Cientistas descobrem como frear avanço da doença de Huntington

Incurável, o distúrbio atrofia o cérebro, afetando habilidades mentais

por Bruna Sensêve 30/12/2014 14:00
De origem genética, a doença de Huntington, na maioria das vezes, apresenta-se como um distúrbio do movimento, com deficits cognitivos e sintomas psiquiátricos no início da vida adulta. É inexplicavelmente progressiva e os pacientes morrem geralmente dentro de 20 anos após o surgimento dos sintomas. Tem como principais características neurológicas a atrofia do cérebro e a destruição progressiva dos neurônios. Os mecanismos responsáveis pelo problema continuam a intrigar cientistas; e a falta de tratamentos efetivos, médicos e pacientes.
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Pesquisadores do Centro de Genética Neurocomportamental, ligado ao Instituto Semel para Neurociência e Comportamento Humano da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, podem ter encontrado a luz no fim do túnel. Artigo publicado por eles na revista científica Science Translational Medicine mostra que a redução de efeitos de uma proteína pode proteger contra a morte de células cerebrais. A equipe, liderada pelo pesquisador Xiao-Hong Lu, afirma que os resultados são suficientes para estimular mais investimentos na investigação do uso de inibidores dessa molécula, a ataxia-telangiectasia mutada (ATM).

Terapias como essa já foram usadas contra o câncer, mas a proposta de agora é um redirecionamento para o desenvolvimento de uma possível medicação para a doença de Huntington. Por conta desse distúrbio neurológico, fragmentos mutados da proteína Huntington (mHtt) coagulam e entopem as células nervosas do cérebro, prejudicando o movimento e a capacidade cognitiva. “Assim, uma questão-chave da pesquisa é determinar se há uma janela terapêutica para a inibição farmacológica da ATM que seja segura e eficaz como tratamento”, afirma Xiao-Hong Lu. Segundo ele, o estudo fornece uma prova de conceito de que os inibidores dessa proteína podem reduzir toxicidades celulares presentes nas mutações de Huntington em modelos animais e de células cultivadas in vitro.

Para chegar a esse resultado, o time de cientistas investigou o caminho da sinalização da ATM, que tem papel central na reparação de danos do DNA. Doenças neurodegenerativas associadas ao envelhecimento, incluindo a doença de Alzheimer e a de Huntington, geram consistentemente marcadores elevados de danos no DNA. Ainda não está claro, no entanto, se esses defeitos são mera consequência ou contribuem ativamente para os processos das enfermidades. Em laboratório, Xiao-Hong Lu descobriu um aumento anormal na atividade de sinalização da ATM em células da doença de Huntington tanto em camundongos modificados geneticamente para ter a enfermidade quanto no tecido cerebral de pacientes analisados depois de mortos.

A redução de sinalização da ATM por manipulação genética ou por uso de inibidores diminuiu a toxicidade da proteína em todos os experimentos. “Uma vantagem de direcionamento da ATM para o mal de Huntington é a disponibilidade existente de inibidores de ATM relativamente potentes e específicos”, reforça o líder da pesquisa. “Dado que esses inibidores não foram usados antes no tratamento de condições cerebrais in vivo, estudos futuros são necessários para determinar se e como outros inibidores da ATM quimicamente otimizados, com propriedades farmacocinéticas cerebrais adequadas, podem ser usados para a administração crônica em modelos animais com a doença”, acrescenta.

CÉREBRO MAIS NOVO
Para Çagla Eroglu, professora assistente de biologia celular na Escola de Medicina da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, o trabalho da equipe de Xiao-Hong Lu e um divulgado por ela recentemente representam os principais avanços na área neste ano, com grandes perspectivas para não só um tratamento, mas a inibição da progressão da doença no momento certeiro. Em julho, ela publicou no Journal of Neuroscience um estudo mostrando que a mesma proteína, quando mutada na doença de Huntington, é crítica para as ligações cerebrais no início da vida.

As descobertas somaram-se à crescente evidência de que outras doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer, se enraízam durante o desenvolvimento precoce. “O estudo é interessante porque significa que, se entendermos que os erros estão em desenvolvimento original, podemos ser capazes de interferir na primeira fase da doença, antes que ela apareça” afirma Eroglu.

Em anos anteriores, a equipe liderada por ela procurou os atores moleculares que estavam envolvidos na formação de novas conexões, ou sinapses, durante o desenvolvimento inicial do cérebro de camundongos quando se depararam inesperadamente com a proteína huntingtina (Htt), presente em todo o corpo e responsável por formar coágulos nos neurônios de pessoas com Huntington. “Ela tinha sido implicada em certas funções celulares e disfunções sinápticas em Huntington, mas a possibilidade de que a kHtt esteja desempenhando um papel direto na formação de sinapses não foi explorado”, garante Eroglu.

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Origem
Bastante parecido com a doença de Huntington , a ataxia-telangiectasia também é hereditária e afeta tanto o sistema nervoso quanto o imunitário. As anomalias no cerebelo, uma parte do encéfalo que controla a coordenação, causam o aparecimento de movimentos descoordenados. Essa ataxia costuma surgir quando a criança começa a andar, mas pode aparecer até os 4 anos. Verificam-se dificuldades na fala, debilidade muscular e, por vezes, atraso mental. As telangiectasias, dilatações dos capilares, são muito evidentes na pele e nos olhos e desenvolvem-se entre 1 e 6 anos de idade. Em geral, são mais evidentes nos olhos, nas orelhas, nas asas do nariz e nos braços.