Em Cuba, youtubers distribuem conteúdos digitais de porta em porta

Governo do país controla acessos, mas diz estimular criação de 'pacotes'

por AFP 21/03/2018 08:36

YouTube/Reprodução
Frank Camallerys, de 19 anos, criou o canal Camallerys Vlogs. (foto: YouTube/Reprodução)

Sem internet em casa, Frank faz uma longa caminhada até a praça pública, onde há acesso a wi-fi por US$ 1 a hora. Ali, demora 40 minutos para fazer o upload de sua mais recente produção no YouTube: “Olá a todos, esta é uma nova aventura por Cuba”.

Frank Camallerys, estudante de comunicação, é um dos 50 jovens que tentam a sorte em Havana, capital cubana, como youtubers – estrelas e pessoas influentes nas redes sociais. Mas conquistar seguidores não é fácil.

Na ilha comunista, as casas não contam com acesso à internet. O monopólio estatal de telefonia trabalha para implementar o serviço em celulares ainda este ano.

“O fato de criar um vídeo, caminhar dois ou três quilômetros para subi-lo e esperar 40 minutos para que esteja na plataforma permite concluir que isso é o que gosto de fazer”, diz Frank, de 19 anos, criador do canal Camallerys Vlogs.

Na internet, ele conta como comer na rua por US$ 2 ou onde passear. No início, pedia 30 likes para fazer a segunda edição de algum tema. Hoje, tem mais de 7,5 mil inscritos. Mas não foi pelo YouTube que o conheceram em Cuba. Com a conexão limitada à internet, o material dessa rede, que em outros lugares é veiculado via smartphone ou wi-fi doméstico, chega aos cubanos a pé. Há uma década, o “pacote”, conjunto de conteúdos digitais que se distribui de mão em mão por meio de uma memória USB, é atualizado a cada semana.

O “pacote” é obtido por distribuidores na rede convencional. Depois, eles vão de casa em casa e, pelo equivalente a US$ 1, permitem ao cidadão baixar conteúdos como novelas, séries, o último jogo do Barcelona, a final da NBA, os programas The voice e vídeos de youtubers famosos.

É assim que youtubers cubanos chegam aos conterrâneos, conta Emma López, de 18 anos, criadora do canal Emma Style. “Na primeira vez, meu vídeo teve três visitas, até que começou a circular no ‘pacote’ e isso me lançou. Cheguei ao país inteiro dessa forma”, diz. Só depois os cubanos a procuraram no YouTube por meio do wi-fi nas praças.

A maquiadora Emma dá conselhos às meninas, adaptando-os à realidade de suas seguidoras. “Se vocês não têm um pincel (para sombra de olhos), usem seus dedos”, aconselha.

“Geralmente, quando um youtuber começa espera ter o apoio de seu povo. Mas uma percentagem mínima dos meus seguidores está em Cuba. Em Havana, os youtubers talvez cheguem a 50”, conta Pedro Veitía, de 24, criador do canal de variedades Pedrito el Paketero.

ACESSO De acordo com o governo cubano, 4,5 milhões de pessoas acessam a internet na ilha comunista. Estimativas informais apontam que o “pacote” pode chegar a 9 milhões de usuários, em um país com 11 milhões de habitantes, diz Max Barbosa, professor de comunicação da Universidade de Havana.

O governo cubano alega ter o direito de controlar os conteúdos que a população acessa. No entanto, não se opõe ao “pacote” e até buscou competir, com sua proposta “mochila”, similar com conteúdos culturais.

“Embora não tenham internet para ficar o tempo todo conectados ou gerar conteúdos, é um gesto louvável o fato de dizer ‘quero ser youtuber’, embora por vias alternativas como a memória USB”, acredita Barbosa. “O desafio é começar a gerar experiências que tenham mais a ver com a realidade cubana, que tenham diálogo direto com os seguidores do país.”

“Não gostamos que nos conheçam como youtubers cubanos por ter trabalho para subir vídeos ou por estarmos em uma ilha comunista. Gostamos que nos reconheçam pelo conteúdo que fazemos”, avisa Emma Style. 

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