotto por portar heroína, em 1985. Parcialmente censurado, emplacou Bichos escrotos, Polícia, Família, Homem primata, Aa uu.

Dois - Legião Urbana
Segundo trabalho de estúdio de Renato Russo e companhia, ocupa a 21ª posição dos 100 maiores discos da música brasileira, no ranking da Rolling Stone Brasil, com Daniel na cova dos leões, Eduardo e Mônica.

Vivendo e não aprendendo - Ira!
O mais famoso e bem-sucedido da banda, comandada pelo vocalista Nasi e guitarrista Edgard Scandurra, até o Acústico MTV (2004). Entres os sucessos, Envelheço na cidade, Flores em você, Quinze anos e Pobre paulista.

Longe demais das capitais - Engenheiros do Hawaii
Com Humberto Gessinger, lançaram o primeiro álbum pela RCA. No repertório, Toda forma de poder (tema de Hipertensão), Longe demais das capitais.

Capital Inicial - Capital Inicial
Primeiro da trupe de Dinho Ouro Preto, foi produzido por Bozo Barretti, que tocou teclados e se tornou integrante da banda. Incui músicas do Aborto Elétrico. Emplacou Música urbana, Veraneio vascaína, Leve desespero.

Todas Ao Vivo - Marina
Foi o 7º da cantora, que já havia caído nas graças do público com Fullgás, em 1982. Versão ao vivo do álbum Todas, de 1985, no qual regravou, entre outras, Difícil, Nada por mim, Eu te amo você, Ainda é cedo, Pra começar, Veneno.

Lulu - Lulu Santos
Quinto álbum do carioca, foi lançado pela RCA, após a saída do cantor da WEA. Os principais sucessos: Casa, Minha vida, Condição e Um pro outro. Ro-que-se-da-ne foi censurada.

Declare Guerra - Barão Vermelho
O Barão seguia carreira sem Cazuza nos vocais e com Frejat.
É o quarto de estúdio da banda. Emplacou Bumerangue blues, Declare guerra e Torre de Babel.

Heróis da Resistência - Heróis da Resistência
Foi o primeiro de estúdio da banda liderada por Leoni, baixista e vocalista, consagrado como compositor do gênero. Lançado pela Warner Music, apresentou Nosferatu, Se esconde aqui dentro, Esse outro mundo, Doublê de corpo e Só pro meu prazer.

Kid Abelha ao Vivo - Kid Abelha e os Abóboras Selvagens
Primeiro álbum ao vivo da Kid Abelha e Os Abóboras Selvagens, de Paula Toller, George Israel e Bruno Fortunato. Tinha os hits Fixação/Lágrimas e chuva, Nada por mim, Educação sentimental II, Pintura íntima/Nada tanto assim.

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