Mulheres latinas desconhecem câncer de mama metastático

Das brasileiras consultadas, 34% disseram não saber da versão metastática do tumor

	Paulo de Araújo/CB/D.A Press
Além de pouco familiarizadas com o termo "câncer de mama metastático", as mulheres têm informações equivocadas sobre a doença (foto: Paulo de Araújo/CB/D.A Press)
O fim da campanha Outubro Rosa, de conscientização sobre câncer de mama, não encerra a preocupação com ações educativas com foco na doença. Ainda que, nos últimos anos, o nível de conhecimento a respeito do tumor mais comum entre as mulheres tenha aumentado, a maioria da população está mal-informada em relação à forma metastática da enfermidade. Essa foi a conclusão de uma pesquisa realizada pela Harris Poll com mais de 5 mil latinas, incluindo 1.196 brasileiras.

O levantamento, encomendado pelo laboratório Pfizer, mostra que, além de pouco familiarizadas com o termo “câncer de mama metastático”, as mulheres têm informações equivocadas sobre a doença. No Brasil, 64% das entrevistadas afirmaram que já tinham ouvido falar nesse estágio do câncer de mama, um percentual menor que o verificado no México (65%) e maior que o registrado na Argentina (55%), no Chile (55%) e na Colômbia (51%). Para 40% das brasileiras, a migração das células cancerosas mamárias para outros órgãos é uma raridade, o que não condiz com a literatura científica: três em cada 10 pacientes evoluirão para o câncer metastático, geralmente após terem se tratado do tumor primário.

O geneticista Antonio Abílio, da clínica Oncomed, no Rio de Janeiro, explica que o câncer de mama metastático surge quando algumas células do tumor original se destacam e caem na corrente linfática para se disseminar pelo corpo ou se fixar em outros órgãos. Por isso, trata-se de uma fase mais avançada do tumor primário. “O câncer é uma doença genética no sentido de que suas causas são mutações nos genes relacionados ao crescimento e à diferenciação celulares. Quanto mais evoluído é um tumor, mais mutações ele apresenta. De maneira que, em suas fases iniciais, ele tem menos mutações, comparado às mais avançadas. O tumor metastático é, em vista disso, um tumor avançado por definição, independentemente do tamanho” detalha.

A complexidade das mutações e o comprometimento de outros órgãos fazem com que a cura de um câncer metastático seja rara, no caso específico do tumor de mama em estágio 4, algo inalcançado pelas terapias atuais. Contudo, 87% das brasileiras ouvidas na pesquisa acreditam que o câncer metastático de mama tem cura se diagnosticado precocemente. “Tendo em vista que o câncer de mama metastático tem mais mutações genéticas que o tumor primário, muitas vezes elas (as pacientes) conferem resistência a certas quimioterapias”, observa o geneticista Antonio Abílio, da clínica Oncomed, no Rio de Janeiro, justificando a dificuldade de obter maior sucesso no tratamento da doença avançada.

Tratamento

Contudo, de acordo com a oncologista Daniela Assad, do Hospital Sírio-Libanês de Brasília, as entrevistadas estão certas no que diz respeito à importância da detecção precoce das metástases. Ainda que, por ora, não seja possível pensar em cura, o tratamento é mais eficaz quando se identifica mais cedo o espalhamento do tumor. “Quanto mais precocemente é feito o diagnóstico, mesmo na doença metastática, melhores são as possibilidades de oferecer tratamentos eficazes”, destaca Assad. “Nos dias atuais, mesmo a doença metastática tem tratamento. As mulheres nesse cenário podem viver vários anos com as terapias adequadas”, ressalta.

Para ela, é preciso que os médicos se envolvam mais no esclarecimento sobre o câncer de mama. “Em muitas situações e em muitas partes do país, a primeira abordagem das mulheres não é feita pelo especialista, seja o mastologista, seja o oncologista”, critica. “É importante que o médico generalista conheça as estratégias de rastreamento de câncer de mama, os principais sinais e sintomas e que ele esteja preparado para ouvir e examinar as pacientes adequadamente, sabendo que, na maior parte do Brasil, a doença é o tumor de maior incidência entre as mulheres”, afirma.

Assad avalia que iniciativas como o Outubro Rosa são muito importantes para chamar a atenção para a importância do rastreamento e do diagnóstico precoce do câncer de mama. Mas também uma ótima oportunidade para que os médicos promovam a educação em saúde da mulher e mostrem os avanços na área. “Eles têm nos permitido fazer diagnósticos mais precoces, cirurgias menos agressivas em muitos casos e tratamentos mais eficientes”, aponta. “Esse deve ser um esforço contínuo de todos que estão envolvidos no cuidado de pacientes com câncer de mama. Mas é verdade que a população, em geral, ainda desconhece essa doença e, por isso, outros aspectos relevantes dela precisam ser abordados.”

Jovens em risco
Embora a incidência do câncer de mama seja maior entre as mulheres com mais de 50 anos, o diagnóstico tardio da doença é mais comum em pacientes com até 39. É o que indica um levantamento do A. C. Camargo Cancer Center. O centro oncológico acompanhou 5.879 pacientes durante meia década e constatou que 34,8% das que tinham até 39 anos descobriram
a doença quando ela estava nos estágios 3 e 4. Entre as voluntárias com 40 a 49 anos, a taxa caiu para 24,5%. Na faixa de 50 a 64 anos, a índice foi de 22,8%. Entre as voluntárias com mais de 65 anos, 27,9%. O caráter mais agressivo da doença quando ela acomete mulheres jovens pode ser uma das razões do fenômeno, apontam os pesquisadores.

"Tendo em vista que o câncer de mama metastático tem mais mutações genéticas que o tumor primário, muitas vezes elas (as pacientes) conferem resistência a certas quimioterapias"
Antonio Abílio,
geneticista

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Daniele Assad, oncologista do Hospital Sírio-Libanês em Brasília

Quais são os prognósticos das pacientes com metástase?

Nosso conhecimento sobre a biologia molecular do câncer de mama avançou muito nos últimos anos. Hoje, quando falamos que uma mulher tem a doença, sabemos que não estamos falando de uma única enfermidade. Sabemos que existem vários tipos de câncer de mama, alguns com evolução mais lenta e outros com um comportamento mais agressivo. Também sabemos que esses tumores respondem de forma diferente a tratamentos distintos. A oncologia personalizada é exatamente isso: oferecer o tratamento que pode atingir a melhor resposta para cada tipo de câncer de mama, em cada paciente, sempre procurando oferecer também ganho de qualidade de vida. Por isso, temos pacientes com curso indolente que podem viver vários anos, mas, infelizmente, temos algumas pacientes que sobrevivem pouco, em função de doenças muito agressivas.

O que se tem de mais avançado nas pesquisas de novos tratamentos para o câncer de mama metastático?
Os novos estudos buscam associar os tratamentos já consagrados, como hormonioterapia e quimioterapia citotóxica, com drogas dirigidas a alvos específicos das células tumorais. Além disso, novas medicações desenvolvidas a partir dos avanços no conhecimento da biologia do câncer de mama, endovenosas e orais, estão sendo utilizadas. Essas medicações são direcionadas a características específicas das células do câncer de mama, que controlam a capacidade de multiplicação celular, a habilidade de desenvolver metástases e a resistência aos tratamentos já utilizados. Muito provavelmente, a próxima geração de medicações será a que permitirá ao nosso próprio sistema imunológico combater o câncer, a chamada imunoterapia.