Musical revive disputa entre as rainhas do rádio Emilinha e Marlene

Espetáculo fica em cartaz durante o fim de semana no Grande Teatro do Palácio das Artes

por Ailton Magioli 14/03/2014 06:00

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Fundação Clóvis Salgado / Divulgação
'Emilinha e Marlene - As rainhas do rádio' recupera momentos importantes da música popular brasileira (foto: Fundação Clóvis Salgado / Divulgação)
Mais de meio século depois do auge da rivalidade entre as duas, na década de 1950, elas ainda conseguem manter o clima de disputa então reinante no auditório da Rádio Nacional, do Rio, onde os fãs se digladiavam em nome dos ídolos. “Já houve apresentações em que os fãs de Emilinha Borba bancavam a atriz que interpretava Marlene em cena”, relata Thereza Falcão, uma das autoras do musical Emilinha e Marlene - As rainhas do rádio, com direção de Antonio de Bonis, que Belo Horizonte assiste, em curtíssima temporada, no fim de semana.


Atração de amanhã e domingo, do Grande Teatro do Palácio das Artes, durante a temporada carioca, que durou um ano, a produção decidiu vender ingressos para plateias distintas, reservando poltronas em separado para fãs de Emilinha Borba (1923-2005) e de Marlene, que em novembro comemora 92 anos.

A briga é páreo duro, já que mesmo depois de morta a “Favorita da Marinha e da Aeronáutica,” como se tornou conhecida Emilinha, continua a disputa com “A Maior,” pseudônimo atribuído a Marlene. Escrito a quatro mãos por Thereza Falcão e Júlio Fischer, o musical reúne no elenco Stella Maria Rodrigues (Emilinha) e Beth Lamas (Marlene), além dos atores e cantores Angela Rebello, Rosa Douat, Mona Vilardo, Lenita Lopez, Dani Calazans, Ettore Zuim, Thiago Pach e Fabrício Negri.

No palco, eles estão acompanhados de banda com seis músicos, sob a batuta de Marcelo Alonso Neves. Cerca de 50 músicas que fizeram sucesso na voz das cantoras, entre marchinhas, boleros, sambas e outros gêneros estão no repertório, interpretado ao vivo. A história das cantoras é contada por meio de duas irmãs rivais, que, por ocasião da morte da mãe, entram em sua antiga casa para remexer no baú do passado, rememorando suas histórias de vida.

Indústria da rivalidade A irmã vivida pela atriz Rosa Douat é fã ardorosa de Emilinha, enquanto a interpretada por Angela Rebello é fã de Marlene. A trama se passa em um único dia, em que elas remexem os objetos guardados, revolvendo o passado, quando seguiam as duas cantoras. A autora Thereza Falcão diz ter chegado às cantoras graças a pesquisa sobre o universo musical brasileiro, no qual se deparou com uma verdadeira indústria montada em torno delas, para incentivar a rivalidade.

“Além de repertório completamente diferentes, Emilinha e Marlene tinham posturas muito distintas”, compara Thereza, interrogando-se sobre a origem da clássica disputa entre ambas, já que as cantoras não tinham nenhuma semelhança. As fontes usadas pelos autores para escrever o musical foram, principalmente, os fãs-clubes. Além do filho de Emilinha, os autores entrevistaram Marlene, que, em cadeira de rodas, vive aos cuidados do filho.

 

Forte postura feminina

A lendária rivalidade entre a carioca Emilinha Borba e a paulistana Marlene teve início em 1949, quando, patrocinada por uma cervejaria, Marlene foi eleita Rainha do Rádio, desbancando a favorita Emilinha. A disputa entre as duas sobreviveu por décadas, atingindo o auge na primeira metade dos anos 1950, na chamada Era de Ouro do rádio brasileiro, que vai dos anos 1930 aos 1950. Alimentada principalmente pela Revista do Rádio, que circulou de 1948 a 1970, a disputa entre as duas envolvia os fãs-clubes, que faziam de tudo para ver o ídolo na capa da revista.

Na opinião de Thereza Falcão, há algo da postura feminina forte tanto em Emilinha quanto em Marlene. “Mas, enquanto a primeira fazia o gênero moça de família, a nora que todos queriam, a segunda já representava uma figura meio doidona e agitada”, compara. “A postura cênica de Marlene acabou levando-a para o teatro, enquanto Emilinha fez mais cinema”, lembra. Marlene, na opinião da autora do musical, dançava de acordo com a música. “Ela foi a primeira a gravar Gonzaguinha, nos fim dos anos 1970. Já Emilinha era mais sossegada, fiel a seu público.

Ousada, Marlene foi suspensa da Rádio Nacional por usar calça comprida. “Na vida real, no entanto, era recatada”, diz Thereza. “Já a irrequieta Emilinha, que na vida pública era muito discreta, manteve caso amoroso com o filho de um ministro em segredo por mais de uma década”, recorda. Para a dramaturga, o repertório foi o grande legado deixado pelas duas. Enquanto Emilinha fez sucesso gravando marchinhas como Chiquita bacana e Mulata iê-iê-iê, além de boleros como Se queres saber, Marlene se destacou com sambas tais como Lata d’água na cabeça  e Mora na filosofia, até a moderna música brasileira, cantando de Gonzaguinha e Chico Buarque, de quem fez a Ópera do malandro.

Detalhes Em busca da essência das personagens, as atrizes Stella Maria Rodrigues (Emilinha) e Beth Lamas (Marlene) privilegiaram detalhes para compor as protagonistas do musical. “Puxei muito o timbre, valorizando os ‘erres’, a embocadura do rádio”, revela a primeira, enquanto a segunda diz ter perseguido a força da personalidade marlenista. “No palco, ela tem sensualidade e ousadia incríveis”, garante Beth Lama.

O diretor Antonio de Bonis, por sua vez, vê no musical a oportunidade de resgatar a nossa cultura. “Tratam-se de dois ícones da MPB que estavam esquecidos”, lamenta, chamando a atenção para o fato de, pela primeira vez, ele encenar musical em que uma das personalidades abordadas está viva. Anteriormente, Bonis dirigiu espetáculos dedicados a Carmen Miranda, Orlando Silva e Dolores Duran.

Palavra de especialista
Rodrigo Faour, pesquisador e produtor musical


POR QUE VER


“Emilinha e Marlene – As rainhas do rádio é um dos melhores musicais feitos no Brasil sobre artistas da MPB. Ao saírem, as pessoas terão a perfeita dimensão da importância das duas artistas enfocadas – no caso duas cantoras de imensa popularidade no Brasil, especialmente do fim dos anos 1940 à primeira metade dos anos 1950. No geral, Emilinha era mais tradicional e popular, e Marlene mais vanguardista. Contudo, na vida pessoal, isso se invertia um pouco. A primeira era mais desbocada e irreverente, e a segunda mais pudica, embora mais articulada e politizada – e, por isso mesmo, conseguiu ter uma sobrevida artística a partir dos anos 1970, enquanto a primeira ficou mais apagada na mídia a partir de então. Até isso os autores conseguiram retratar na peça. Recomendo com louvor e entusiasmo, pois raras vezes vi montagem tão pertinente e honesta sobre artistas importantes de nossa cultura”.

 

 

EMILINHA E MARLENE  AS RAINHAS DO RÁDIO
Sábado, 15/3, às 20h30, e domingo,16/3, às 19h. Grande Teatro do Palácio das Artes, Av. Afonso Pena, 1.537, Centro. Ingressos: Plateia 1: R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia-entrada); plateia 2: R$ 90 (inteira) e R$ 45 (meia); plateia superior: R$ 50. Classificação etária: 14 anos. Informações: (31) 3236-7400.

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