João das Neves lança ''Diálogo com Emily Dickinson'', livro com ilustrações de Diane Ichimaru

Obra traz homenagem ao poeta o poeta Ferreira Gullar

por Márcia Maria Cruz 13/06/2018 09:35
O multiartista João das Neves convidou o poeta Ferreira Gullar (1930-2016) para a conversa, que estabelece, por meio da poesia, com Emily Dickinson (1830-1886). Emily escreveu: “Por que morreste?”/ “Pela beleza”, respondi – / “E eu – pela verdade – ambas são iguais – / E nós também, somos irmãos”, disse ele. Era 4 de dezembro de 2016 quando Gullar faleceu, deixando como legado uma participação definitiva na poesia brasileira, incluindo o concretismo.
João Castilho/Divulgação
O diretor de teatro João das Neves lança Diálogos com Emily Dickinson, seu segundo livro de poemas (foto: João Castilho/Divulgação)

A morte do poeta fez João retornar a versos em que dialoga com a poeta norte-americana, especialmente os citados de Morri pela beleza, dedicando-o a Gullar. “Quando morre o poeta/ mãe da lua esquece o canto/ pois de pranto é feito o seu cantar.” Esta homenagem a Gullar é um dos 50 que compõem o livro Diálogo com Emily Dickinson, com ilustrações de Diane Ichimaru. A obra será lançada nesta quarta-feira (13), no Sesc Palladium, no Centro de Belo Horizonte.

O livro mostra a relação de afeto que João estabelece com Emily. “É como se ela fosse grande amiga e estivéssemos conversando sobre poesia”, diz. Com vasta e respeitada produção no teatro e nas artes, este é o segundo livro de poemas de João. Em 2106, lançou Rumores (independente), um livro de haikais.

Embora seja reverenciado por outros poetas, João das Neves diz não se sentir como tal. A proposta de escrever os versos, como ele revela, surgiu da releitura da obra de Emily da qual é leitor há anos. “Ao reler poemas dela, comecei a brincar. Queria a cada verso travar diálogo. Inspirava-me fazer poema, dar resposta a ela, quase como brincadeira”, conta. João destaca o quanto ela foi inovadora, tanto por ser mulher e ter se dedicado à poesia no século 19, no Sul dos Estados Unidos, “uma sociedade extremamente conservadora”.

“Era uma mulher, nos Estados Unidos no século 19, que vivia reclusa em casa. Tinha um mundo interior de riqueza imensa”, afirma. O lirismo profundo é característica da poesia de Emily e também da de João. “O feminino aparece muito. Não como bandeira, mas na maneira como ela escreve. Os sentimentos profundos que tinha, os sonhos dela de amor. Eram os versos escritos por uma mulher”, afirma João.

Emily foi disruptiva na busca por uma linguagem, ao incorporar elementos visuais ao poema. “Ela introduz elementos gráficos impensáveis na época. Avançou muito no seu tempo, é impressionante. Introduz espaços vazios, travessões, destaca determinadas palavras”, diz. Por essa razão, a poeta inspirou expoentes do concretismo brasileiro, como Augusto de Campos.

O primeiro encontro de João das Neves com Emily foi conduzido pelas traduções feitas por Manuel Bandeira (1886-1968). “Manuel foi o primeiro tradutor dela (para o português). Gostei muito e, a partir daí, passei a ter contato muito próximo”, afirma. No poema que fez a Ferreira Gullar, João das Neves também estabelece diálogo com a forma, incorporando aspectos visuais.

No verso “quando morre um poeta/ sabiás voam e cantam sem parar/ entregando sua alma ao infinito/ aonde brilha/ e/ terna a luz solar”. Faz uma brincadeira com a palavra “eterna”, que separada a vogal “e” pode ser lida como “é terna”. “Os poetas concretistas se encantaram com ela. Além de ser eterna, ela é terna, envolvente, carinhosa. Digo isso com um pequeno recurso gráfico”, afirma João.

Diálogo com Emily Dickinson

. João das Neves
. Independente
. 120 páginas
. R$ 50

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