Produtora diz que foi demitida do 'Amor & Sexo' por ser transexual

Barbara Aires chamou de "falsidade e hipocrisia" o episódio do programa que tratou de diversidade sexual

por Eduarda Fernandes Diário de Pernambuco 03/03/2017 15:38

Facebook/Reprodução e Globo/Reprodução
(foto: Facebook/Reprodução e Globo/Reprodução)
"Uma luta em que nem as purpurinas e as lantejoulas escondem as mortes e os hematomas que a violência do preconceito e a discriminação deixaram e ainda deixam nessa comunidade. Uma luta de todos que acreditam na igualdade de direitos civis, na liberdade, na diversidade, na paz e no amor", foi como Fernanda Lima, apresentadora do Amor & sexo, abriu o programa exibido na noite da última quinta-feira (2), sobre pluralidade sexual e questões de gênero. Mas, para a jornalista Barbara Aires, e episódio foi marcado por "falsidade e hipocrisia". Barbara é transexual e foi produtora da atração global por dois anos e, em um depoimento postado no Facebook, ela relatou como foi sua experiência no emprego.

Ela contou que, durante o período que passou no programa, seu trabalho foi bastante elogiado pelos colegas e pelo departamento de Recursos Humanos da emissora - que havia deixado claro que o contrato seria renovado, com uma mudança de cargo. "Quando fui contratada, a redação final era de outro funcionário, meu chefe direto. Uma pessoa maravilhosa, sem igual. Até meu crachá com nome social ele agilizou, algo inédito nas organizações Globo. O que inclusive me deu uma certa projeção e notoriedade na época. As meninas da produção, maravilhosas. Me ensinaram todo o ofício, e sempre me elogiando nas minhas atribuições." No entanto, quando a chefia do programa passou para as mãos de Fernanda Lima, de acordo com Barbara, ela foi demitida.

"Nessa época a Fernanda Lima era apenas apresentadora. Chegava, lia o texto e apresentava. Nunca me tratou mal, sempre educada. Mas sem intimidades, normal, distante. Com o passar do tempo, ela começou a opinar no texto, mudar uma coisa aqui e ali, até que de repente o texto estava todo modificado. Ela acabou se tornando Redatora Final juntamente com seu empresário/assessor. [...]  olha que "coincidência"; Depois de 2 anos, dois anos de trabalhos prestados, elogiados e sempre renovados, foi só mudar a chefia, Fernanda e seu empresário assumirem, que eu não fui chamada, renovada... E fiquei três anos desempregada", escreveu Barbara, que atualmente é Consultora de Gênero e Diversidade Sexual em um quadro do Fantástico, também da Globo.

Barbara disse ainda que só sentiu necessidade de expor a situação agora porque "a exibição do programa foi propícia. Muita falsidade e hipocrisia, não aguento. Muito fácil se dizer sem preconceito, fazer discursos lindos, falar de empregabilidade, e usar uma trans apenas como estilista. Mas quando pode manter uma trans na produção, não, imagina. Ou pra ter ibope, como foi hoje". O texto de Barbara, postado logo após o fim do episódio, conta com mais de 400 compartilhamentos e 300 comentários - muitos a acusando de "mimimi" e de "apontar transfobia onde não existe". Na manhã desta sexta-feira (3), Barbara postou um novo texto. "Esse episódio todo serviu pra me mostrar que precisamos mesmo lutar pra mudar a educação no nosso país. As pessoas não sabem nem ler. Não entendem o que leem. Precisamos aprender a interpretar os textos", escreveu.

Ela voltou a afirmar que não foi ingrata em momento nenhum e que já superou a demissão. "Sim, demissão faz parte. Já tive outras e nunca reclamei, pois foram pontuadas, dialogadas. O que eu apontei, é que essa demissão, ou não renovação, não pode ser por gênero ou orientação. O que pareceu ser nesse caso, já que não me informaram nada e fugiram quando questionei", concluiu.

Em entrevista para o Diário de Pernambuco, Barbara fez questão de frisar que o depoimento não foi postado como maneira de reclamar a demissão. "O que me incomodou foi ouvir da boca da Fernanda Lima (no programa) que uma maneira de acabar com o preconceito é aumentar a empregabilidade de pessoas trans e quando ela teve a oportunidade de manter uma trans na equipe, ela escolheu demitir", contou. "É óbvio que não vão alegar transfobia, vão dizer que foi outra coisa. Mas fica difícil de engolir". Procurada pela reportagem, a assessoria da Rede Globo afirmou que está apurando o caso e deve se pronunciar em breve.

 

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