Terapia anti H. pylori reduz risco de câncer gástrico

Estudo realizado com população hispânica colombiana demonstrou que efeito protetor se mantém por até 20 anos, confirmando importância de medidas profiláticas

Rachel C/Pixabay
(foto: Rachel C/Pixabay)

Não é novidade que a infecção causada por Helicobacter pylori (H. pylori) é um importante fator de risco para o surgimento do câncer gástrico. Anteriormente, inclusive, apresentei aqui em minha coluna do Saúde Plena os resultados de uma pesquisa demonstrando que até 13% dos casos de câncer no mundo têm como causa a contaminação por agentes infecciosos, a exemplo dessa bactéria.

Agora, um novo estudo realizado com população hispânica colombiana vem lançar luz sobre como o tratamento e a erradicação do Helicobacter pylori (H. pylori) podem contribuir para que lesões pré-cancerosas não progridam para o desenvolvimento de tumores de estômago.

A pesquisa, publicada no Journal Gastroenterology, do American Gastroenterological Association (AGA), identificou que os participantes tratados tiveram uma redução significativa de 41% do risco de progressão, em comparação com aqueles que receberam placebo no início do estudo. O efeito protetor da terapia durou 20 anos.

O ensaio de quimioprevenção contou com voluntários adultos de duas cidades colombianas, de áreas de alto risco para câncer gástrico. Exames de endoscopia gastrointestinal alta, com mapeamento de biópsia, foram realizados para determinar a elegibilidade dos participantes. Aqueles em que foram identificadas lesões pré-cancerosas (gastrite atrófica multifocal, metaplasia intestinal, displasia) foram convidados a participar de um estudo duplo-cego de terapia anti-H. pylori e suplementação antioxidante, para prevenir a progressão das lesões.

Os participantes foram sorteados (randomizados) para receber duas semanas de terapia anti-H. pylori, com ou sem suplementação de betacaroteno e/ou ácido ascórbico, por seis anos ou aos placebos correspondentes. No final do ensaio de seis anos, a terapia anti-H. pylori foi oferecida a indivíduos não tratados anteriormente.

Com isso, os pesquisadores descobriram que a eliminação do H. pylori levou à regressão da gastrite atrófica multifocal e reduziu a progressão da metaplasia intestinal (segundo estágio para desenvolvimento do câncer gástrico). Outras pesquisas nesse sentido foram realizadas anteriormente, tal como o estudo da Coreia do Sul, que mostrou que a terapia com H. pylori foi associada a taxas reduzidas de câncer gástrico metacrônico em pacientes de alto risco, após a ressecção endoscópica de displasia gástrica.

Já a pesquisa divulgada pelo Grupo de Estudos em Infecção e Epidemiologia do Câncer, na revista Lancet Glob Health, demonstrou que a H. pylori foi responsável por 810 mil novos casos de câncer em 2018, sobretudo o adenocarcinoma gástrico.

A erradicação em massa da infecção por H. pylori em populações de alto risco é uma medida que deve ser implementada com foco na redução desse tipo de câncer. Além disso, a realização de exames endoscópicos de alta qualidade e demais exames pertinentes são importantes para o correto rastreamento, diagnóstico precoce da doença e definição de protocolos.

Também é válido nos atentarmos para as síndromes hereditárias associadas ao maior risco de desenvolvimento de tumores de estômago. Hoje, estima-se que até 15% dos casos de câncer de estômago ocorram por mutações hereditárias em genes importantes para a proteção das células do estômago.

Suspeita-se dessa condição em casos de aparecimento do câncer em idade abaixo dos 50 anos de idade e também com a ocorrência de casos nos parentes próximos. Existindo essa suspeita, um oncogeneticista deve ser consultado para orientação dos exames genéticos, acompanhamento, aconselhamento familiar, exames de rastreamento e indicação de cirurgias redutoras de riscos.

*André Murad é oncologista, pós-doutor em genética, professor da UFMG e pesquisador. É diretor-executivo na clínica integrada Personal Oncologia de Precisão e Personalizada e diretor Científico no Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão: GBOP. Exerce a especialidade há 30 anos, e é um estudioso do câncer, de suas causas (carcinogênese), dos fatores genéticos ligados à sua incidência e das medidas para preveni-lo e diagnosticá-lo precocemente.


Quer falar com o colunista? Envie um e-mail para andremurad@personaloncologia.com.br