Di Souza canta os vários jeitos de existir no disco 'Bloco da Saudade'

Destaque dos blocos Então, Brilha! e Pisa na Fulô, compositor reage com 10 canções autorais à pandemia que acabou com o carnaval de 2021

Mariana Peixoto 01/05/2021 06:00
Lucca Mezzacapa/divulgação
Di Souza diz que o novo disco é fruto da energia criativa que sentiu durante o período de isolamento social (foto: Lucca Mezzacapa/divulgação)

O músico e professor Di Souza, de 31 anos, começou 2020 com tudo. Boa parte dos 4,5 milhões de foliões que passaram o carnaval em Belo Horizonte esteve nos blocos capitaneados por ele – Então, Brilha!, Pisa na Fulô e Abre-te Sésamo. Sua escola de percussão, a Circular, na Floresta, iniciou o ano com 340 alunos.

Então, chegaram março e a pandemia da COVID-19. “Bloco da Saudade”, segundo álbum de Di Souza, é a resposta dele ao isolamento social. Nesse período, perdeu quase dois terços dos alunos. No “não carnaval” de 2021, chorou os quatro dias. Mas não é um disco de derrota, pelo contrário. Como diz a primeira faixa, “Sem jeito”, Di Souza encontrou vários jeitos de existir.

“Sou aglomerado não só no carnaval, mas em todas as outras atividades, na escola de música, nos shows. Como fico o tempo inteiro mexendo com gente, minha criatividade acabou se encontrando no campo da composição”, ele diz.
INÉDITAS 

“Bloco da Saudade”
traz 10 canções inéditas e autorais, todas compostas em 2020. É seu primeiro disco desde 2015. “Como tive que ficar em casa, pude fazer o disco. Inclusive, boa parte da gravação foi feita de maneira remota. Foi um processo bonito, em que me vi tomado por uma energia criativa grande”, conta.

O disco foi gravado com Cláudio Kiari (guitarra e violão), Marcelo Dai (bateria), Camila Rocha (baixo), Thiago Correa (teclado, violão e guitarra), William Alves (trompete) e Daniel Guedes (percussão). Di Souza canta, faz percussões e assina os arranjos ao lado do grupo.

A primeira canção nasceu de uma história triste. A morte de Ricardo, batuqueiro que participou de todos os grupos que Di Souza regeu, o levou a compor “Quando o bloco sair”. A mulher, Júlia, médica do SUS que está na linha de frente no combate à pandemia, inspirou “Consigo”.

“Quando chegou outubro, já tinha feito umas 20 músicas. Com o repertório pronto, vi que, sem perceber, compus músicas que refletiam o momento. Era eu tentando existir, inclusive musicalmente, já que meu primeiro álbum, ‘Não devo nada pra ninguém’ (2015), trazia uma atmosfera tropicália. Este tem outra sonoridade, meio pop, mais séria.”

Mas sem perder a leveza. Uma das canções mais solares do disco, “O aluguel venceu” (parceria com Luana Aires) retrata a dificuldade de pagar as contas no fim do mês. Neste sábado (1º/5), Dia do Trabalho, o clipe será lançado. “É homenagem à luta por moradia, principalmente neste momento da pandemia, em que a questão se tornou muito forte.”

“Bloco da Saudade” rendeu o curta-metragem de meia hora em que Di Souza interpreta as canções de forma bem-humorada, sob fundo branco com objetos que remetem ao carnaval e à pandemia.

E daqui pra frente? “Tenho a sorte e o privilégio de ter construído uma carreira ao longo da minha trajetória do carnaval”, diz. Em 2013, ainda professor de música em escolas de BH, Di Souza passou a montar suas próprias turmas. Começou com cinco alunos. Os anos passaram e as turmas cresceram. “Em 2017, vi que tinha criado um método de percussão, daí fundamos a escola, que em 2019 estreou como bloco.”

Com a impossibilidade de dar aulas presenciais, ele criou palestras e aulas virtuais. Em setembro, com a onda verde, houve encontros presenciais. A experiência digital o levou a planejar um curso on-line, que deve ser viabilizado num futuro próximo.

“Perdemos muitos alunos e estamos segurando o rojão, pois tenho uma equipe de 10 pessoas na escola, além do espaço físico, que é alugado. É uma batalha”, revela. Mas Di Souza não arrefece. Pretende lançar em julho 15 vídeos que os alunos gravaram em casa com músicas de artistas de BH.

Entre 13 e 16 de fevereiro deste ano, durante o carnaval que não houve, Di Souza ficou em casa. “Chorei muito na cama. Mas também vesti as roupas dos blocos com os quais estaria na rua e fiz um vídeo em homenagem a cada um.” Com o estandarte do Bloco da Saudade, foi a cinco lugares da cidade que o fizeram carnavalesco, como as praças da Estação, no Centro, e Pisa na Fulô, no Carlos Prates.

“Tenho tentado alimentar o carnaval dentro de mim, resgatar todas as memórias. O carnaval é uma das maiores coisas do mundo, mas infelizmente a pandemia conseguiu ser maior do que ele”, diz.

CHAMA 

Dá para imaginar a folia em 2022? “Estamos num estado de suspensão. Tento alimentar a chama da esperança. Sem negar o tamanho da catástrofe, inclusive com o governo Bolsonaro, tenho um lado romântico que acredita no carnaval do ano que vem. Vou levar o repertório do Bloco da Saudade para a rua até para me despedir dele”, diz.

“Agora, tenho outro lado, mais realista, que aparece quando paro para assistir ao noticiário. Outro dia, vi um show para 50 mil pessoas na Nova Zelândia. Fiquei tão triste por estarmos tão distantes disso. Nessa hora, tendo a não acreditar no carnaval da maneira como era”, conclui.

FESTIVAL

Até a próxima sexta (7/5), as redes sociais de Di Souza vão apresentar o Festival da Saudade, com vídeos em que músicos de BH interpretam, ao violão, as canções de “Bloco da Saudade”. A programação traz Deh Muss (3/5), Thiago Correa (4/5), Marcelo Dai (5/5), Irene Bertachini (6/5) e Jennifer Souza (7/5). O conteúdo estará disponível no Instagram (disouza.cambio) e no YouTube (disouza). Também no YouTube ficará disponível o curta “Bloco da Saudade”.

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“BLOCO DA SAUDADE”
.Álbum de Di Souza
.Independente
.10 faixas
.Disponível nas plataformas digitais


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