Biógrafo de Hitler investiga os extertores da Segunda Guerra Mundial

Autor de 'O fim do Terceiro Reich: a destruição da Alemanha de Hitler, 1944-1945'busca os motivos pelos quais lutou até o país ser completamente arrasado

por Marcelo da Fonseca 14/08/2015 11:40
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(foto: Divulgação)
Cinco anos após o início da Segunda Guerra Mundial – conflito mais violento já travado entre nações –, a população alemã pagava um alto preço pelas pretensões megalomaníacas do Partido Nacional Socialista, liderado por Adolf Hitler. Falta de luz e água, contingenciamento de alimentos e bombardeios aéreos quase diários se tornaram rotina nas principais cidades do Terceiro Reich em 1944. Uma vitória da Alemanha estava descartada, até mesmo pelos seguidores fanáticos de Hitler, que tentavam mascarar as notícias diárias de ataques já em território alemão vindos da União Soviética pelo leste, e das tropas aliadas, formadas majoritariamente por ingleses e norte-americanos, vindos do oeste.

Ainda assim, ordens do Füher eram seguidas à risca pelos principais comandantes nazistas e muitos cidadãos comuns se mantiveram entusiastas do regime até seus estertores. Ao contrário da maioria das guerras, que chegam ao fim por meio de alguma solução negociada, em que o lado derrotado busca um acordo por mais desvantajoso que seja, o final da Segunda Guerra foi completamente diferente. Mesmo com a derrota catastrófica já escancarada, grande parte da nação estava decidida a continuar lutando até que seu país fosse quase varrido da Terra. O resultado foi uma destruição total: a Alemanha só parou de lutar quando as cidades estavam em completa ruína e ocupadas pelas tropas estrangeiras.

Em 'O fim do Terceiro Reich: a destruição da Alemanha de Hitler, 1944-1945', o historiador Ian Kershaw busca as explicações para esse momento trágico de uma nação, sem precedentes na história mundial. “Por que motivo as ordens autodestrutivas de Hitler continuavam a ser obedecidas? De que alternativas os alemães, civis e militares, dispunham na fase derradeira da guerra?” A narrativa começa em julho de 1944, poucos dias após o Dia D, data em que as tropas aliadas desembarcaram na Normandia, litoral francês, e a derrota do Exército nazista se tornava cada vez mais evidente. O autor é especialista na vida de Hitler – escreveu biografias detalhadas do ditador – e na Segunda Guerra. Kershaw nasceu em uma Inglaterra devastada pelos bombardeios alemães, em 1943, e se aprofundou no funcionamento do Partido Nazista e seu principal líder.

Até os momentos finais do conflito, quando Hitler se matou poucos dias antes de o Exército soviético invadir Berlim, parte da população alemã não se mostrava disposta a aceitar uma solução negociada. Apesar do “cansaço extraordinário causado por anos de batalha” – relatado por um cidadão alemão, no início de 1945 –, era preferível “um fim com horror a um horror sem fim”. Entre as explicações para a resistência fanática alemã, o historiador aponta a “dominação carismática” exercida por Hitler, que não aceitava a derrota ou uma rendição negociada, e a síndrome da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), que, segundo lideranças nazistas, teria infligido dura humilhação ao povo alemão. Uma nova rendição estava fora de cogitação.

O apoio extremista ao Füher, no entanto, não foi unanimidade entre os alemães. Houve tentativas de encerrar o conflito por meio de sabotagens contra os líderes do regime. Entre elas, o atentado fracassado de um oficial alemão, em julho de 1944, que tinha como objetivo assassinar Hitler. Nos dias seguintes, uma onda de manifestações de apoio ao Füher tomaram as principais cidades alemãs. Também ocorreram tentativas de sabotagem ao Exército alemão por parte de cidadãos comuns, já desgastados com o longo período de guerra. A maioria com finais trágicos para aqueles que tentaram sabotar o regime nazista, quase sempre com apoio da própria população.

Um dos episódios terríveis narrados no livro se passou em abril de 1945, na cidade de Ansbach. Ao tomar conhecimento da destruição de cidades vizinhas, ocupadas pelas tropas norte-americanas, o estudante Robert Limpert, de 19 anos, decide se movimentar para impedir que sua cidade seja devastada completamente. O jovem corta cabos telefônicos que imaginou serem usados por comandantes nazistas que determinariam a resistência das tropas locais até o último cidadão vivo. Duas crianças da juventude hitlerista flagram a tentativa de sabotagem e denunciam sua ação para a polícia local. Limpert é preso pouco depois de voltar para sua casa, espancado na frente de uma multidão e enforcado em praça pública. Quatro horas depois, os soldados ianques entram em Ansbach sem que um único tiro fosse disparado e cortam a corda na qual estava pendurado o corpo do estudante.



O FIM DO TERCEIRO REICH
Ian Kershaw
Tradução de Jairo Arco e Flexa 
Companhia das Letras
616 páginas
R$ 69,90

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