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Exposição em BH celebra 60 anos da artista Andrea Lanna


Os 35 anos dedicados à arte, como pintora, gravadora, escultora e professora, tornaram Andrea Lanna mais serena em relação ao próprio trabalho, mas não menos inquieta. A aparente contradição pode ser explicada pelo tempo. A maturidade de sua obra está refletida na disciplina e na insistência do gesto de traduzir em pinturas e esculturas uma pesquisa formal que remonta à década de 1980. No entanto, com toda a bagagem decorrente de sua longa trajetória, seu trabalho ainda expressa uma atitude de busca e de risco. Esse impulso criativo pode ser visto na exposição Calendário, que ocupa a galeria de arte do Centro Cultural Minas Tênis Clube e celebra também os 60 anos da artista.

São quatro séries que se complementam e mostram o vigor da pintura da artista, em montagem cuidadosa realizada em parceria com Roberto Bethônico, responsável pela direção artística, e Marcelo Drummond. Em três delas nota-se a recorrência de formas vegetais, bastante orgânicas, em que o exercício da repetição e do gesto se faz notar ao ponto de ganharem autonomia e se distinguir umas das outras. Na primeira série, há 14 pinturas em telas grandes (1,20m x 0,80m), complementadas por outras sete, de dimensões variadas (2m x 0,40m, 1,20m x 0,80m e 0,50m x 0,60m), em que as formas, sempre vermelhas, emergem de fundos azuis, trabalhados em manchas aguadas e sobrepostas em campos de escrita de diferentes caligrafias. A segunda série, de pintura sobre papel, explora a repetição das formas botânicas pintadas em vermelho, mas sobre fundo branco, destacando o gestual e criando um vocabulário particular.
Um conjunto de quatro esculturas em bronze faz um contraponto às pinturas, mas dão tridimensionalidade ao material orgânico do conjunto. A quarta e última série é composta por 150 pequenos quadros (0,22 x 0,33m), com dois campos de cor cada um e montados em dois grandes conjuntos, em um exercício formal que representa uma nova busca na trajetória da artista.

Desde a década de 1980, quando toda uma geração se dedicou à renovação e à pesquisa da pintura, Andrea Lanna vem desenvolvendo uma obra que transita entre o figurativo e o abstrato, com especial dedicação à cor e aos elementos gráficos. A artista, também professora da Escola de Belas-Artes da UFMG, conta que seu trabalho se reencontra no tempo, surpreendendo-se em reconhecer elementos que julgava esquecidos. “O figurativo e o abstrato são elementos que vão e voltam, mas a cor sempre teve uma presença muito grande, é um grande motor da minha pintura”, conta. No entanto, seu trabalho transita por vários meios, passeando por instalações com panos, esculturas ou cerâmica, gravura, mas é na pintura que sua pesquisa encontra maior expressividade.

A circularidade dos temas é também transparente no uso de cores, sobretudo o vermelho que domina as séries de formas vegetais, ora sobre o azul – conferindo uma ideia de ambientes aquáticos – ora sobre o puro branco, acentuado pela montagem e pelo espaço da galeria, com piso, teto e paredes brancos. A busca pelas formas, diz a artista, remete à circularidade do barroco, às palmas de Sabará que ela admira, aos mandacarus e abricós-de-macaco, além de um flerte com a arte popular. Ela admite que a tentativa é de retratar essa organicidade, mas que, no ato, “sai tudo diferente”, descolando-se das referências e ganhando autonomia em contornos cheios de sensualidade.

Sua pesquisa se desenvolve tanto nas questões formais como no acentuado exercício com a cor que a artista diz ser um impulso imperioso.
“Eu mais me entrego do que direciono”, diz sobre seu fazer artístico. O uso da escrita e de palavras em seu trabalho acentua a característica gráfica e seu elo com a formação de gravurista. São massas de palavras, com diferentes caligrafias, que constroem campos de cor e sombras, manchas que envolvem os elementos principais das pinturas. No conjunto de pinturas sobre o branco, nota-se a composição de um vocabulário, em variações de formas que insistem no mesmo gesto e na mesma busca.

Para ela, o ato de pintar é exercício que lhe devolve à superfície, lhe faz se sentir ligada ao concreto. A prática diária de lecionar e pintar, no caso de Andrea Lanna, é levada ao extremo e se reflete de maneira vital nesse conjunto de obras. A exposição foi nominada Calendário em função do processo de trabalho, em que ela realizou pinturas diariamente por vários meses, mantendo uma disciplina rigorosa. Os 150 quadros, expostos em dois grandes painéis, sinalizam um diálogo com a geometria, mas a gestualidade expressa nas fortes pinceladas traz de volta a organicidade tão característica de seu trabalho. Ao falar sobre o fazer artístico, Andrea não distingue o ato de lecionar – atividade de décadas – e o de criar obras.
“Tenho uma urgência, uma necessidade de trabalhar”, afirma. Percebe-se em sua postura, e isso é claramente refletido em seu trabalho, uma coerência de quem persegue uma verdade só possível de ser traduzida pela arte. “Pintar é um ato de reverência, é uma entrega”, resume.


CALENDÁRIO
Exposição de Andrea Lanna. Galeria de Arte do Centro Cultural Minas Tênis Clube (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes, (31) 3516-1111). De terça a sábado, das 10h às 20h; domingos e feriados, das 11h às 19h. Entrada franca..