Ecoalfabetização de adultos e crianças promove consciência ecológica e de reduz a ecoalienação

por Maurício André Ribeiro 23/11/2013 00:13
Beto Magalhães/EM/D.A Press
(foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press)
A ecoalfabetização é um dos modos de promover a consciência ecológica e de reduzir a ecoalienação. Adultos e crianças devem ser ecoalfabetizados. A ecoalfabetização de adultos é especialmente necessária para governantes e empresários, devido ao poder político e econômico de que dispõem.

Dentro de governos, frequentemente constata-se o desalinhamento e a falta de convergência nos pensamentos e nas ações de distintas áreas, que caminham na contramão de uma abordagem ecológica. Há vários exemplos disso: bancos de desenvolvimento que financiam atividades predatórias, tais como frigoríficos e pecuária na Amazônia; a redução de impostos para fontes de energia poluentes ou para modos de transporte que congestionam as cidades; a adoção de práticas destrutivas do ambiente natural na agricultura; ações de fomento à pesca com visão a curto prazo que destroem a capacidade de reprodução dos estoques pesqueiros a longo prazo; a pressão de órgãos públicos e empresas de infraestrutura viária ou de energia para escapar aos controles ambientais.

De importância fundamental é o alinhamento dos dirigentes de bancos públicos e de desenvolvimento com as diretrizes ecológicas, liberando crédito para empreendimentos licenciados ou de acordo com a legislação ambiental, evitando que o capital seja investido em projetos ambientalmente destrutivos. A concessão de crédito bancário ecologicamente responsável exige consciência ecológica, para que os bancos renunciem a oportunidades de negócios social ou ambientalmente destrutivas.

A ecoalfabetização dos responsáveis pelas licitações e contratos públicos pode poupar recursos públicos e integrar considerações ambientais na seleção dos fornecedores de produtos e serviços. Ecoalfabetizar os governantes é capacitá-los para aplicar os conhecimentos das ciências ecológicas e a sabedoria da consciência ecológica em suas ações.

O divórcio entre conceitos e práticas de ecologia e de economia está na origem da crise ecológica atual. Poucos gestores públicos incorporaram em sua formação a consciência ecológica. Ainda é fragmentada e deficiente a formação ecológica em universidades e nas escolas de governo e de administração.

A ecoalfabetização nas escolas e institutos de pesquisa econômica aplicada ajudaria a redefinir conceitos de riqueza. É preciso colocar as ciências econômicas em seu devido lugar, como partes das ciências ecológicas. Merecem investimento as escolas de governo e de administração, pois da ciência e consciência ecológica de gestores públicos emanam decisões ecologicamente responsáveis (ou irresponsáveis).

A mudança de mentalidades e de modelos mentais resultante da ecoalfabetização em todas as áreas dos governos poderia facilitar a articulação intersetorial, a adoção de agendas bilaterais da área ambiental com ministérios ou secretarias com potencial de conflitos e disputas – agricultura, desenvolvimento agrário, ciência e tecnologia, desenvolvimento industrial, transportes, energia e mineração.

As ciências ecológicas se desdobram em múltiplos campos, da ecologia política à social, da ecologia energética à ecologia industrial. A ecoalfabetização precisa levar em consideração o amplo e variado espectro das ciências ecológicas e recusar o enfoque reducionista que enxerga a ecologia apenas em sua dimensão das ciências biológicas, que estuda a interação de bichos e plantas com o seu ambiente. Ela também precisa informar sobre as relações ecológicas harmônicas, como a simbiose e o comensalismo, e desarmônicas, como o parasitismo e a predação, por exemplo.

A ecoalfabetização também é necessária em cada formação profissional e nos níveis básicos da educação. No campo da comunicação e do jornalismo, é relevante ecologizar todas as editorias, pois os meios de comunicação constituem veículos eficazes para promover a ecoalfabetização.

Lição


A longo prazo, a ecoalfabetização precisa se incorporar na formação das novas gerações. No livro Alfabetização ecológica – A educação das crianças para um mundo sustentável (Cultrix 2006), Fritjof Capra e um grupo de professores e pesquisadores americanos constatam que há deficiências no conhecimento sobre a ecologia. Propõem que, por meio da alfabetização ecológica, as crianças se familiarizem com os conceitos e as práticas ecológicas e compreendam o impacto que seus hábitos e estilos de vida provocam sobre o ambiente natural e social.

Entre as experiências inspiradoras realizadas na Califórnia está a de repensar e colocar em prática alternativas para a merenda escolar. Podem-se rastrear, então, todas as etapas do processo produtivo e das tecnologias que possibilitam que a merenda chegue ao prato das crianças. Os alimentos produzidos localmente reduzem os gastos de energia envolvidos nos transportes de longa distância. É valiosa a capacidade de produzir localmente os alimentos. As crianças visitam os locais de cultivo de hortas e componentes de sua merenda, conhecem o quanto de água, de terra, de agrotóxicos, de sementes, de tecnologias é necessário para produzi-la; acompanham seu transporte, processamento, preparo na cozinha; tomam conhecimento das perdas de alimentos ao longo do sistema de abastecimento alimentar, até o seu prato.

Todo o ciclo do alimento, de sua origem a seu destino final, pode ser conhecido do ponto de vista técnico e científico, bem como do ponto de vista econômico. Também pode ser estudado o seu trânsito pelo corpo, como os dejetos humanos são tratados nos sistemas de esgotos e devolvidos ao sistema hídrico. Nas experiências realizadas na Califórnia, a reflexão sobre a merenda escolar levou a decisões de privilegiar alimentos produzidos localmente, de forma orgânica, o que gerou aumento de renda e de emprego para os produtores rurais nas proximidades das escolas.

A ecoalfabetização pode formar a consciência ecológica de adultos e de crianças, atuais e futuros governantes e dirigentes de empresas.

. Maurício Andrés Ribeiro é autor de Ecologizar, Tesouros da Índia e Ecologizando a cidade e o planeta.

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