A cena é clássica: você está passeando com seu cachorro em um parque ou mesmo no jardim de casa, e de repente, ele para e começa a mastigar tufos de grama com vontade. A primeira reação de muitos tutores é a preocupação: “Ele está doente? Está com dor de barriga?”.
A verdade é que esse comportamento, embora pareça estranho para um animal carnívoro, é extremamente comum. Na grande maioria dos casos, não é motivo para pânico. Veterinários e especialistas em comportamento animal explicam que esse instinto pode ter raízes profundas na evolução do seu pet.
Esse ato de comer itens que não são alimentos é conhecido tecnicamente como “pica” ou “alotriofagia”. No caso específico da grama, ele raramente indica um problema grave de saúde, mas é fundamental entender os motivos por trás disso e, principalmente, saber quando esse hábito inocente se torna um sinal de alerta.
Por que os cachorros comem capim?
A ciência ainda não tem uma resposta única e definitiva, mas veterinários trabalham com três teorias principais que explicam por que seu cãozinho se transforma em “herbívoro” de vez em quando.
1. Comportamento instintivo e herança dos lobos
A explicação mais aceita é a mais simples: é um instinto. Embora domesticados, os cães são descendentes de lobos. Estudos sobre o comportamento de lobos selvagens mostram que eles consomem material vegetal.
Isso ocorre porque, ao caçar presas herbívoras (como coelhos ou cervos), eles acabavam ingerindo o conteúdo do estômago dessas presas, que incluía grama e outras plantas. Além disso, os lobos podem ingerir plantas deliberadamente para ajudar a “limpar” o trato intestinal, usando as fibras para ajudar a expelir parasitas (vermes) nas fezes. Seu cachorro, mesmo vivendo no conforto do seu apartamento, ainda carrega esse software ancestral.
2. Deficiência nutricional e falta de fibra
Outra teoria forte está ligada à dieta moderna. Embora as rações premium de hoje sejam muito balanceadas, algumas dietas (especialmente as mais baratas ou caseiras sem supervisão) podem ter deficiência de fibras.
O capim é uma fonte rica em fibras. O cachorro pode estar instintivamente buscando na grama os nutrientes que faltam em sua tigela de comida. As fibras são essenciais para a saúde digestiva, ajudando a formar o bolo fecal e a manter o intestino funcionando regularmente.
3. Tédio, ansiedade ou gosto
Não podemos descartar o fator comportamental. Às vezes, comer capim é apenas… divertido. Especialmente para filhotes ou cães que passam muito tempo sozinhos, mastigar a textura diferente da grama pode ser uma forma de aliviar o tédio ou a ansiedade.
Alguns cães podem simplesmente gostar do sabor ou da sensação da grama fresca. Nesses casos, funciona como um “petisco” natural que eles mesmos encontram durante o passeio.
É mito ou verdade que cachorro come mato para vomitar?
Este é o maior mito sobre o assunto. A maioria das pessoas acredita que o cachorro come capim porque está se sentindo enjoado e quer induzir o vômito para aliviar um mal-estar.
Estudos e a observação veterinária mostram que o oposto é mais provável. Na maioria das vezes, o vômito é a consequência, e não o objetivo.
Uma pesquisa científica sobre o tema revelou dados importantes:
- A grande maioria dos cães que comem grama não parece doente antes de ingeri-la.
- Menos de 25% dos cães que comem grama vomitam depois.
O que acontece é que o capim, especialmente quando engolido rapidamente e sem mastigar direito, tem uma textura que “faz cócegas” ou irrita a mucosa do estômago, podendo disparar o reflexo do vômito. Mas o cachorro não raciocina: “Estou enjoado, logo, vou comer capim para vomitar”.
Qual o perigo de cachorro comer capim?
Em si, a grama comum (como a grama-esmeralda de jardim) não é tóxica. O verdadeiro perigo não está na planta, mas no que pode estar nela.
- Agrotóxicos e Herbicidas: Se o seu cachorro come grama em parques públicos, praças ou jardins de vizinhos, ele corre um risco sério de intoxicação por produtos químicos usados na jardinagem.
- Parasitas: Ovos de vermes intestinais (como ancilóstomos) e protozoários (como a giárdia) podem estar presentes no solo e na grama contaminados por fezes de outros animais.
- Poluição: Em áreas urbanas, a grama perto de ruas movimentadas pode estar contaminada com poluentes de escapamento de carros.
Quando comer capim é um sinal de alerta?
Embora o comportamento seja normal, ele exige sua atenção. Veterinários indicam que você deve se preocupar e procurar ajuda profissional se notar os seguintes “sinais vermelhos”:
- É uma compulsão: O cachorro não come apenas um pouco; ele parece desesperado para comer grama em todos os passeios, de forma obsessiva.
- Vômitos frequentes: Se o cachorro vomita sempre após comer capim, ou vomita mesmo sem comer.
- Sinais de dor: Se o hábito vier acompanhado de diarreia, letargia, falta de apetite ou visível desconforto abdominal (barriga inchada, gemidos ao deitar).
- Prioridade: Se o cachorro deixa de comer a própria ração, mas corre para comer capim.
Esses sinais podem indicar problemas subjacentes mais sérios, como gastrite, pancreatite, verminose intensa ou uma deficiência nutricional grave que precisa ser investigada.
Cuidado com plantas tóxicas que seu cachorro pode comer
O maior risco é o cachorro confundir grama com plantas ornamentais que são venenosas. Muitas plantas comuns em casas e jardins podem ser fatais.
Se você tem um cachorro “pastejador”, garanta que ele não tenha acesso a estas plantas:
- Comigo-ninguém-pode
- Espada-de-são-jorge (e Espada-de-santa-bárbara)
- Azaleia
- Copo-de-leite
- Lírio-da-paz
- Bico-de-papagaio (comum no Natal)
Ver seu cachorro comendo capim é, na maioria das vezes, apenas observar um comportamento instintivo e inofensivo. Pode ser uma herança ancestral, uma busca por fibras ou uma simples distração.
A chave, como em tudo na tutoria responsável, é a moderação e observação. Deixe-o explorar esse instinto em locais seguros (como o gramado do seu próprio quintal, onde você sabe que não há veneno), mas fique atento à frequência. Se o hábito se tornar uma compulsão ou vier acompanhado de outros sintomas, uma visita ao veterinário é essencial.
