Paulo Gustavo deu vida à dona Hermínia

Lançado em 2019, o longa 'Minha mãe é uma peça' faturou R$ 143,8 milhões e atraiu 11,4 milhões de espectadores

Ângela Faria Frederico Gandra* 04/05/2021 22:29
Divulgação/filme Minha mãe é uma peça
(foto: Divulgação/filme Minha mãe é uma peça)
“Paulo Gustavo é um fenômeno a ser estudado”, afirmou Fernanda Montenegro, muito antes de “Minha mãe é uma peça 3”, protagonizado pelo ator e humorista como a impagável Dona Hermínia, se tornar a maior bilheteria do cinema brasileiro. Lançado em 2019, o longa faturou R$ 143,8 milhões e atraiu 11,4 milhões de espectadores. “É uma força cênica avassaladora. É um artista independente, popular, afirmativo, abusado, amado”, avalizou Fernanda, do alto de suas quase oitos décadas de carreira, em entrevista concedida em 2015.


Astro do teatro, do cinema e da TV, não foi à toa que Paulo Gustavo se tornou fenômeno do humor brasileiro, principalmente por causa de Dona Hermínia. A primeira versão da personagem surgiu em 2004, numa pequena esquete da peça “Surto”.
 
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Artista protagonizou filmes, peças e programas de humor e encantou o Brasil ao interpretar Dona Hermínia, em "Minha Mãe é uma Peça" (foto: Reprodução/redes sociais )
 

O artista se inspirou na mãe, Déa Lúcia, e nas mulheres fortes de sua família para criar a matriarca sem papas na língua, amorosa e superprotetora que conquistaria o Brasil poucos anos depois. “Elas são expansivas, elas são todas um tom acima, elas são histéricas, elas resolvem tudo, elas dominam tudo”, resumiu Paulo.

Certa vez, um professor da Casa de Artes de Laranjeiras (CAL), onde estudava, lhe disse que teria talento apenas para travesti, não para ator. Gay assumido, consciente de que não era galã e não tinha o corpo perfeito, Paulo avisou: “Já que sou afeminado, vou fazer uma mulher. Mas vou fazer uma mulher incrível”, revela Beatriz Fernandes Coelho Gomes, que analisou a trajetória do ator em seu trabalho de conclusão do curso de ciências sociais (TCC) na Universidade Federal Fluminense (UFF), em 2018. Posteriormente, ela se tornaria assessora do amigo, futuro astro.

Dito e feito: Paulo Gustavo comprou perucas e se reinventou. “Vou para o caricato, vou para a comédia, mas vou ser um comediante foda”, anunciou. “Ele faz acontecer o que muita gente duvida. Ele abarca seus projetos por inteiro. Paulo escreve, atua, dirige, produz, fecha os contratos, articula a divulgação dos projetos, distribui os próprios filmes”, revelou Beatriz.

Batalhador  

Em 2006, o ator escreveu o monólogo “Minha mãe é uma peça”. Sem trabalho e sem dinheiro, batalhou por uma oportunidade junto à direção do Teatro Cândido Mendes, no Rio de Janeiro, para encená-lo. Conseguiu. Prometeu pagar a cada profissional de sua equipe 2% da bilheteria, até completar o dobro do cachê solicitado. Comprou cenário e figurinos com cheques emprestados pela família.
Dona Hermínia bombou: filas, ingressos esgotados e indicação do ator ao Prêmio Shell 2006. Foram nada menos de 100 mil espectadores no primeiro ano em cartaz. E Paulo Gustavo, ainda com cabelo, deu sua primeira entrevista a Jô Soares.

Logo o Cândido Mendes ficaria pequeno para Dona Hermínia e seu criador. “Minha mãe é uma peça” migrou para o Teatro Leblon, com direito a sessões especiais no ex-Citibank Hall e no Vivo Rio, imensas casas de show cariocas. Paulo rodou o país com a comédia, que ultrapassou 3 milhões de espectadores.
A Dona Hermínia que bombava em programas de TV, como “220 volts” (Multishow), atraiu público para as temporadas de Paulo Gustavo no teatro. Uma dessas peças foi o stand up “Hiperativo”, que chegou aos palcos em 2011, dirigido por Fernando Caruso. Ali Paulo era Paulo mesmo, revelando suas neuras, alegrias e noitadas.

Vale registrar que o ator nunca foi “gigolô” de Dona Hermínia. Ele também divertiu o Brasil como o Valdomiro do programa “Vai que cola”, atração do canal Multishow. O trambiqueiro falido e esnobe da Zona Sul se refugiou no Méier, mais precisamente na divertida pensão da Dona Jô (Catarina Abdalla), onde convivia com a baixinha invocada Jéssica (Samanta Schmutz), o “atacado” Ferdinando (Marcus Majella), a escandalosa Terezinha (Cacau Protásio) e Wilson (Fernando Caruso). Nascido em Niterói, Paulo sabia brincar com carioca por meio de seus personagens suburbanos.

Em 2013, Dona Hermínia virou estrela de cinema. Protagonizou “Minha mãe é uma peça: O filme”, a produção mais assistida daquele ano no país, com 4,6 milhões de espectadores. Era só o começo da trilogia de sucesso.

“Minha mãe é uma peça 2” estreou em dezembro de 2016, agora com Dona Hermínia lidando com a “síndrome do ninho vazio”. Virou blockbuster nacional, com 9,3 milhões de espectadores e arrecadação de R$ 123,8 milhões.

RECORDE Em 2019, “Minha mãe é uma peça 3” bateu bilheterias brasileiras das megaproduções internacionais “Frozen 2” e “Star Wars – Ascensão Skywalker”. Desta vez, Dona Hermínia buscava se reinventar, enquanto os filhos formavam as próprias famílias. O filme termina com uma bela homenagem de Paulo à mãe, Déa Lúcia, a fonte de inspiração da “estrela”.

O terceiro longa foi o mais assistido da trilogia, somando 11,5 milhões de espectadores. Foi também a maior bilheteria do cinema nacional, com R$ 143 milhões. Esse posto, teoricamente, é de “Nada a perder”, cinebiografia do bispo Edir Macedo. Porém, o longa sobre o líder evangélico registrou “sessões esgotadas” com várias salas vazias, às moscas.

De acordo com reportagens de jornais e sites, os ingressos para as cadeiras sem público foram adquiridos por integrantes da Igreja Universal. Dona Hermínia, muito pelo contrário, atraiu filas e mais filas, aglomerando multidões nas portas das salas de exibição.

As gravações da nova série “Minha mãe é uma peça” (Multishow e Globoplay) começariam a partir de fevereiro deste ano, mas isso não chegou a ocorrer. Em 13 de março, Paulo foi internado devido a complicações causadas pela COVID-19. O ator não voltou ao estúdio, mas Dona Hermínia segue fiel à missão de divertir os brasileiros. Paulo Gustavo prometeu e cumpriu: realmente, está aí uma mulher incrível.

* Estagiário sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria