Sexo maduro e sem tabus: o que muda na forma de encarar o corpo

Envelhecer é aceitar a flacidez da pele, as manchas da senilidade, a gordura que insiste em aparecer. É se olhar no espelho e se sentir sexy e bonita mesmo sem a forma física de quando se tinha 20, 30, 40 anos a menos de décadas vividas

por Flávia Duarte 12/07/2013 09:00

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Zuleika de Souza/CB/D.A Press
Ruth Guimarães, 66, aprendeu a conviver com o visual que a idade lhe trouxe. Em seu quinto casamento, a atriz se diz uma "dependente química" do sexo (foto: Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
A desinibida Ruth Guimarães levanta a saia e mostra as manchas típicas de uma pele que envelhece. Não disfarça que, se pudesse, teria de volta o corpo dos anos idos, mas aprendeu a conviver com o visual que a idade lhe trouxe. As pernas, que tantos moços conquistou, já não têm a mesma firmeza de antes. Os cabelos estariam brancos sem o recurso dos cosméticos, algo impensável para a atriz. Ainda assim, ela se considera privilegiada: o biotipo mignon favorece a aparência, que aparenta mais jovem do que a data de nascimento sugere. A prática diária de caminhada e academia, além de uma boa genética, evitaram o ganho de peso e a flacidez.

Ainda assim, o contentamento com o próprio reflexo é um exercício, uma aprendizagem. “O corpo envelhecido não é atraente, justamente por causa dos paradigmas que se criaram de eterna juventude. Me olho no espelho e me assusto. Comecei a ter consciência de que estava envelhecendo, de que estava literalmente velha. Um dia, me olhei nua espelho, há três anos, e tomei um susto. ‘Que ser é esse que está aí?’. Corri para o computador e escrevi uma peça, Velhice ponto G, que vou estrear até o fim do ano. No texto, brinco com o espelho, dizendo que não vou perguntar se existe alguém mais bonita do que eu, porque já sei da resposta, pergunto a ele se ele tem capacidade de reciclar, de transformar minha imagem. Depois, comecei a pensar: ‘É esse corpo que tenho. Vou ter que lidar com isso… Não é uma coisa depressiva, mas de atenção.”

Fátima Lacerda também se orgulha de ainda não ter lançado mão dos artifícios das cirurgias plásticas e tratamentos estéticos mais invasivos para recuperar o viço físico. “Sem julgamentos com quem faz”, ela logo deixa claro, mas acha bom demais estar de bem com o corpo aos 58 de idade. “Não tenho muito conflito com o envelhecimento. Brinco, às vezes, de que a boca era assim, meu corpo era assim, mas logo passa. Eu penso: é, mas tem outras vantagens. A pessoa já olha e vê que não tem plástica, então não estou criando nenhuma expectativa. Se o outro criou, problema dele. É o olhar dele.”

Envelhecer é aceitar a flacidez da pele, as manchas da senilidade, a gordura que insiste em aparecer. É se olhar no espelho e se sentir sexy e bonita mesmo sem a forma física de quando se tinha 20, 30, 40 anos a menos de décadas vividas. É também admirar o corpo do outro, que, muitas vezes, envelhece junto. A escritora Isabel Allende escreveu, em Amor, que um dia se olhou nua no espelho ao lado do marido Willie, de 75 anos, e se questionou, “quem são esses velhinhos intrusos no nosso banheiro?”, diante da surpresa do próprio reflexo. “Por sorte, as mudanças que surgem com a velhice são gradativas, acontecem pouco a pouco, misteriosamente. Há tempo para se acostumar com essas mudanças e aceitá-las.”, disse em entrevista à Revista do Correio. “A frase preferida de Willie é: ‘Nós estamos caindo aos pedaços juntos’”, brinca.

Envelhecer em dupla é descobrir que o corpo muda e já não responde aos estímulos sexuais como antes. Casados há 30 anos, Élcio de Paula, 70 anos, e Áurea Lopes, 66, deixam explícita a admiração mútua. “Acho ela linda. Acho a coisa mais bonita quando, às vezes, ela toma um banho e vem de calcinha para o quarto. Olho para ela e acho lindo. Vejo as curvas dela e penso: ‘Minha mulher ainda está linda!’”, diz, apaixonado. Áurea de fato ainda mantém um corpo que sugere a beleza de outros tempos. “Se você me visse mais nova, ia ver que eu tinha um corpo bonito. Mas tem que mudar mesmo e me aceito do jeito que estou”, comenta a senhora de bumbum empinado e batom vermelho nos lábios.

A transa com alguém de mesma idade liberta os preconceitos. Ruth, que sempre se relacionou com homens mais jovens, hoje está casada com um homem de mesma faixa etária e já não precisa mais dos artifícios para esconder o corpo. Se antes ficava nua diante de alguém com menos idade protegida pela meia luz, hoje não teme exibir o corpo de mais de 60. Seu companheiro também carrega os sinais do mesmo caminho percorrido. “Isso é maravilhoso ao envelhecer juntos. Um é espelho do outro. E você não passa pelo problema de como vou disfarçar isso ou aquilo.”

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Élcio de Paula, 70 anos, ainda vê a mulher, Áurea Lopes, 66, com o mesmo olhar apaixonado do início da relação: "Acho ela linda" (foto: Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
A transformação, porém, não é apenas estética. O corpo programado para a procriação oferece diferentes respostas ao estímulo sexual. O ginecologista José Bento esclarece que a queda de níveis de hormônios femininos na fase da menopausa arrasa a libido, resseca a vagina, deixa as paredes mais finas, provocando dor durante a relação, o que funciona como um balde de água fria para o tesão. Para elas, porém, há soluções medicamentosas. “Hoje, você pode indicar testosterona para essa mulher, reposição hormonal e cremes para melhorar a lubrificação”, diz o médico.

Cada mulher busca uma solução. Fátima usa cremes. Muitas usam. Ruth nunca teve problemas de ressecamento, mas morre de medo de ter. “Eu não queria passar pelo vexame do ressecamento genital, porque sou muito erotizada e sempre tive companheiros mais novos que eu. Durante 15 anos fiz a reposição. Parei o tratamento depois que comecei a me relacionar com o meu atual marido, de 62 anos, depois de cinco anos juntos. Os primeiros anos a gente viveu no céu, foi pauleira. Depois, fomos entendendo melhor o que é estar juntos velhos. Respeitar os sinais do envelhecimento também é muito legal. Você não fica com muito pudor, você fica mais ousadinha nessa fase. Você começa se sentir mais à vontade para dizer: ‘É isso aí. Não quer, tem quem queira’.”

O corpo masculino também se comporta de maneira diferente quando deixa de ser jovem. Acima de 40 anos, cerca de 25% deles sentem os efeitos da diminuição da testosterona e da dificuldade em ter ereção. Doenças associadas ao envelhecimento e a um estilo de vida descuidado com a saúde aumentam as chances de na maturidade conviverem com a disfunção erétil. “Quanto mais velho, mais sujeito o homem está a doenças. Ele tem mais problemas cardíacos, deslipidemias, alterações urinárias, problemas prostáticos, diabetes e também as alterações sexuais. Nessa idade, as artérias não são as mesmas e os níveis hormonais começam a sofrer decréscimos”, alerta o médico Antônio Carlos Pompeo, responsável pelo Departamento de Uro-oncologia da Sociedade Brasileira de Urologia e professor da Faculdade de Medicina do ABC.

A dificuldade em manter a ereção, inclusive, torna-se um indicativo de outros problemas de saúde mais sérios, como as vasculares. Isso porque, para que o pênis fique rígido, há grande deslocamento de fluxo sanguíneo para a região. Como as artérias da genitália são três vezes mais finas do que as das coronárias, um entupimento que comece ali pode ser sinal de complicações cardíacas, por exemplo. Por isso, mais do que o desempenho sexual, a disfunção erétil em homens mais velhos exige atenção redobrada.

Se o corpo não tem o mesmo vigor, a cabeça também pode ser inimiga da libido. “Não é só questão de testosterona. Nessa idade, alguns homens podem se interessar por outras questões e deixar o sexo de lado”, comenta Eduardo Bertero, urologista do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo. Ele comenta, inclusive, o caso de um paciente que tinha colocado uma prótese peniana para conseguir manter o pênis ereto para a relação e logo pediu para reverter o tratamento. O sexo já não importava mais. A companhia dos netos era suficientemente prazerosa.

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Indústria farmacêutica revolucionou a vida de muitos que andavam impossibilitados de transar: o grande marco dessa sacudida no marasmo da rotina dos homens idosos foi o Viagra (citrato de sildenafila) (foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
Para aqueles que ainda têm o sexo em alta conta, porém, a indústria farmacêutica revolucionou a vida de muitos que andavam impossibilitados de transar. O grande marco dessa sacudida no marasmo da rotina dos homens idosos foi o Viagra (citrato de sildenafila), que, há 15 anos, devolveu a relação sexual a quem sofria com problemas de ereção. E os números apontam que não são poucos. Segundo o estudo Mosaico Brasil, realizado pelo Prosex, em 2008, pelo menos a metade dos homens com mais de 40 anos sofre com algum grau do problema. “Foi uma grande euforia naquela época. Tínhamos nas mãos uma solução de ação inovadora. Aquilo significava uma possibilidade, nessa segunda fase da vida, de o paciente ter o desempenho sexual próximo daquilo que ele precisa para se sentir realizado e satisfeito em uma idade avançada”, afirma Eurico Correia, diretor médico da Pfizer, o laboratório que desenvolveu a droga e deteve sua patente até 2010.

Antes da chegada dessa substância ao mercado, a outra possibilidade, que continua sendo usada até hoje quando o paciente não pode ou não responde bem ao tratamento medicamentoso, são as injeções de prostaglandina (uma substância que estimula os nervos do pênis e deve ser aplicada minutos antes da relação sexual) e as próteses penianas. “Uma dessas próteses é flexível, feita de silicone com um metal dentro. O paciente molda o pênis de tal maneira que ele consegue a penetração. Também há as próteses infláveis, em que há um reservatório de líquido embutido dentro do organismo do indivíduo e uma bombinha, que tem um acionador que fica debaixo da pele escrotal. A pessoa aciona o dispositivo e faz bombeamento e, assim, tem ereção. Depois da relação, ele esvazia a prótese”, explica o médico Antônio Carlos Pompeo.

Mais recentemente, a novidade é a terapia de reposição hormonal masculina em gel. O medicamento foi apresentado durante a 13ª Jornada Paulista de Urologia, em abril deste ano, e devolve ao homem os níveis normais de testosterona com a simples aplicação de um creme nos ombros. O impacto é a melhora das qualidade de vida, das condições físicas e a otimização da vida sexual. A droga já é usada no Estados Unidos e na Europa, mas ainda aguarda aprovação da Anvisa no Brasil. Hoje, a testosterona só está disponível por aqui em injeção e pela terapia oral. “A primeira testosterona foi sintetizada em 1935, mas hoje temos formas de reposição mais modernas, mais sofisticadas, mais fáceis de serem usadas e que duram mais. Antes, tínhamos injeções de curta ação, que tinham que ser ministradas a cada duas semanas. O gel de testosterona também é uma boa opção, aplicado de maneira simples, sem maiores problemas”, esclarece o urologista Ernani Rhoden.

"A sexualidade é um marcador de vitalidade, uma característica que você mantém do nascimento até a morte”
Mário Santos, andrologista