À frente de conceituada padaria da cidade, Paula Bonome não esconde receitas

Para ela, um bom pão vai muito além dos ingredientes: depende especialmente das mãos de quem faz

por Celina Aquino 01/04/2018 10:15
Edésio Ferreira/EM/D.A Press
Folha de outono (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )

Entre uma fornada e outra, Paula Bonome dá uma pausa para a entrevista e aproveita para tomar um café. No meio da conversa, a pergunta sobre o segredo de um bom pão a deixa pensativa e a resposta não é conclusiva. “Talvez a fermentação natural, mas nem todo pão com levain é bom. Acredito na união de vários fatores.” Da mesma forma, a posição da Casa Bonomi como padaria de referência em Belo Horizonte há duas décadas não se explica facilmente. Produção artesanal, receitas clássicas misturadas a novas ideias e a constante busca por melhorias são alguns dos motivos.


A tarefa de escolher o que comer não é fácil diante de uma vitrine deliciosamente cheia. O croissant continua a ser um dos mais procurados. Paula percebe que não existem na cidade tantas opções de pão de massa folhada com manteiga, como manda a receita clássica francesa. Na casa, ela oferece croissant tradicional, de chocolate, amêndoas e uma versão salgada de presunto com queijo. A baguete, que está sempre em evolução, também é muito conhecida. “Não que o nosso produto não seja bom, mas nem acho que chegamos ao ideal. Ainda temos um caminho a percorrer”, diz, com os pés no chão.


Para quem tem vontade de sair do tradicional, a dica é procurar saber o que a dona da Casa Bonomi tem inventado, porque ela não economiza em novidades. “Não consigo imaginar que vou fazer a mesma coisa o ano todo, ainda mais com a riqueza de produtos a que temos acesso. É uma oferta irresistível, que me leva a fazer muitas experiências”, comenta Paula, que tenta sempre privilegiar ingredientes da estação. No último mês, por exemplo, ela lançou o pão da quaresma, que acabou bem antes do previsto: massa tipo baguete com castanha de pequi (retirada de dentro do caroço da fruta) e cúrcuma. Surpreende também o folhado de castanha de caju com curry.


Como disse Paula, a fermentação natural é um dos fatores que levam a um bom pão. O preparo acaba sendo mais demorado, pois deve-se dar tempo para a massa crescer, mas o resultado não poderia ser melhor. “Além das vantagens em sabor, textura e cheiro, acho que o pão com levain é de mais fácil digestão”, observa. A dona da padaria ainda garante a qualidade modelando a mão os pães. Sobre a decisão de manter o processo de fabricação artesanal, ela responde: “Aprendi assim.” Paula não gosta da ideia de quase não colocar a mão na massa, então só trabalha com masseira e forno.

Edésio Ferreira/EM/D.A Press
Mil folhas (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )

INSPIRAÇÃO FRANCESA Os pães dividem espaço na vitrine com receitas mais açucaradas como brioche de nozes e caramelo, danish de passas e galette de reis (massa folhada recheada com creme de amêndoas). Na vitrine dos doces, destaque para o de nome folhas de outono (biscoito de amêndoas e mousse de chocolate enfeitado com folhas de chocolate) e doces tradicionais franceses como canelé (bolo tipo pudim de baunilha), mil folhas e ópera. Vale experimentar o bolo de especiarias (assumidamente uma das paixões de Paula), que mistura farinha de centeio, canela e noz-moscada.

Ravioli de queijo canastra com molho pomodoro
Edésio Ferreira/EM/D.A Press (foto: Ravioli de queijo canastra com molho pomodoro )

A padaria também serve massas produzidas artesanalmente. Paula lembra que trouxe o italiano Fabio Boschero, hoje chef de um hotel luxuoso em Roma, para ensinar a receita tradicional italiana. Então, massas secas e recheadas são feitas com farinha grano duro e muitos ovos. Entre as opções, ravioli de queijo canastra com molho pomodoro, ravioli de cherne com molho de castanhas e brodo com capeletti. Os pratos podem ser servidos a qualquer hora do dia, assim como os outros itens do cardápio, como sanduíches, saladas e ovos mexidos.

 

 

Impulsionada pela  necessidade

 

A história de Paula Bonome com a gastronomia não é nada convencional. A ex-bailarina não sabia (nem gostava) de cozinhar antes da Casa Bonomi. Abrir uma padaria foi ideia de uma amiga de São Paulo, que dizia não encontrar em Belo Horizonte pães como os da sua cidade. Na época, Paula fazia a última turnê pelo Grupo Corpo e já pensava em um recomeço. Ela aceitou o desafio, mas demorou a se apaixonar pelo novo trabalho. “Tinha uma vida muito sedutora, que era dançar e viajar, então falo que não escolhi a panificação. Aos poucos, ela foi me conquistando”, analisa.


Paula diz que a necessidade sempre a impulsionou. A falta de conhecimento não poderia ser empecilho para quem precisava mudar de vida. Por isso, a ex-bailarina não se intimidou em fazer um tour por padarias tradicionais de São Paulo, entre elas a centenária São Domingos, até hoje famosa por oferecer um dos melhores pães italianos da cidade.


No início, a Casa Bonomi tinha pão italiano, ciabata e nada mais. Com o tempo, Paula foi somando descobertas ao cardápio. Ela agradece a muitos profissionais de fora, principalmente franceses, que vieram a Belo Horizonte compartilhar técnicas e receitas. “Não tenho formação na área, então travei muitas batalhas para preencher as lacunas do conhecimento”, pontua.
Paula acredita que o sucesso da Casa Bonomi se deve a muito trabalho, com erros e acertos, para alcançar a qualidade desejada. Desde o início, o propósito era oferecer um bom pão. “Toda padaria na época era também um armazém, mas aqui se comprava pão. As pessoas sempre perguntavam: não tem manteiga ou presunto?” Não, a dona seguiu o caminho da valorização do pão e da profissão de padeiro. Hoje a casa até vende alguns produtos, como cafés e doces, mas o foco não mudou.


A padaria também caiu no gosto da cidade por ter dado uma nova chance para a esquina escura da Avenida Afonso Pena com Rua Cláudio Manoel, que virou um ambiente agradável para tomar café. No fim de semana, as mesas ao ar livre ficam lotadas. Lá dentro, está a primeira mesa coletiva de BH (talvez do Brasil), ideia inovadora na década de 1990, que Paula trouxe de Bruxelas. “O mineiro sentiu que era uma boa a proposta e me deu crédito”, atesta, visivelmente emocionada.

 

 

Bolo de chocolate com laranja confit

Ingredientes

200g de farinha de trigo; 200g de chocolate amargo; 100g de casca de laranja confit; 1 laranja; 120g de açúcar; 3 ovos; 1 iogurte natural; 50g de manteiga (em ponto de pomada); 1 colher de chá de fermento em pó; 1 colher de chá de bicarbonato de sódio; 1 pitada de sal

Modo de fazer

Preaqueça o forno a 180º C. Rale a casca de laranja e depois esprema a fruta para obter o suco. Corte o chocolate em pedaços e derreta-o em banho-maria com a metade do suco da laranja, a manteiga derretida e o sal. Misture a farinha, o fermento em pó e o bicarbonato separadamente. Junte o açúcar, os ovos e o iogurte. Misture bem. Corte as cascas de laranja em pequenos cubinhos e junte ao chocolate derretido. Junte as duas misturas e coloque em forma enfarinhada com papel-manteiga. Asse por aproximadamente 40 minutos e deixe esfriar na forma.

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