Cientistas descobrem como o estresse estimula o surgimento de lesões orais

Em experimentos com ratos infectados pelo vírus HSV, o causador das formas mais comuns do herpes, eles identificaram um esquema cerebral ligado à doença. Nos animais testados, os pesquisadores conseguiram impedir a manifestação do vírus

por Vilhena Soares 08/01/2016 11:33

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Resultado da pesquisa pode contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos em humanos (foto: Divulgação)
 

Uma das infecções virais mais comuns, o herpes é conhecido pela eclosão das crises em períodos de estresse. O mecanismo por trás do elo entre os dois fenômenos, porém, não é completamente conhecido. Um estudo recentemente divulgado por pesquisadores dos Estados Unidos deixa esse vínculo menos obscuro. Em experimentos com ratos infectados pelo vírus HSV, o causador das formas mais comuns do herpes, eles identificaram um esquema cerebral ligado à doença e conseguiram impedir que ela se manifestasse novamente nos animais.

A aposta na análise do cérebro deu-se porque estudos anteriores apontam que o vírus do herpes se instala nos neurônios pelo fato de serem células resistentes do corpo. “Nossa colega, a doutora Anna Cliffe, interessou-se pela ideia de que o HSV pode tirar vantagem da capacidade de sobrevivência a longo prazo dos neurônios e usá-los como hospedeiros, podendo se esconder neles por muitos anos”, destacou ao Correio Mohanish Deshmukh, professor do Departamento de Biologia Celular e Fisiologia da Universidade de Carolina do Norte e um dos autores do novo trabalho.

Deshmukh juntou-se a Cliffe para desvendar essa manobra do micro-organismo e identificar como e em quais situações ele sai do esconderijo. Para isso, utilizaram camundongos infectados pelo vírus e simularam situações de tensão usando corticosteroide — o hormônio do estresse natural. “Quando o nosso corpo está estressado, liberamos altos níveis de corticosteroides. Então, usá-lo nessa experiência foi uma boa maneira de imitar o que poderia acontecer no organismo”, explicou, em comunicado à imprensa, Anna Cliffe, pesquisadora da Universidade de Carolina do Norte e também autora do trabalho.

Observando os animais, os investigadores descobriram que a proteína JNK — também ligada aos episódios de estresse — foi ativada antes de o vírus começar a deixar os neurônios. Com base nessa informação, resolveram interferir no mecanismo. “Usamos inibidores químicos para cessar a atividade da JNK e uma tecnologia que ajudou a acabar com as proteínas dos neurônios, a DLK e a JIP3, que são necessárias para ativar a JNK”, explicou Deshmukh.

As intervenções obtiveram sucesso e, segundo os cientistas, o resultado pode contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos em humanos. “Também ajuda a explicar por que o estresse celular pode causar a reativação do vírus. Esperamos que novos tratamentos possam ser desenvolvidos com base na inibição da DLK e JIP3 no futuro”, complementou Deshmukh.

COMO O HIV Para Gustavo Guida, geneticista do Laboratório Exame, em Brasília, o comportamento do HSV observado pelos pesquisadores norte-americanos pode ser comparado ao de outros micro-organismos. “O que foi observado é que, quando existe um ambiente propício para o herpes se manifestar, como a ativação de JNK, ele age. Fica escondido nos neurônios até observar uma oportunidade. É a mesma coisa que muitos vírus fazem, inclusive o HIV”, detalha.

O próximo passo dos pesquisadores é testar a técnica em outros animais para saber se a estratégia utilizada nos experimentos com ratos pode se repetir. “Estamos, agora, examinando o papel da via JNK em modelos de animais com latência pequena do HSV. Investigaremos ainda os mecanismos de ativação e reativação de JNK. Nós também estamos interessados em examinar esse fenômeno em neurônios humanos”, adianta Deshmukh.

Se confirmados os efeitos em pessoas, avalia Guida, a estratégia poderá simplificar o tratamento do herpes e torná-lo mais eficaz. “A possibilidade de usar inibidores para interromper a ação de JNK ou das duas proteínas necessárias para a sua ativação pode ser uma opção mais simples de terapia e que também trará menos efeitos colaterais. Seria uma alternativa aos antivirais, usados com o objetivo de agredir o vírus. Essa nova estratégia apenas impede um procedimento de ativação dele”, compara.

O geneticista explica que essa linha de tratamento tem crescido no campo científico, inclusive no combate à Aids. Em vez de atacar o vírus diretamente para eliminá-lo, o medicamento cria condições para que ele não consiga agir no paciente infectado. “Atualmente, a busca por maneiras de interferir em processos de um micro-organismo se mostra muito mais atraente do que o ataque ao vírus. Não só pela eficiência, mas também porque, em grande parte das vezes, evita procedimentos caríssimos”, diz.


PREVENÇÃO
Para prevenir o herpes é necessário evitar o contato com pessoas que possuem a doença no momento em que elas estão lesões aparentes. Para os indivíduos infectados, resta agir para evitar que as lesões retornem. Para isso, é importante saber os fatores que podem fazer com que as crises surjam. Elas geralmente são causadas por fatores de estresse, como febre, sol, período menstrual e mudanças hormonais, além da exposição a determinados medicamentos.