Brasil é o segundo país que mais realiza a cirurgia bariátrica; operação é indicada para obesidade e outros sintomas

De 1990 para cá, a medicina avançou intensamente, com o desenvolvimento de medicamentos e novas técnicas de operação, o que originou um boom na procura pela redução do estômago

por Joana Gontijo 21/04/2019 10:37
Reprodução/Internet/Baricare
(foto: Reprodução/Internet/Baricare)

O problema da obesidade já encontra dados alarmantes no Brasil. De cada 100 habitantes, 50 estão acima do peso e, entre esses, 16 enfrentam a balança e não conseguem retomar a forma, nem melhorar hábitos alimentares. O levantamento é da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). De acordo com a entidade, a população obesa aumenta em ritmo acelerado por aqui - nos últimos 10 anos, a taxa nacional de obesidade cresceu mais que o índice americano, o mais grave mundialmente, e, se a situação persistir, a perspectiva é de que daqui a outros 10 anos os brasileiros serão tão obesos quanto os americanos. Quando considerados os casos piores, que demandam intervenção séria, o Brasil já é o segundo país que mais realiza a cirurgia bariátrica, e pode vir a ser o primeiro.

O coordenador do Serviço de Cirurgia Bariátrica do Hospital da Baleia, Marcos Reis, ensina que a obesidade é uma doença com diferentes causas. “Vários fatores levam ao desenvolvimento da obesidade, como alimentação inadequada, sedentarismo, além de fatores emocionais, genéticos, medicamentos e outras enfermidades relacionadas”, afirma. O cirurgião chama a atenção ainda para o fato de o excesso de peso, com o passar do tempo, levar a outros males. “Os mais comuns são hipertensão arterial, diabetes, alterações de colesterol e triglicérides, apneia do sono, complicações cardiovasculares, doenças pneumológicas, refluxo, incontinência urinária, impotência sexual e outros distúrbios”, reforça. O médico também alerta sobre o elo da obesidade com o surgimento de câncer. “Hoje, já se sabe que a obesidade está ligada ao aumento da incidência de câncer de colo, esôfago, endométrio, rim e mama”, ressalta. Segundo Marcos, menos de 10% das cirurgias bariátricas feitas no Brasil passam pelo SUS.

O tratamento cirúrgico tem sido o caminho escolhido por muitos brasileiros, desde os anos 1990. De lá pra cá, a medicina avançou intensamente, com novas técnicas de operação e desenvolvimento de medicamentos, o que originou um boom na procura pela cirurgia bariátrica. Conforme estatísticas da SBCBM, somente em cinco anos a busca pelo procedimento cresceu 47%, aumento superior ao de cirurgias mais simples, como extração de vesícula (que subiu 38%) e tireoide (6%).

Anteriormente, a cirurgia de redução do estômago era prescrita apenas para adultos com obesidade mórbida, mas agora é indicada também para adolescentes e para pessoas com diabetes descontrolado. De acordo com Marcos Reis, a resposta ao enfrentamento à obesidade somente com dieta acaba em resultados insatisfatórios. Por isso, a operação é recomendada para melhor resolutividade, em algumas situações graves. “A cirurgia é indicada para quem tem Índice de Massa Corporal (IMC) maior ou igual a 35, associado a pelo menos uma das 21 comorbidades, que vão desde apneia do sono até hérnia de disco; quem tem IMC maior ou igual a 30, associado à síndrome metabólica; quem tem mais de cinco anos de obesidade; quem tem doenças associadas e quem tem dois anos de tratamento clínico sem sucesso. Essas são as indicações do Conselho Federal de Medicina. O primeiro passo é avaliar se o paciente se enquadra nesses critérios para indicação do tratamento cirúrgico”, explica.

CONSEQUÊNCIAS

Jair Amaral/EM/D.A Press
"Imediatamente após a cirurgia, meus índices de pressão e glicose melhoraram. Saí do hospital com tudo normalizado" - Cristiano Machado, professor universitário aposentado (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press )
Para o professor universitário aposentado Cristiano Machado, de 68 anos, a convivência com o sobrepeso vem de cedo. Ele conta que, a partir dos 7 anos e na pré-adolescência já começou a ficar “gordinho”, em suas palavras. “Minha saúde era boa, a alimentação normal, nunca fui de comer demais. Acho que é questão de genética mesmo”, diz. Com 18 anos, surgiu o problema da hipertensão, que Cristiano controlou por toda a vida com medicamentos. Ao passar do tempo, já aos 60, apareceu o diabetes tipo 2 e, ainda com remédios de controle em dose máxima, os valores glicêmicos se mantinham altos, em torno dos 200mg/dl, e ele era um sério candidato a precisar de aplicações de insulina. Nesse ponto, a opção pela cirurgia bariátrica se mostrou a alternativa ideal para evitar transtornos mais sérios. O palpite inicial partiu de uma sobrinha, que trabalha em uma empresa ligada ao setor de saúde. Com a primeira dica, Cristiano recorreu ao seu cardiologista, que reforçou as vantagens da intervenção no estômago. A procura pelo cirurgião foi o passo seguinte.

A operação ocorreu em setembro de 2015. “O procedimento costumava ser com bisturi, abrindo a barriga, mas atualmente, com a videolaparoscopia, é muito tranquilo. Não senti dor nem mal-estar. O intestino funcionava bem, a alimentação habitual. Uma parte do meu estômago foi retirada e ele está do tamanho de uma banana prata”, compara. Antes, Cristiano pesava quase 140 quilos e, em um ano, baixou perto de 50. Agora, está na casa dos 98 quilos e se demonstra extremamente satisfeito. “Imediatamente após a cirurgia, meus índices de pressão e glicose melhoraram. Saí do hospital com tudo normalizado”, conta. E os ganhos não param por aí. “O preparo físico, a autoestima, o sono, a respiração, o sexo. Tudo melhorou. Não ronco mais à noite. A cirurgia teve efeitos fantásticos, dou a maior força para quem pensa em fazê-la. Recuperei a vida.” Hoje, Cristiano mantém uma dieta alimentar equilibrada e pratica caminhada de 30 minutos todos os dias. “Só lamento não ter feito antes.”

Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Palavra de especialista - Mauro Jácome, cirurgião geral e gastroenterologista

Nova cirurgia para obesidade

“Para aqueles pacientes que não se enquadram nos critérios para a cirurgia bariátrica de índice de massa corporal, ou seja, com IMC entre 30 e 35, uma opção passa a ser a gastroplastia endoscópica. A técnica, conhecida como ‘nova bariátrica por endoscopia’, é menos invasiva, apresenta durabilidade de dois anos e possibilita o tratamento e o controle da obesidade leve, até mesmo em adolescentes e idosos, com ótimos resultados para quem precisa perder peso, cerca de 20% a 25% do peso total, quando associada a uma mudança nos hábitos alimentares e à prática de atividades físicas. Da mesma forma que ocorre numa endoscopia comum, a gastroplastia endoscópica implica introdução de um tubo, porém em bloco cirúrgico e com anestesia geral. Por meio de vídeo, são realizadas suturas em pontos estratégicos do estômago, diminuindo seu volume. Vale lembrar que todo o procedimento serve como ponto de partida para transformação na rotina, mente e corpo. Converse com um médico especialista. Cada caso é um caso. Veja o que realmente é o melhor para você.”

Uma questão de saúde
Além da obesidade, a cirurgia é indicada para quem tem sintomas associados, que vão de apneia do sono e diabetes tipo 2 até hérnia de disco, entre outras comorbidades


Marcos Vieira/EM/D.A Press
"Pretendo voltar para o muay thai (que abandonei por causa de desgaste no joelho, pelo sobrepeso) e para a dança; quero fazer cirurgia plástica, colocar silicone e comprar roupa tamanho M. Aí entra a parte da vaidade mesmo. Desejo ter o corpo que sempre sonhei e nunca tive%u201D, NIceia Cruz, de 33 anos, contadora (foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press )

A contadora Niceia Cruz, de 33 anos, relata que nunca foi magra. Mesmo estando sempre às voltas com dietas, reeducação alimentar e nutricionista, o sobrepeso não a abandona. Caçula de oito irmãos, todos com problema com a balança, ela diz que as causas para a obesidade são uma somatória de fatores, de hábitos inadequados a predisposição genética. Ainda assim, Niceia não sofre com autoestima baixa, encara a questão com sabedoria e tranquilidade, mas, no atual momento de sua vida, com 120 quilos, diz que a opção pela intervenção cirúrgica não segue um norte estético, muitos antes, é uma precisão de saúde.

Para ela, essa é a hora certa para melhorar. “Acredito muito nos sinais que recebemos. Comecei a ter pressão alta, apneia do sono grave, fígado gorduroso. Sabia que a cirurgia bariátrica existe, mas não procurava entender, não me esforçava para fazer, não me programava, não colocava como prioridade. Tentava persistir com academia, sem resultado. Sobre a operação, é uma ideia que venho amadurecendo há cinco anos. Conheço pessoas que fizeram, percebi que não fica com cara de doente, que não fica feio. Quebrei o tabu”, pontua.

A partir da orientação de uma endocrinologista, que acompanha Niceia há anos, e com o conhecimento mais aprofundado sobre o assunto, ela teve o impulso que precisava para decidir pela redução do estômago. O procedimento está agendado para maio, e a contadora diz que sua expectativa é positiva. Mostra-se segura em relação à cirurgia, até porque, desde novembro de 2018, vive instantes de preparação, com a realização dos exames necessários e assistência psicológica - vai até tirar férias à época para garantir uma boa recuperação.

“Agora está tudo pronto. Estou com uma ansiedade gostosa, fazendo mil planos, imaginando como será depois. Pretendo voltar para o muay thai (que abandonei por causa de desgaste no joelho, pelo sobrepeso) e para a dança; quero fazer cirurgia plástica, colocar silicone e comprar roupa tamanho M. Aí entra a parte da vaidade mesmo. Desejo ter o corpo que sempre sonhei e nunca tive”, conta ela, que objetiva chegar aos 80 quilos.

Por mais que fosse bem resolvida com a obesidade, Niceia sabe que é uma questão que afeta a rotina, as atividades diárias. “Se me descuidar, tenho muita facilidade para engordar. Com a cirurgia, tenho certeza de que minha qualidade de vida vai melhorar. Digo para meus amigos: ‘Se gordinha sou chata, imaginem magra. Ninguém vai aguentar’!. Meu maior problema é que adoro a danada da cerveja”, brinca.

ENCONTROS

Em Belo Horizonte, o Hospital da Baleia promove de seis a 10 cirurgias bariátricas a cada semana, via convênio ou atendimento particular. Com o corpo clínico empenhado em dar suporte a pacientes que necessitam de tratamento, de maneira mais segura e confortável, a unidade de saúde inaugurou, em março, o Centro de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, e oferece encontros mensais gratuitos de esclarecimento à população. O intuito é que o paciente se sinta amparado e o tratamento seja bem-sucedido, do início ao fim. Entre as temáticas abordadas, além de informações sobre a cirurgia propriamente dita, estão orientações acerca da dieta, cuidados com o corpo, instruções médicas nos pré e pós-operatório, entre outros assuntos. A próxima reunião, aberta ao público, será terça-feira, e os interessados podem se informar melhor pelo telefone (31) 3489-1651.

As instalações do centro contam com três quartos, disponibilizados para pacientes operados na instituição, que une bloco cirúrgico bem equipado e profissionais capacitados e experientes. A equipe é coordenada por Marcos Reis. Outros diferenciais de atendimento no hospital são acompanhamento durante todo o processo com uma equipe multidisciplinar (nutricionista, psicólogo, fisioterapeuta, endocrinologista, pneumologista, anestesiologista e cardiologista, além do cirurgião bariátrico) e disponibilidade de um concierge, responsável por tirar dúvidas, marcar exames, agilizar atendimentos e agendar retornos para quem está em tratamento.

Com técnica moderna, pouco invasiva, confortável, menos arriscada e com respostas otimizadas, hoje a cirurgia de redução do estômago é feita por videolaparoscopia. No Hospital da Baleia, o compromisso é por uma alta rápida e segura. “Nossa média de permanência hospitalar (da internação até a alta) é de cerca de 26 horas”, informa Marcos Reis, reforçando que alimentação e prática de atividades físicas devem ser apropriadas ao pré e pós-operatório. A necessidade de o paciente realizar o pós-operatório em um CTI é muito rara, pontua o especialista. “A incidência de pacientes enviados ao CTI é muito pequena. Na maioria dos casos, um bom preparo pré-operatório evita complicações. A mortalidade é em torno de 0,1% (1 paciente para mil)”.

Serviço
Encontro multidisciplinar sobre o tratamento cirúrgico da obesidade
Tema: Qual a melhor opção cirúrgica? Técnicas atuais e resultados esperados
Data: dia 23, das 19h às 21h
Endereço: Rua Espírito Santo, 505, Centro
Entrada franca
Retirada de ingressos pelo: https://www.sympla.com.br
Mais informações: (31) 3489-1651