Como é o homem do século 21? Entenda qual é a nova faceta da masculinidade

Quais são seus desejos, angústias, dúvidas e certezas? Ele se sente confortável diante das mudanças femininas ou vive numa encruzilhada? Solteiros ou casados, eles se propõem a pensar, a agir, a evoluir e a descobrir a nova faceta da masculinidade contemporânea com responsabilidade e sensibilidade

por Lilian Monteiro 19/04/2015 10:00

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Nauro Júnior/Divulgação
Fabrício Carpinejar, escritor, jornalista e professor universitário (foto: Nauro Júnior/Divulgação)

Quebra de tabus. Fim de estereótipos. Questionamentos existenciais. Como o homem contemporâneo se traduz? Clarice Lispector, em uma de suas crônicas nos idos dos anos 1960, escreveu: “Homem chorar comove. Respeito muito o homem que chora”. Ainda que exemplares raros, é perceptível que o homem sensível anda em alta. É aquele que chora no cinema, ouve tudo que a mulher tem a dizer, cuida da barba e do cabelo, cozinha, divide as tarefas de casa, toma conta dos filhos e tem certeza de que, ao decidir ser sensível, em nada interferirá na sua virilidade.

Os tempos são outros e a postura de macho troglodita não cabe mais (ainda que sobreviva). O papel de cafajeste, galinha, a postura machista e opiniões do tipo “isso é coisa de mulher” é das mais retrógradas. Esse perfil é combatido e cada vez mais um clichê. Assim como a ideia de que a mulher precisa de um homem fortão, com cara de mau, que pague suas contas e compre seus sapatos. É fato que mulher gosta que eles sejam poderosos, protetores, que tenham pegada e de sentir-se amparada, seja na hora do afeto ou das inseguranças. Mas na realidade, quem faz sucesso no século 21 é o homem que não precisa dominar, competir ou mostrar que é uma fortaleza. A escolha mais inteligente é aquele que aposta no respeito, no companheirismo e na admiração.

Mas o caminho a percorrer é longo. O escritor gaúcho, jornalista e professor universitário Fabrício Carpinejar, reconhecido pela sua irreverência literária, esteve em Belo Horizonte para a conferência “O jardim e o quintal, a fidelidade e a lealdade: estudo poético das relações humanas”, na Academia Mineira de Letras, e, numa conversa com o Bem Viver, disse acreditar que o homem anda meio perdido, porque precisa, ao mesmo tempo, “ser sensível e másculo, se cuidar e ter um ar desleixado, o que é complicado. O homem não pode fazer o que a mulher quer e carrega um dilema porque ela não sabe e deseja vários homens dentro de um. Não pode ser só viril, mas determinado. Não quer força, quer firmeza. Ela não perdoa o homem sem coragem, tem de ter iniciativa. Ao mesmo tempo, tem de saber respeitar e dar espaço para o feminino, a delicadeza, a sensibilidade e dar tempo para falar e ouvir. Ela quer o homem meio-termo, que tem capacidade para ser louco e sereno”.

Poeta e cronista, Carpinejar “receia” que o homem esteja mais romântico que a mulher. “Mas ela anda com o pé atrás e não aceita a sua gentileza, porque acha que ele a está comprando. A mulher está com dificuldade diante do puro princípio cavalheiresco. Há desconfiança, porque tem várias imagens e ela não sabe em quem acreditar. E o homem está desconcertado, porque precisa ter uma multidão masculina na alma.”

Para o escritor, no momento, o homem sofre o impacto das relações modernas, líquidas, da paternidade. “Deixou de ser mero assistente para assumir as crianças, novas tarefas em casa, na relação e, ao mesmo tempo, desenvolveu a espontaneidade, a sensibilidade e tem aprendido o que é devoção.”

VAIDADE Por outro lado, Carpinejar diz que o homem é bem mais vaidoso que a mulher. “Seja um brucutu, um modelo, um estivador, um DJ.” E a vaidade masculina não decorre da preocupação estética, “pois ele se vê tão superior, que dispensa enfeites. Sua fragilidade parte do conteúdo, de sua essência. Enquanto a mulher é segura espiritualmente e humilde na aparência (procurando infinitamente acessórios e roupas para se melhorar), o homem é indeciso na esfera emocional e soberbo em sua imagem externa. Ele sempre foi um metrossexual da alma”.

Carpinejar afirma que a ostentação do homem vem da carência. “Ele precisa constantemente ser legitimado, festejado pela sua companhia, senão se apaga. Apesar da fachada inviolável, ele é dependente de um agrado. Não dispensa cafuné na linguagem, um afago em seu ego. Adquire segurança de fora para dentro, a partir da repercussão de suas ações. O homem não sobrevive diante da estiagem do elogio. Por isso, não fica sozinho. A vulnerabilidade do macho é megalomaníaca. Ele anseia mesmo por uma chuva de confetes. Bajulação, se for o caso. Não importa se a declaração é exagerada ou não, fundamentada ou artificial. É um Narciso no corpo de Hércules.”

ramon lilsboa/em/d.a press
Matheus Ventura diz que é bastante flexível, mas muitos ainda estão presos em atitudes e pensamentos ortodoxos (foto: ramon lilsboa/em/d.a press)


Liberdade emocional e vaidade
O primeiro passo para a transformação está na sabedoria de pensar a respeito, seja de um fato em si, do comportamento, da atitude, das percepções, do que se ouve e fala. Casado, relações-públicas, com atuação no mercado de publicidade, professor de marketing digital e pensador sobre o comportamento humano no blog que leva seu nome, Fabrízzio Nardi, de 32 anos, é enfático ao afirmar que “não há um novo homem. O homem contemporâneo é o mesmo, com novo papel e responsabilidades”.

Para Fabrízzio, antes, o homem não tinha direito à emoção. Era apenas um ser racional. Ele não podia deixar o lado emocional transparecer, porque isso era sinônimo de fraqueza. Depois de anos de luta, com o crescimento da mulher e sua inserção no mercado de trabalho, a vaidade do homem chefe de família passou a ser questionada, assim como suas certezas e convicções. “Aí está todo o problema que eles precisam encarar.”

Fabrízzio assegura que o maior obstáculo masculino está no fato de a sua vaidade estar na essência. “Por isso, é mais complexo e o desafio de mudança é maior para ele. A grande questão é a ligação com a emoção, já que sempre tenta encontrar argumentos racionais e esquece o afeto, a relação emocional. Para o homem, é muito mais difícil.”

Mais do que geração, para Matheus Ventura, de 24, jornalista que atua na área de comunicação empresarial, o perfil do homem contemporâneo tem a ver com as transformações da sociedade, as mudanças do mundo e as modificações do comportamento. No entanto, ele reconhece ter mais abertura e cabeça flexível diante das questões atuais do que homens mais velhos, “muitos ainda presos em atitudes e pensamentos ortodoxos”.

Matheus não sabe dizer se é um movimento, um grupo pequeno ou se realmente os homens, enfim, decidiram assumir sem amarras atitudes que demonstram sua sensibilidade. “Falo por mim e pelo meu círculo de amizades que, sim, o homem já não tem vergonha de demonstrar suas emoções e está seguro de que não afetará sua masculinidade e virilidade.” Ele revela que acompanhou sua mãe ao show do Roberto Carlos, a princípio não tão confortável, mas que ficou tão emocionado – já que o cantor faz parte de uma história linda de seus pais – que chorou muito. “Foi especial e até postei no Facebook”, admite.

arquivo pessoal
Tocando piano para os avós, Arnaldo e Aurora Nardi, Fabrízzio diz que o homem precisa abrir mão, tolerar e dialogar (foto: arquivo pessoal)


RESISTÊNCIA Para Matheus, a barreira que percebe diante desse novo homem é que “muitas mulheres têm resistência a esse ser sensível. “O que é loucura, porque não é questão de gênero, mas de pessoas. E os sentimentos e emoções são inerentes a todos.”

Já Fabrízzio reconhece que o caminho não tem sido fácil, nem tranquilo. Ele acredita que a mulher soube evoluir melhor e o homem tem dificuldade em traduzir o novo papel em comportamento. Para Fabrízzio, a saída é o homem praticar “o amor-comportamento, que é diferente do amor-sentimento, do dizer eu te amo. O comportamental é entender, abrir mão, raciocinar, tolerar, dialogar”.

Também poeta, na luta para publicar o primeiro livro de poesias e ensaios a partir da compilação de muros pichados da capital, Palavra dura, Matheus revela que mora com quatro mulheres: mãe, irmã e sobrinhas, com idades entre 5 e 60. “Essa convivência interfere na minha visão. Acredito em respeito e entendo mais as mulheres e tenho meu papel masculino diluído, já que assumo funções dentro de casa de forma natural – cozinhar, fazer compras e arrumar o quarto. Mas vejo as diferenças. Minha mãe acha que ela tem de passar minha roupa, minha irmã cobra se não arrumo a cama e minha sobrinha de 21 anos diz que tenho mais é que me virar.” Vivendo nesse universo feminino, Matheus conta que aprendeu, principalmente, a ouvir. “Em comum com todas elas é a paciência para escutar. É preciso ouvido de ouro, senão o entendimento não se traduz.”

TEMPO Matheus crê que a mulher busca no homem de hoje alguém que a apoie e a entenda na na sua caminhada na busca da independência emocional, ainda que pareça paradoxal. “O que importa é o companheirismo. Ela quer que ele a deixe livre e, assim, os dois terão mais chances de andar juntos. Aliás, é a mesma busca do homem, uma mulher independente e parceira.”

Preciso e seguro em seus pensamentos, Fabrízzio crê que o homem quer e demonstra o desejo por mudança, seja na busca da relação a dois, seja no direito a sentir emoções. “Mas, certamente, ele faz isso de maneira gradativa. É um momento de transição, não de metamorfose completa. E vai levar algum tempo.”