Diante da crise, o que podemos aprender com a moda?

Diretor-criativo do Minas Trend, o estilista Ronaldo Fraga aponta os principais desafios para o setor fashion dar a volta por cima e voltar a crescer no país: 'a chave é a criação com alma'

por Laura Valente 09/04/2019 16:37
Sebastião Jacinto Jr./divulgação
(foto: Sebastião Jacinto Jr./divulgação)
Ronaldo Fraga tem uma visão ampla da moda. Tanto que não se furta em adotar viés político nas criações e desfiles da marca de mesmo nome. No Minas Trend, evento em que assina a direção criativa, não é diferente. Isso por que, para ele, moda é comunicação, arte, forma de expressão. Morre a cada estação para se reiventar e renascer na seguinte. E tem como caráter importante falar de uma época, do ser social, da existência. A roda precisa girar.
  
Não por acaso, o criador levou um balneário para a 24ª edição do salão de moda mineiro, que segue até o dia 12 no Expominas e tem como tema Em Dias de Sol.  Na cenografia, boias coloridas, piscinas de mentirinha e cadeiras de praia remetem ao clima de refresco e a tempos mais oxigenados. Aqui,  ele destaca por que vale a pena optar pelo otimismo e acreditar na criação com alma para levar a indústria da moda à retomada do crescimento. “A moda é pensamento, autoestima. Se olharmos as duas últimas décadas, a moda brasileira esteve coberta por um esmalte, em muito inspirada em outros países. Agora, diante da crise e da China – que vem fazendo roupa muito bem -, finalmente vem chegando ao mundo real. O setor  passa por mudanças drásticas. Para começo de conversa, deve dialogar e se abrir para todos os públicos e frentes. A palavra de ordem é democratizar”, dispara.

Fraga reforça que diante de um cenário de estagnação, a apatia impera. E passa a existir um recuo no consumo. Mas lembra que é necessário “subir o paredão”. A abertura do Minas Trend para dialogar com outros setores da indústria e de serviços é uma resposta a um cenário que não pode e nem deve ficar engessado. “A moda não para nunca, e o que vemos aqui nesta edição do Minas Trend é apenas a ponta do iceberg. Ou seja, há muito a ser feito num momento em que o sucesso depende de todos nós”. 

Confira um pingue-pongue com o criador:


Marcos Viera/EM
(foto: Marcos Viera/EM)
 
Quais são os desafios para a temporada primavera-verão'2020?
Imprimir otimismo nesse terreno árido que o país está vivendo. Temos visto uma apatia generalizada em todos os cantos e o lançamento de uma estação sempre foi um desejo de olhar para o futuro e acreditar que o novo virá.   

Como lidar com esse desafio nesta edição do Minas Trend? 
O tema Dias de Sol foi pensando diante da paixão dos mineiros pelo mar. Nossa ideia foi criar cinco dias de praia em Minas. Mas essa praia é um desejo por oxigênio, por dias mais afetuosos, por festa, por paixão. Minha sugestão é que esse conceito aparecesse em todos os lugares. Então, no desfile de abertura, a Zélia Duncan e o Jaques Morelenbaum, cantando Milton Nascimento, que está no mesmo lugar de Drumond e Guimarães Rosa, que são universais. E em um cenário de um cais perdido no mar, no fundo a carcaça de um barco naufragado há muito. E isso tudo para falar de reconstrução, de reivenção. Por que a moda nos ensina isso muito bem. É um reflexo do tempo. Quando o tempo está ruim ela tem justamente que trazer o inverso. Foi isso que Dior fez no pós- Segunda Guerra Mundial. E é isso que temos que fazer agora. 

Diante da ameaça China e do cenário de recessão, o que os criadores precisam fazer para dar a volta por cima? 
Nós temos um frescor e uma jovialidade no olhar. Nós temos a nossa relação com cores, com estampas, que é muito forte. Temos uma força de trabalho, que é muito grande. E vamso ter que correr do prejuízo, investindo em gestão e em alma de marca. A história das marcas desalmadas e mudas não rola mais.