Vanguardismo e erudição fazem de 'Grande sertão: veredas' obra definitiva da literatura brasileira

Romance do mineiro Guimarães Rosa alçou autor ao time dos grandes na arte universal

por Carlos Herculano Lopes 14/04/2013 06:30

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Aarlindo  daibert/reprodução
Publicada há 57 anos, obra ainda fascina especialistas por exercício estético e filosófico do autor (foto: Aarlindo daibert/reprodução)
Momento único na literatura brasileira, no qual exercício estético e filosófico se mistura a uma genial recriação da linguagem e erudição, 'Grande sertão: veredas', de João Guimarães Rosa, mineiro de Cordisburgo, foi publicado em 1956, ano dos mais profícuos para a literatura brasileira do século 20.
 
 
No romance, que colocou seu autor entre os grandes da literatura universal – e foi escolhido como o melhor romance brasileiro de todos os tempos –, um jagunço aposentado, Riobaldo Tatarana, narra a um ouvinte oculto, que o visita em sua fazenda, suas peripécias como ex-chefe de um bando de guerreiros que fez e aconteceu nos sertões de Minas Gerais, numa época não especificada, mas provavelmente nas primeiras décadas do século passado. Também se mostra, no correr da narrativa – e este é um dos seus maiores dramas –, obcecado pela existência ou não do diabo, por ele nomeado de várias maneiras. 
 
Como pano de fundo, mola mestra que sustenta a história, o amor proibido, e nunca realizado, do narrador por outro jagunço, Reinaldo, por ele chamado de Diadorim. Personagem-chave dessa história trágica e épica, cujo desfecho, que encerra um grande segredo, só será conhecido nas últimas páginas, os dois ficaram se conhecendo por acaso, quando ainda eram crianças, e atravessaram o São Francisco numa pequena canoa, pilotada por outro menino. 
 
“Carece de ter coragem, carece de ter muita coragem”, diz Diadorim a Riobaldo, amedrontado pela imensidão das águas que se ampliam aos seus olhos, quando iniciam a travessia. Desde então, até a derradeira batalha travada contra um grupo rival, num local denominado Paredão de Minas, que marcou também o final das aventuras de Riobaldo como jagunço, os dois tiveram os seus destinos ligados. 
 
Na visão de Benedito Nunes, crítico literário paraense, 'Grande sertão: veredas' ultrapassa o âmbito regional. “No drama do sertanejo ou do jagunço, irrompem os grandes problemas humanos – seja a luta do homem contra a natureza que o estimula e o abate ao mesmo tempo, seja o ímpeto do jagunço que se põe em armas para defender uma causa indefinível, adota a lei da guerra menos pela rudeza de seu espírito do que pela necessidade de viver e de realizar seu destino”, escreveu. 
 
Em 'Grande sertão: veredas' se mesclam várias dimensões da arte e do conhecimento. É romance de aventuras e história feita de pura linguagem; expressão do mito em sua forma mais primitiva e reflexão filosófica profunda e erudita; narrativa de amor e painel histórico e sociológico que revela o Brasil profundo. 
 
Para Walnice Nogueira Galvão, uma das mais importantes estudiosas da obra do escritor, Guimarães Rosa, com seu romance, conjuga as vertentes mais marcantes da literatura do período, o regionalismo e o espiritualismo, para criar uma síntese ainda insuperada em nossa história literária: “Um regionalismo com introspecção, um espiritualismo em roupagem sertaneja”.
 
Traduzido para diversas línguas, motivo de centenas de estudos acadêmicos, transformado em peças de teatro, filmes e minissérie de TV, 'Grande sertão: veredas', ainda que alguns insistam em afirmar o contrário, é também, sem dúvida, o grande livro já escrito na América Latina. Só por essas inexplicáveis razões, tão comuns no mundo das artes, Guimarães Rosa não foi ganhador do Prêmio Nobel de Literatura. 

Dos 70 livros citados entre os melhores de todos os tempos:
 
• O século 20 domina, com 59 títulos

• Um foi publicado no século 17: 'Crônica do viver baiano seiscentista', de Gregório de Matos

• Seis foram publicados no século 19: 'Primeiros cantos', de Gonçalves Dias; 'O guesa errante', de Sousândrade; 'O ateneu', de Raul Pompéia; 'Espumas flutuantes', de Castro Alves; 'Dom Casmurro' e 'Memórias póstumas de Brás Cubas', de Machado de Assis 

• Quatro foram publicados no século 21: 'O albatroz azul', de João Ubaldo Ribeiro; 'Catrâmbrias', de Evandro Affonso Ferreira; 'Eles eram muitos cavalos', de Luiz Ruffato; e 'Pelo fundo da agulha', de Antonio Torres (trilogia encerrada em 2006) 


Escritores que tiveram mais de um livro entre os melhores da literatura brasileira

• Carlos Drummond de Andrade
5 ('Rosa do povo', 'Claro enigma', 'Lição das coisas', 'Sentimento do mundo' e 'Alguma poesia')

• Clarice Lispector
5 ('A paixão segundo GH', 'A hora da estrela', 'Perto do coração selvagem', 'A maçã no escuro' e 'Laços de família')

• Machado de Assis
4 ('Memórias póstumas de Brás Cubas', 'Dom Casmurro', 'Esaú e Jacó' e 'Memorial de Aires')

• Graciliano Ramos
4 ('Vidas secas', 'São Bernardo', 'Memórias do Cárcere' e 'Angústia')

• Guimarães Rosa 
3 ('Grande sertão: veredas', 'Sagarana' e 'Corpo de baile')

• João Cabral de Melo Neto
3 ('Educação pela pedra', 'O cão sem plumas'e 'Morte e vida severina')

• Erico Verissimo
2 ('O tempo e o vento' e 'Incidente em Antares')

• Hilda Hilst
2 ('Rútilo nada' e 'Tu não te moves de ti')

• João Ubaldo Ribeiro
2 ('Viva o povo brasileiro' e 'O albatroz azul')

• Jorge Amado
2 ('Velhos marinheiros' e 'Gabriela, cravo e canela')

• Jorge de Lima
2 ('A invenção de Orfeu' e 'Poemas negros')

• Manuel Bandeira
2 ('Estrela da vida inteira' e 'Estrela da manhã')

OS LIVROS ELEITOS

1) 'Grande sertão: veredas', de Guimarães Rosa, Minas Gerais
2) 'Memórias póstumas de Brás Cubas', de Machado de Assis, Rio de Janeiro
3) 'Dom Casmurro', de Machado de Assis, Rio de Janeiro
4) 'Vidas secas', de Graciliano Ramos, Alagoas
5) 'São Bernardo', de Graciliano Ramos, Alagoas
6) 'A Paixão segundo GH', de Clarice Lispector, nascida na Ucrânia e naturalizada brasileira, viveu em Pernambuco e no Rio de Janeiro
7) 'A rosa do povo', de Carlos Drummond de Andrade, Minas Gerais
8) 'Macunaíma', de Mário de Andrade, São Paulo
9) 'Educação pela pedra', de João Cabral de Melo Neto, Pernambuco
10) 'Claro enigma', de Carlos Drummond de Andrade, Minas Gerais
11) 'Os sertões', de Euclides da Cunha, Rio de Janeiro
12) 'A hora da estrela', de Clarice Lispector
13) 'Alguma poesia', de Carlos Drummond de Andrade, Minas Gerais
14) 'O tempo e o vento', de Erico Verissimo, Rio Grande do Sul
15) 'A invenção de Orfeu', de Jorge de Lima, Alagoas
16) 'Angústia', de Graciliano Ramos, Alagoas
17) 'Laços de família', de Clarice Lispector
18) 'Morte e vida severina', de João Cabral de Melo Neto, Pernambuco
19) 'Menina morta', de Cornélio Pena, Rio de Janeiro  
20) 'Romanceiro da Inconfidência', de Cecília Meireles, Rio de Janeiro
21) 'Crônica da casa assassinada', de Lúcio Cardoso, Minas Gerais
22) 'Avalovara', de Osman Lins, Pernambuco
23) 'Crônica do viver baiano seiscentista', de Gregório de Matos, Bahia
24) 'Memorial de Aires', de Machado de Assis, Rio de Janeiro
25) 'Rútilo nada', de Hilda Hilst, São Paulo
26) 'A invenção do mar', de Gerardo Mello Mourão, Rio de Janeiro
27) 'As meninas', de Lygia Fagundes Telles, São Paulo
28) 'Esaú e Jacó', de Machado de Assis, Rio de Janeiro
29) 'Espumas flutuantes', de Castro Alves, Bahia
30) 'Memórias do cárcere', de Graciliano Ramos, Alagoas
31) 'O ateneu', de Raul Pompéia, Rio de Janeiro  
32) 'Os velhos marinheiros e a morte e a morte de Quincas Berro d’agua', de Jorge Amado, Bahia
33) 'Poema sujo', de Ferreira Gullar, Maranhão
34) 'Contos do imigrante', de Samuel Rawet (nascido na Polônia, viveu no Rio de Janeiro e Brasília)
35) 'Corpo de baile', de Guimarães Rosa, Minas Gerais
36) 'Estrela da vida inteira', de Manuel Bandeira, Pernambuco
37) 'Incidente em Antares', de Erico Verissimo, Rio Grande do Sul
38) 'Lição das coisas', de Carlos Drummond de Andrade, Minas Gerais
39) 'Menino de engenho', de José Lins do Rego, Paraíba
40) 'Obra reunida', de Campos de Carvalho, Minas Gerais
41) 'O guesa errante', de Sousândrade, Maranhão
42) 'O mez da grippe', de Valêncio Xavier, São Paulo
43) 'O quinze', de Rachel de Queirós, Ceará
44) 'Perto do coração selvagem', de Clarice Lispector
45) 'Poemas negros', de Jorge de Lima, Alagoas
46) 'Primeiros cantos', de Gonçalves Dias, Maranhão
47) 'Sentimento do mundo', de Carlos Drummond de Andrade, Minas Gerais
48) 'Sinos da agonia', de Autran Dourado, Minas Gerais
49) 'Viva o povo brasileiro', de João Ubaldo Ribeiro, Bahia
50) 'Catrâmbias', de Evandro Afonso Ferreira, Minas Gerais
51) 'Crônicas reunidas', de Rubem Braga, Espírito Santo
52) 'Eles eram muitos cavalos', de Luiz Ruffato, Minas Gerais
53) 'Eu', de Augusto dos Anjos, Paraíba
54) 'Gabriela, cravo e canela', de Jorge Amado, Bahia
55) 'Galáxias', de Haroldo de Campos, São Paulo
56) 'Maçã no escuro', de Clarice Lispector  
57) 'O pirotécnico Zacarias', de Murilo Rubião, Minas Gerais
58) 'Pelo fundo da agulha', de Antônio Torres, Bahia
59) 'Relato de um certo oriente', de Milton Hatoum, Amazonas
60) 'Romance da Pedra do Reino', de Ariano Suassuna, Paraíba
61) 'Sagarana', de Guimarães Rosa, Minas Gerais
62) 'Estrela da manhã', de Manuel Bandeira, Pernambuco
63) 'Lavoura arcaica', de Raduan Nassar, São Paulo
64) 'Memórias sentimentais de João Miramar', de Oswald de Andrade, São Paulo
65) 'O albatroz azul', de João Ubaldo Ribeiro, Bahia
66) 'O cão sem plumas', de João Cabral de Melo Neto, Pernambuco
67) 'O encontro marcado', de Fernando Sabino, Minas Gerais
68) 'Sítio do Pica-pau Amarelo', de Monteiro Lobato, São Paulo
69) 'Toda poesia', de Paulo Leminski, Paraná
70) 'Tu, não te moves de ti', de Hilda Hilst, São Paulo

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