Desafio: grife propõe um novo olhar para os tecidos

Quatro jovens designers de Belo Horizonte são desafiados a desenvolver coleção cápsula para a Plural com sobras e apresentam diferentes possibilidades para materiais sem uso

por Celina Aquino 11/12/2017 10:38

Lu Ananias/divulgação
Look Hellen Formaggini (foto: Lu Ananias/divulgação)

É urgente encontrar soluções para as sobras das fábricas. A Plural, acostumada a fazer doações a entidades beneficentes, decidiu partir para uma ideia criativa e colaborativa. Tecidos parados no estoque foram disponibilizados a quatro designers da galeria de moda A.M.D.O, que desenvolveram juntos uma coleção cápsula lançada na última quarta-feira. Cada um levou um pouco do seu trabalho autoral para o verão da marca de Belo Horizonte especializada em malhas. Intervenções em estampas, bordados manuais e técnicas de moulage são alguns dos destaques.


A cada coleção, a Plural costuma trabalhar com mais de 30 tipos de matéria-prima, que são compradas de acordo com a previsão de venda. Só que, quanto maior a aposta na mercadoria, maior a probabilidade de sobra. Por isso, lá na fábrica o estoque está cheio de tecidos lisos, que são os mais vendidos. “Chega num ponto em que não temos capacidade de armazenamento, mas são tecidos super saudáveis e atemporais, que às vezes não conseguimos aproveitá-los na outra coleção porque o fornecedor não tem mais dele ou porque não dá para relançar uma estampa”, informa a estilista Gláucia Fróes, que coordenou o projeto ao lado da diretora-criativa da A.M.D.O, Rafaela Ianni.


Os designers tiveram liberdade para selecionar os tecidos. Depois disso, eles apresentaram os desenhos técnicos para Gláucia, que acompanhou todo o processo de produção. “Fui adequando a criação aos tecidos, porque, como eles são novos no mercado, era importante mostrar o que funciona e o que não funciona”, detalha. Ao todo, são 30 modelos. A estilista teve o cuidado de dar a cara da Plural a cada peça, na modelagem, acabamento e em outros detalhes como o abotoamento, além de manter a proposta da marca de oferecer uma roupa confortável. Ao mesmo tempo, garantiu que todos os itens da coleção cápsula, apesar dos diferentes criadores, tivessem a mesma identidade.


As malhas, como era de se esperar, predominam nas peças. Viscose, crepe, algodão, tricoline, bandagem e mistura de tela com neoprene são alguns dos materiais. “A coleção não é colorida demais, tudo está mais para tons neutros como preto, cinza, off white e caqui. Temos estampa xadrez, malhas listradas e alguns bordados na cor prata dão uma iluminada nas peças”, detalha Gláucia. Hellen Formaggini é a autora bordados, enquanto Matheus Couto chama atenção pelas técnicas de moulage. Já a dupla Camila Interlandi e Gui Legnani fez pinturas a mão para mudar a cara das estampas.

Lu Ananias/divulgação
Look Camila Interlandi e Gui Legnani (foto: Lu Ananias/divulgação)

SEM DESENHO A partir do trabalho de moulage, o designer Matheus Couto desenvolveu uma modelagem ampla, que confere uma maior mobilidade para o corpo, seja de homem ou mulher. “Raras vezes faço um desenho. Geralmente começo pelo tecido e ele me diz o tipo de peça que vai surgir. Gosto muito de processo de dar nova forma ao corpo. A calça saruel é um exemplo. Quando você coloca o gancho quase lá no chão, propõe um outro shape.” A paleta de cores oscila entre preto, branco e off white, que combina com a estética que ele segue no seu trabalho autoral. Entre as peças, estão macacão saruel, cropped com manga oversized, colete com abertura lateral e blusa com pregas internas.


A estamparia foi o foco da criação de Camila Interlandi e Gui Legnani. “Apropriamo-nos de uma gama de tecidos estampados para interferir manualmente sobre esse trabalho de superfície, mascarando as imagens originais com pinceladas manuais. A intenção era permitir que o nosso gestual transparecesse e, por isso, tudo foi realizado de forma bastante espontânea, ainda que tivéssemos princípios estéticos que nos guiavam”, explica Camila. A dupla utilizou pincéis de variados tamanhos e um borrifador de forma que o resultado fosse imprevisível. Dessa forma, eles criaram peças únicas.

 

Brilho nos olhos

 

Lu Ananias/divulgação
Look Matheus Couto (foto: Lu Ananias/divulgação)
A galeria de moda A.M.D.O tem a missão de conectar jovens designers de Belo Horizonte com o mercado. “Sempre me deparei com muita potência criativa e pouco recurso financeiro. Por que não juntar marcas com sobras de tecido e mão de obra com a criatividade desses jovens designers?”, diz a diretora-criativa Rafaela Ianni, que se surpreendeu com o resultado do trabalho colaborativo. Além da qualidade do produto em si, ela acredita que o mais incrível de parcerias como essa é a troca de experiências. No fim das contas, o grupo desenvolveu a coleção com a Plural, e não para a Plural.


Para Gláucia, o trabalho com jovens profissionais leva frescor e ideias criativas para a marca. “Acredito muito nesse projeto. Você sai da caixa e consegue olhar os tecidos em vários ângulos. Não fica só naquilo que estava previamente definido. Também foi muito gratificante ver os olhos dos meninos brilharem na hora em que o produto ficou pronto.” A estilista defende que a ideia tem que se espalhar, porque todos precisam ajudar de alguma maneira. Está na hora de diminuir os resíduos, evitar o desperdício e tudo isso depende de quem direciona o mercado da moda.


O plano agora da A.M.D.O é identificar outras fábricas com sobras de tecido para propor novas parcerias com outros designers. “Não tem como mais fingir que nada acontece. Não falo só de sobras de coleção, mas o descarte de roupa que existe por causa do excesso de consumo. Precisamos olhar para frente e pensar como transformar isso com o que está ao nosso alcance. O projeto tende a beneficiar todos”, pontua Rafaela. As peças da coleção Plural + A.M.D.O serão vendidas apenas para o varejo na loja da marca e no site da galeria de moda, a partir do dia 6 de dezembro.