Uso incorreto do celular pode provocar danos no pescoço e na coluna

Utilizar o aparelho com o pescoço inclinado para baixo sobrecarrega o corpo e provoca estresse na região cervical, além de causar danos à visão. Crianças e jovens são os mais afetados por conta também de longas horas na internet

por Alan Rios 27/03/2018 12:00

Reprodução/Internet/colegiocastroalves.g12.br
(foto: Reprodução/Internet/colegiocastroalves.g12.br)

Responder às mensagens no WhatsApp, abrir notificações no Facebook, conferir os e-mails recebidos, ver as fotos que chegam… Apesar de tão rotineiros, esses passos - e outros mais - repetidos várias vezes ao dia, quando se pega o celular, têm provocado problemas para a saúde do nosso corpo, como a síndrome do text neck.

Causado pela postura inclinada da cabeça durante o uso de aparelhos telefônicos, o novo termo citado nos consultórios ortopédicos faz uma associação entre as palavras texto e pescoço, alertando sobre os malefícios aos ossos dessa área, decorrentes, principalmente, do hábito de digitar em celular.

O fisioterapeuta Guilherme Couto, especialista em coluna, pescoço e extremidades, explica como surgem as dores do text neck. “Quando mantemos essa postura errada durante um tempo prolongado, acabamos gerando um estresse mecânico que leva a lesões teciduais locais e podem provocar dores na região cervical, nos membros superiores - braços e mãos - ou cabeça, trazendo enxaqueca”, detalha.

O problema pode atingir todos, já que são raras as pessoas que elevam o celular à altura dos olhos para não prejudicar o pescoço. Porém, entre crianças e adolescentes a síndrome é ainda mais impactante, pois nessas fases da vida a coluna ainda está em desenvolvimento e cartilagens ocupam o lugar dos ossos.

Para fugir do text neck, a solução é simples, ensina Guilherme. “O que pode ser feito para evitar esses sintomas é buscar se manter em movimento, deixar sua articulação livre, praticar atividade física e sempre buscar uma postura mais ereta quando fizer uso do celular ou tablet.”

* Estagiário sob a supervisão da subeditora Valéria de Velasco

Média preocupante

Segundo pesquisa da GlobalWebIndex, o Brasil é o terceiro país do mundo que mais dedica horas do seu dia ao celular: são 3h14min por dia conectados. Entre os jovens, o número cresce para 4h diárias, chegando a 1.460 horas por ano com o celular nas mãos em posturas muitas vezes incorreta.

Três perguntas para...
Edson Pudles, presidente do Comitê de Coluna da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia

1) Para aqueles que têm os aparelhos telefônicos como instrumento de trabalho, como diminuir os efeitos do text neck sem abrir mão de tempo no dia para o uso do celular?

Nestes casos, a recomendação é que a pessoa trabalhe com o celular em uma posição mais alta para evitar que o pescoço fique em flexão. Devemos lembrar que a cabeça tem um peso, e quanto maior a flexão do pescoço, maior será a tensão da musculatura na região posterior do pescoço. Outra recomendação importante é que a pessoa faça intervalos e durante esse período pratique alguns alongamentos. Muitos aparelhos têm o recurso de transformar o ditado em texto, o que pode ser um grande auxiliar e evita a flexão prolongada do pescoço.

2) Qual a postura corporal mais adequada para evitar dores durante o uso do celular, leituras e posicionamento em frente ao computador?

A postura mais adequada sempre será a mais ergonômica. No caso de uso do computador, o monitor deve ficar em uma linha de horizontal com os olhos, e não esquecer de ficar com os antebraços apoiados e joelhos fletidos em 90°. O mesmo deve ser observado ao ler um livro. Melhor sempre sentado e confortável, não deitado.

3) Quais são os tratamentos ortopédicos mais comuns em quem sente os efeitos do text neck?

Pacientes com queixas maiores e na fase aguda são tratados com medicamentos (relaxantes musculares e analgésicos) e calor local. O mais importante é tratar a causa, e não o sintoma. Por esse motivo, exercícios regulares, pausas durante o período de atividade e principalmente manter a postura correta são o ideal.

 

Doença cresce no mundo moderno


Tatiana Sócrates - Especial para o Estado de Minas

Pesquisa do Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) - TIC Kids On-line - revela que cerca de 69% das crianças e adolescentes do Brasil, na faixa dos 9 aos 17 anos, utilizam a internet mais de uma vez por dia. No Centro-Oeste, o índice ultrapassa a média brasileira e chega a 74% - é a região em que as crianças estão mais conectadas, ao lado do Sudeste, segundo o estudo.

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Os dados confirmam o crescente acesso dos brasileiros aos benefícios da tecnologia, mas, ao mesmo tempo, desvendam uma nova preocupação: as ferramentas eletrônicas estão contribuindo para o aumento da miopia entre os pequenos. “É uma tendência do mundo moderno”, alerta o oftalmologista Luiz Felipe Diniz, do Hospital Brasileiro de Olhos (HBO), em Brasília.

Cerca de 20% das crianças em idade escolar, de acordo com levantamentos do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), apresentam problemas de vista. A miopia é a campeã e já é considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) a epidemia do século. O uso de celulares e computadores por mais de seis horas diárias, segundo Diniz, pode levar ao agravamento dessa patologia em crianças e adolescentes.

Lucas Macedo, de 9 anos, sente na pele, ou melhor, nos olhos, os efeitos da tecnologia. Vidrado em smartphone, tablet e afins, ele usa óculos desde os 6. A mãe do menino, a fisioterapeuta Juliana Macedo, de 40, acredita que a internet atrapalhe muito. “Se deixar, as crianças ficam além da conta na frente da tela do computador e no celular. Acho que forçam demais os olhos.”

COMPORTAMENTO

Juliana conta que Lucas passa horas assistindo ao YouTube. “Ele está com 3 graus de miopia no olho direito e 1,5 no esquerdo.” Na escola, ele começou a ficar em pé, perto do quadro, para conseguir anotar o que a professora escrevia. “É preciso prestar atenção nessa questão da miopia infantil”, alerta Juliana. “Pensam que a criança é inquieta e teimosa, mas, na verdade, ela está apenas em busca de um campo melhor de visão.”

Como as crianças não identificam a dificuldade para enxergar, é importante que os pais fiquem atentos ao comportamento delas. “Quando elas têm alguma dificuldade visual, costumam ter dores de cabeça, desinteresse pelo estudo e baixo desempenho escolar. Também ficam muito próximas da televisão e têm mania de franzir os olhos para enxergar”, descreve Juliana. “Caso percebam essas atitudes em seu filho, é importante procurar um oftalmologista”, recomenda.

“É muito comum, no dia a dia do consultório, descobrirmos erros de refração - que é como denominamos a miopia - em crianças que tinham problemas de aprendizagem ou comportamento na escola”, confirma o médico oftalmologista Geraldo Canto, de Curitiba. “Para evitar isso, ir ao oftalmologista no início do ano é uma grande oportunidade de começar as aulas da melhor maneira.”

Além do uso excessivo das novas tecnologias, o aumento dos casos de miopia em crianças é relacionado à falta de atividades ao ar livre. “Um mecanismo de nossa visão, chamado de acomodação, nos permite olhar objetos distantes e focar com nitidez objetos próximos. Esse foco é feito com a contração do músculo ciliar, o anel no meio do olho para visão a distância. O excesso de esforço pode gerar fatores associados ao aumento da miopia”, esclarece Canto. É o que ocorre quando se força a vista ao digitar e ao assistir a vídeos em celulares e computadores.

Quanto mais longe, melhor!

Estima-se que, até 2020, 28% da população brasileira seja míope. Até 2050, o índice pode chegar a 51%, segundo a oftalmologista Renata Bettarelo. “Hoje, a taxa no Brasil gira em torno de 11% a 36%, mas a tecnologia tem contribuído para o aumento da doença”, alerta. O problema pode ser hereditário ou adquirido.

“É uma condição em que ocorre um alongamento indesejável do diâmetro anteroposterior do globo ocular”, detalha Renata. “Isso faz com que a imagem do objeto observado se forme antes da retina e não sobre a mesma, o que gera uma imagem borrada dos objetos distantes.”

A miopia é um problema ocular em que se consegue ver perfeitamente os objetos de perto, mas as coisas mais afastadas podem aparecer desfocadas, resume o médico Luiz Felipe Diniz. A causa está relacionada a fatores genéticos e ambientais.

O pouco tempo em ambiente externo e o excesso de tempo com o olhar fixado para perto, como a exposição às telas próximas (celulares, tablets, computadores) e livros, são os fatores ambientais mais associados à doença, segundo Diniz. Estudo do National Health Service (Serviço de Saúde Britânico) confirma que passar mais tempo ao ar livre torna as pessoas menos propensas à miopia. Para especialistas, isso tem a ver com os níveis de luz.

Para evitar esse problema, a publicitária Elenice Oliveira, de 31 anos, e o marido, o cineasta Márcio Moraes, de 52, resolveram impor regras rígidas aos filhos. “Durante a semana, os mais novos - Anabela e Victor Hugo - ficam sem internet e assistem à TV só depois das 16h, após terminar o dever de casa. Como dormem às 19h, o tempo em frente à telinha é curto também”, explica.

Os mais velhos, apesar dos cuidados, não escaparam da herança genética: Lucas, de 12, começou a usar óculos aos 9, e Nicolas, de 10, há dois anos e meio. Ambos têm miopia, como o pai, que depende dos óculos desde os 10. “Quando descobrimos que Lucas tinha o problema, ele já estava com 4 graus nos dois olhos. Já o Nicolas tem apenas 1 grau”, conta Elenice.

Fora do mundo real

O malefício das tecnologias, para Elenice, é mesmo o uso excessivo dos aplicativos - as crianças ficam dispersas, não interagem com o mundo real, adoecem e ficam mal-humoradas. “Tem o lado bom, mas o ruim prevalece, na minha opinião. Afeta o apetite, atrapalha o sono, substitui as brincadeiras e, claro, causa irritação nos olhos e, às vezes, dor de cabeça.”

Para prevenir a miopia e evitar que ela avance, o acompanhamento das crianças deve começar cedo, antes da alfabetização. A primeira consulta, de acordo com o oftalmologista Geraldo Canto, deve ser feita entre 6 meses e 1 ano de idade, quando já é possível verificar a existência de um grau mais elevado, diferença de visão entre os olhos, diferença de grau ou fixação do olhar.

“Desse período até ela ser capaz de se expressar sozinha, o exame é feito pela avaliação dos olhos depois de uma dilatação da pupila. A partir do momento em que a criança já consegue se comunicar e se mostra colaborativa, começamos também a usar imagens de desenhos, números ou letras”, explica o médico.

Geraldo Canto esclarece que nem sempre é preciso usar óculos quando a criança é muito nova. “Pessoas muito jovens com graus baixos não costumam ter indicação, a não ser que exista alguma dificuldade visual ou estrabismo detectado no exame. No geral, recomendamos óculos quando elas têm miopia acima de 1,5 grau, hipermetropia acima de 3 graus e astigmatismo acima de 1,5 grau.” Lentes de contato só mesmo em crianças maiores, sob supervisão dos pais, e acompanhamento do oftalmologista.

Dicas para o dia a dia

» Fazer a criança realizar atividades em ambientes externos diariamente, por 40 minutos, no mínimo.
» Não aproximar demais dos olhos os celulares, tablets, computadores e livros. Eles devem ser mantidos a 30cm da face, no mínimo.
» Não se debruçar sobre o objeto de leitura.
» Manter a tela do computador a 50cm da face, no mínimo.
» Fazer intervalos frequentes enquanto estiver utilizando esses objetos. A cada 20 minutos, retirar o olhar deles e focalizar objetos distantes, por cerca de 20 segundos.
» Uso de tablets e celulares por crianças de 2 a 5 anos não deve ultrapassar 1 hora por dia.

O que dizem os médicos

» As cirurgias refrativas para correção do grau são indicadas somente depois dos 18 anos, desde que a graduação já tenha estabilizado.
» Para evitar mais prejuízos à visão, a recomendação é, desde cedo, ensinar as crianças a fazerem intervalos de cinco minutos a cada hora na frente das telas.
» Reduza o brilho dos monitores. Ajuste-os procurando deixar a visibilidade agradável para a vista. Não deixe o fundo muito claro nem muito escuro.
» Monitores de cristal líquido cansam menos a vista do que os antigos, de tubo, pois já vêm com superfície antirreflexo e melhor definição de imagens. Fonte: Luiz Felipe Diniz, médico oftalmologista