Em busca das origens

Autobiografia de Stephen Hawking, Minha breve história apresenta de forma bastante sucinta a vida e as ideias do mais conhecido cientista dos nossos dias

por 28/12/2013 00:13
Sarah Lee/The Science Museum/Reuters
Sarah Lee/The Science Museum/Reuters (foto: Sarah Lee/The Science Museum/Reuters)
João Paulo



O físico Stephen Hawking é a mais conhecida figura da ciência em todo o mundo. Contribuem para isso elementos científicos e pessoais. No que diz respeito às ideias, ele é um ousado pesquisador em física teórica e cosmologia, tendo desenvolvido pesquisas em torno do Big Bang, dos buracos negros e de novas concepções sobre o tempo. Além disso, ocupou em Cambridge a cátedra de matemática que pertenceu a Newton. Em física, paradoxalmente, quanto mais difícil o assunto, mais próximo do interesse do homem comum, já que as pessoas não querem saber de equações, mas de respostas para as grandes questões: a origem do universo, as viagens no tempo, o que são buracos negros. Esse é o campo de Stephen Hawking e vem daí parte de sua proeminência.

O outro motivo que faz do físico britânico de 71 anos uma das pessoas mais conhecidas do mundo é sua condição pessoal, uma doença incapacitante progressiva, a esclerose lateral amiotrófica, que foi retirando aos poucos os movimentos, até deixar o cientista preso numa cadeira de rodas, movimentando apenas um músculo do rosto, com o qual opera um computador. Ele escreve, letra a letra, o que dá ainda mais dramaticidade à sua obra. A imagem que passa é a de um cérebro poderoso, encarcerado em um corpo quase paralisado. Além disso, poucos portadores da doença chegam à idade que ele alcançou.

Stephen Hawking não diminui o impacto da doença em sua vida, mas está longe de ficar na lamentação. Mesmo criticando quem o valoriza sobretudo pela coragem em vencer obstáculos físicos, sabe que não pode falar de sua vida sem tratar da doença. Minha breve história é uma tentativa de equilibrar os dois lados. Com isso, consegue ser uma introdução útil à vida e obra do cientista. Quem quiser conhecer mais sobre Hawking tem outras obras disponíveis, como a extensa biografia escrita por seu colaborador, Leonard Mlodinow, ou mesmo seus livros de divulgação científica mais aprofundados, como Uma breve história do tempo e O universo numa casca de noz, já lançados no Brasil.

Hawking, até pela dificuldade em escrever, pesa bem as palavras (cada uma delas exige esforço que pode levar minutos) e os momentos que escolheu relembrar em sua autobiografia. E tem ainda o cuidado de entremear o texto com fotos, sempre expressivas, que substituem o que poderia estar num texto mais descritivo. O livro, com pouco mais de 140 páginas, é dividido em pequenos capítulos, que desde o título sintetizam o que será revelado, intercalando relatos sobre a vida pessoal (“Infância”, “Oxford”, “Casamento”) e acerca da pesquisa científica e ideias cosmológicas (“Ondas gravitacionais”, “Buracos negros”, “Viagem no tempo”).

Sobre a vida pessoal, Hawking revela aspectos que cativam o leitor: o fato de ter aprendido a ler apenas aos 8 anos, o prazer em brincar com trens elétricos e aeromodelos, a curiosidade em saber como funcionavam os diferentes mecanismos. Conta ainda da vida no pós-guerra, da relação com os pais e sobre as escolas que frequentou. Para o leitor brasileiro é particularmente interessante refletir sobre o funcionamento de um sistema educacional estritamente meritocrático, capaz de selecionar e investir nos alunos mais talentosos.

Casamentos


Chama a atenção ainda na vida de Stephen Hawking o lado familiar e os relacionamentos afetivos. Chega a incomodar a revelação de que Stephen, a pedido de sua mulher, Jane, que temia ficar viúva cedo com três filhos para criar, tenha aceitado a convivência de outro homem em sua casa. Quando considerou a situação insustentável, em 1990, decidiu sair de casa. Contratou uma enfermeira, Elaine, com quem viria a se casar. “Meu casamento foi apaixonado e tempestuoso”, escreve. Em 2007, ele se divorciou de Elaine e passou a viver sozinho, com o apoio de uma governanta. A saúde de Stephen Hawking piora a cada dia, obrigando a incorporação de novas rotinas e equipamentos para mantê-lo vivo.

A vertente propriamente científica de Minha breve história é ainda mais resumida e evocativa que a de outros livros de divulgação científica escritos por Hawking. Ele recorda do processo de produção de Uma breve história do tempo e do incômodo que causou a recepção da crítica. Com milhões de exemplares vendidos em todo o mundo, o livro foi mais comentado em razão da doença de seu autor do que por suas ideias. Hawking, no entanto, confessa que ficou lisonjeado em ver seu livro comparado a Zen e a arte de manutenção de motocicletas, de Robert Pirsig, por um jornal londrino.

Ao fim de suas memórias, depois de dizer que a deficiência não foi um obstáculo sério em seu trabalho científico (até foi vantajoso ao liberá-lo de certas tarefas burocráticas, deixando tempo integral para a pesquisa), completa seu balanço reconhecendo que teve uma vida prazerosa, que o permitiu conhecer pessoas e lugares interessantes, além de fazer seu trabalho com liberdade intelectual.

E sintetiza sua trajetória na ciência: “Meus primeiros trabalhos mostraram que a relatividade geral clássica colapsava nas singularidades do Big Bang e dos buracos negros. Minhas pesquisas posteriores mostraram que a física quântica pode prever o que acontece no começo e no fim do tempo. Tem sido um período glorioso para se viver e fazer pesquisa no campo da física teórica. Fico feliz se acrescentei algo ao nosso conhecimento do universo”. Poucos homens do século 20 poderiam escrever a sentença final do balanço de Stephen Hawking.

MINHA BREVE HISTÓRIA

. De Stephen Hawking
. Editora Intrínseca, 142 páginas, R$ 19,90

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