Estudo britânico afirma que pessoas que se sentem pelo menos três anos mais jovens costumam viver mais

Mais de 6 mil idosos com idade média de 65 anos foram acompanhados durante 99 meses

por Correio Braziliense 21/01/2015 09:30

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Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press
Aos 82 anos, José Gontijo se sente com 60: "Eu tenho disposição para tudo. Aqui, não tem moleza e preguiça não" (foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)
Há mais de 10 anos, José Gontijo, 82, vai à academia religiosamente três vezes por semana. “É bom demais. Se tem uma coisa que me traz prazer, é a academia”, diz. A dedicação aos exercícios físicos sempre contou com o incentivo da família. “Quando ele se aposentou, ficou muito parado em casa. Os filhos e eu começamos a falar para ele fazer alguma atividade física. Sem trabalhar, só em casa assistindo à televisão, não dá”, conta Neiva Gontijo,73, mulher de José. O casal também adora dançar. “Quando nós viajamos a Caldas Novas, vamos a uma seresta. Chego lá e já tem o meu lugar marcado”, conta o aposentado.

Com um bom condicionamento físico e muita disposição para se divertir, José garante ter encontrado a fórmula da juventude. Na nona década de vida, ele diz estar com pontos a menos nessa matemática. “Tenho 82 anos, mas, na minha cabeça, acho que tenho 60. Eu tenho disposição para tudo. Aqui, não tem moleza e preguiça não”, avisa. Um estudo recente da University College London (UCL) traz a constatação científica da boa fase exibida pelo morador da Octogonal. Os pesquisadores da instituição britânica concluíram que idosos que se sentem pelo menos três anos mais jovens têm uma expectativa de vida maior do que aqueles que se sentem mais velhos que a idade cronológica.

Eles chegaram à conclusão depois de entrevistar 6 mil britânicos com idade média de 65 anos. Dos participantes do estudo, 70% consideravam ser pelo menos três anos mais jovens, 25% se sentiam próximos à idade cronológica e quase 5% se consideravam mais velhos. Eles foram acompanhados durante 99 meses. A taxa de mortalidade foi de 14,3% entre os idosos do primeiro grupo; de 18,5 entre os do segundo e de 24,6% entre aqueles que se sentiam mais velhos.

Um dos responsáveis pelo estudo, Andrew Steptoe ressalta que os resultados reforçam a importância de incentivar os idosos a não ficarem parados. “Encorajar as pessoas mais velhas a sentirem que não são capazes de fazerem certas coisas, fisicamente e psicologicamente, causa um impacto negativo na maneira como elas se sentem em relação à idade que têm”, diz.

Gustavo Moreno/CB/D.A Press
Hernani e a professora Lívia Cristina: o aposentado de 73 anos faz aula de dança e frequenta bailes (foto: Gustavo Moreno/CB/D.A Press)
Para José, o descompasso entre a idade cronológica e a biológica só traz benefícios. “Tenho mais força e me movimento mais”, conta, referindo-se à academia. “Se você ficar só dentro de casa, o organismo vai ficando ruim. Não é bom.” Além das vantagens físicas, há as sociais. “Eu cheguei lá (à academia) e fiz muita amizade. Troquei de lugar há pouco e foi uma briga. Todo mundo queria que eu ficasse”, diz. Na dança, os holofotes também se voltam para José. Ele e a companheira são conhecidos por começarem a festa. “Quando a gente chega a algum lugar, está tocando uma música e não tem ninguém dançando, eu falo para ele ‘vamos abrir o baile?’ Nós começamos a dançar e todo mundo vai também”, orgulha-se Neiva.

Da dança à meditação
A sensação de que a idade cronológica não bate com a biológica também é comum para Hernani Rodrigues, 73 anos. “Uma vez, estava comentando com os meus filhos sobre uma pessoa e a chamei de idosa. Eles ficaram me olhando e disseram que eu estava falando sobre alguém que tinha a minha idade como se fosse mais velho. Mas eu me sinto jovem, com uns 40 anos”, diz. O aposentado atribui a sensação a todas as atividades que pratica. “Eu sempre trabalhei minha qualidade de vida em todos os sentidos.”

Na rotina agitada, não há tempo para ficar parado. “Acordo cedo, faço minha alimentação de acordo com (a indicação do) nutricionista, danço, encontro os amigos, cuido da casa. Só não gosto de passar a roupa”, detalha Hernani. Nos fins de semana, além dos trabalhos voluntários, ele gosta de ir aos bailes. “Ficamos de nove da noite até uma da manhã.”

Marco Polo Dias, médico do Centro Multidisciplinar do Idoso do Hospital Universitário de Brasília (HUB), ressalta a importância de não ficar parado. “A atividade física é inerente ao ser humano. Nós fomos feitos para isso. Quanto mais a pessoa se movimentar, mais reserva de músculo ela terá para fazer as atividades do dia a dia”, ensina. Segundo o especialista, a maioria das pessoas que se sente bem com a própria saúde e que acha que tem uma idade cronológica maior do que a biológica pratica atividade física regularmente.

Há um ano se dedicando à dança de salão e ao tango, Hernani só vê benefícios com as aulas diárias — em alguns dias, ele chega a fazer três horas — e os bailes que frequenta ao longo da semana. “Nos bailes, eu danço no mínimo 3 horas. É um bom exercício físico. Também trabalho o emocional ao conviver com as professoras, com as outras pessoas que dançam. Essa vivência também diminui o estresse”, relata.

Lívia Cristina dá aula para Hernani há um ano e nota as diferenças do exercício para a saúde física e mental do aposentado. “Ele é muito dedicado, não perde para nenhum jovem. A dança só acrescentou: na postura, no equilíbrio, na força dos músculos e no conhecimento sobre o corpo”, detalha. A professora também destaca a melhora da memória como benefício da dança. “Os alunos estão sempre lembrando do que já foi feito, o que já aprenderam. Ou seja, sempre estimulando o cérebro, as habilidades cognitivas.”

Segundo Dias, é um erro afirmar que os mais velhos não podem praticar atividades físicas por causa das limitações da idade. Os exercícios precisam ser moderados, proporcionais ao condicionamento físico e cardiovascular da pessoa. “O idoso que restringe o movimento por achar que está velho, que não dá conta ou porque tem medo de lesão, vai entrar em uma cascata de paralisação e pode até ficar sem andar”, alerta. Só é preciso estar atento aos casos em que o cuidado tem que ser redobrado, reforça o especialista. “Se tiver alguma enfermidade, tem que procurar uma orientação médica antes.”

Hernani complementa que o segredo da longevidade está ainda em cuidar da saúde espiritual. O aposentado também reserva um tempo do dia para a academia, o pilates e a meditação. “Eu não tenho inveja de nenhum jovem. Tudo o que eles fazem, eu faço também. No meu ritmo, mas eu faço.”

"O idoso que restringe o movimento por achar que está velho, que não dá conta ou porque tem medo de lesão, vai entrar em uma cascata de paralisação” - Marco Polo Dias, médico do Centro Multidisciplinar do Idoso do HUB

André Violatti/Esp. CB/D.A Press
A capoeira mantém o condicionamento físico de Paulo Henrique (foto: André Violatti/Esp. CB/D.A Press)

Rotina de disposição
Há mais de 30 anos, Paulo Henrique Lima, 45, joga capoeira quase todos os dias. “Não consigo me ver fora disso. A gente diz que come capoeira.” Na escola em que trabalha, dá aula da luta três vezes por semana e faz o mesmo na Associação Palmares de Capoeira nos outros dias. Para completar a maratona, participa das rodas de vários colegas. “Em alguns casos, pode durar até 24 horas.”

O professor começou a jogar aos 14 anos por causa de uma fratura no braço. “Na ocasião, o médico me indicou a prática de um esporte. Vi na capoeira uma forma de fazer fisioterapia, acabou virando amor eterno”, conta. Para Paulo Henrique, se ele não tivesse continuado a praticar o esporte, sua disposição hoje em dia não seria a mesma. “Meu condicionamento físico seria totalmente diferente. Você trabalha a respiração, a coordenação motora e o sistema cardiovascular”, enumera.

Um recente estudo da Universidade de Harvard, no Estados Unidos, indica que a dedicação a essas atividades nem precisa ser muito intensa para aumentar a longevidade. Ao analisar dados sobre 650 mil pessoas com idade entre 21 e 90 anos, sendo a maioria acima dos 40, os cientistas concluíram que praticar exercícios físicos durante os dias de folga pode aumentar em até sete anos o tempo de vida de uma pessoa.

Emoções
Otávio Nóbrega, professor do Programa de Ciências Médicas da Universidade de Brasília (UnB), destaca que, assim como é preciso se preparar fisicamente ao longo dos anos, é necessário trabalhar as questões emocionais. “O ideal é começar a se preparar antes de aposentar para saber como ocupar a mente e, principalmente, o tempo.” Paulo Henrique avisa que há espaço nas rodas para interessados de todas as idades. “Vemos capoerista com mais de 70 anos, mestre com mais de 80.”


Ajuda da resiliência
“Não é um processo sempre tranquilo a pessoa sentir que, ao longo dos anos, está perdendo o ritmo. Pessoas tendem a envelhecer de maneira melhor quando são mais resilientes, ou seja, aquelas que reagem e se posicionam positivamente frente ao envelhecimento. Quem tem uma percepção mais serena e satisfeita da vida costuma ter menos problemas de saúde, como hipertensão, diabetes, infarto. Algumas pessoas têm uma resiliência maior que outras; essa situação pode mudar com psicoterapia, acompanhamento de um profissional, e na procura por ocupações que estimulem e deem prazer.” - Otávio Nobrega, professor do Programa de Ciências Médicas da Universidade de Brasília (UnB)


Cada vez mais longevos
Segundo um estudo divulgado recentemente na revista científica Lancet, a expectativa de vida da população mundial aumentou de 65,3 anos em 1990 para 71,5 em 2013. As mulheres têm vivido 6,6 anos a mais, enquanto a expectativa de vida dos homens aumentou 5,8 anos. Se esse crescimento continuar nesse ritmo até 2030, a expectativa de vida passará a ser de 85,3 para elas e de 78,1 para eles. Ainda de acordo com a pesquisa feita em 188 países, a melhora foi resultado da redução de mortes por causa de infecção respiratória, diarreia, câncer, doenças respiratórias crônicas e condições neonatais.