"Coletivo" tenta explicar onda de manifestações no Brasil em livro

A ideia dos organizadores de Cidades rebeldes... é ampliar o debate iniciado pelo Movimento Passe Livre (MPL), que também assina um artigo

03/08/2013 00:13
Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
Jovens foram às ruas questionar gastos com eventos esportivos (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Um verdadeiro "coletivo" assina o livro Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil (Boitempo/Carta Maior). Os autores têm um desafio pela frente: procurar explicar os emblemáticos protestos que desde junho vêm chacoalhando o país. A coleção Tinta vermelha remete às reflexões do pensador esloveno Slavoj Zizek a respeito do Occupy Wall Street, nos Estados Unidos.

Além do próprio Zizek, os artigos são assinados por David Harvey, Mike Davis, Raquel Rolnik, Ermínia Maricato, Paulo Arantes, Jorge Souto Maior, Mauro Iasi, Silvia Viana, Ruy Braga, Lincoln Secco, Leonardo Sakamoto e João Alexandre Peschanski.

A ideia dos organizadores de Cidades rebeldes... é ampliar o debate iniciado pelo Movimento Passe Livre (MPL), que também assina um artigo. Os temas são variados: direito ao transporte público, mobilidade urbana, manifestações e violência, partidarismo, luta política e democracia. O coletivo Mídia Ninja, atuante na internet e responsável pela transmissão dos protestos ao vivo, contribui com registros fotográficos.

De acordo com a urbanista Raquel Rolnik, que assina a apresentação do livro, os fatos recentes observados no país fizeram renascer utopias, abrindo espaço para a discussão de novas formas de articulação. "No campo imediato da política, o sismo introduziu fissuras na perversa aliança entre o que há de mais atrasado/excludente/prepotente no Brasil e os impulsos de mudança que conduziram o país na luta contra a ditadura e o processo de redemocratização; uma aliança que tem bloqueado o desenvolvimento de um país não apenas próspero, mas cidadão", afirma ela.

O MPL – São Paulo detalha seus objetivos, vinculando a questão da tarifa do transporte público ao direito à cidade propriamente dito. Cartazes, faixas e palavras de ordem exibidas durante passeatas explicitaram a aliança do direito à mobilidade com temas relativos à questão urbana no Brasil. Com isso, estão na berlinda megaeventos priorizados por governantes – chancelados pelos poderes Executivo e Legislativo e, por vezes, pelo Judiciário.

"Os capitais se assanham na pilhagem dos fundos públicos deixando inúmeros elefantes brancos para trás", destaca Ermínia Maricato. A reforma urbana voltou à ordem do dia, depois de frequentar a pauta nos anos 1980/1990 e ser ofuscada pelo modelo de desenvolvimento urbano neoliberal, "voltado única e exclusivamente para facilitar a ação do mercado e abrir frentes de expansão do capital financeirizado, do qual o projeto Copa/Olimpíadas é a expressão mais recente e radical", destaca a especialista.

Os artigos não se limitam a São Paulo, palco das primeiras manifestações em junho. Felipe Brito e Pedro Rocha de Oliveira analisam a conjuntura carioca, demonstrando a relação entre o projeto excludente de cidade e a militarização dos territórios populares. O livro também oferece reflexões sobre a conexão entre os protestos brasileiros e aqueles assistidos em Istambul, assim como a Primavera Árabe, o Occupy Wall Street e os Indignados da Espanha. Busca-se compreender o que há em comum entre as ruas brasileiras e as praças Tahrir (Egito), do Sol e Catalunha (Espanha), Syntagma (Grécia) e Taksim (Turquia).

De acordo com os autores, a república representativa nascida no século 18 dá sinais de profundo esgotamento. O desafio é compreender e assimilar formas horizontais de decisão, que vão de encontro a partidos, comitês centrais, parlamento e governantes.

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