Ramones ainda influenciam o rock em Belo Horizonte

Os acordes acelerados e a atitude que destacaram a banda desde o lançamento do primeiro álbum, em 23 de abril de 1976, são marcantes na cena cultural da capital mineira

por Pedro Galvão 24/04/2016 07:00
Divulgação/1977
Divulgação/1977 (foto: Divulgação/1977)
 

Um muro de tijolos, quatro sujeitos mal-encarados dentro de suas jaquetas de couro e calças jeans rasgadas e 29 musicais totalmente revolucionários. Em 23 de abril de 1976, os Ramones lançavam seu primeiro álbum, com o mesmo nome da banda, e saíam das apertadas e sujas paredes do CBGB – inferninho onde começaram a tocar em Nova York – para entrar para a imortalidade. Quarenta anos depois, se Joey, Johnny, Dee Dee e Tommy já se foram, o legado construído a partir daquele compacto continua vivo e jovem entre aqueles que acreditam que rock’n’roll e diversão caminham juntos e que para fazer acontecer basta ter atitude.

Ramones marcou o surgimento do punk rock. O disco gravado pela Sire Records, que apostou no inexperiente quarteto depois de vê-lo em ação em uma noite qualquer no CBGB, tem 14 faixas, fora as bônus, extremamente rápidas e simples, com melodias quase repetitivas, mas extremamente honestas e fiéis à realidade de uma juventude ociosa, mas cheia de energia. As canções falam de paqueras, brigas de rua, drogas, prostituição, críticas quase inocentes ao nazismo e à relação entre Cuba e Estados Unidos, entre outras realidades que, estranhamente, continuam muito atuais entre jovens dos grandes centros urbanos do mundo.

A música do grupo nova-iorquino foi revolucionária não apenas pelos acordes mais acelerados, exponenciados em tantos nomes que vieram depois, como The Clash, Sex Pistols, Metalica, Motorhead, Strokes, entre outros ícones do rock mundial que beberam diretamente na fonte do Ramones. A grande transformação deflagrada há exatos 40 anos está na atitude da banda, que provou que basta querer, arregaçar as mangas e fazer, ou, no caso, tocar. Uma lição decisiva para milhares de jovens do planeta que passaram a ver os palcos como uma possibilidade totalmente palpável. Inclusive em BH.

Para várias bandas que se revezam pelas casas de shows e festivais na capital mineira, o exemplo de 76 está muito vivo. Formados em 2013, os Dead Pixels se dizem influenciados na música, na atitude e na postura pelos Ramones. “Além de eles terem definido o estilo que também nos define, que é o punk rock, eles influenciam a gente na simplicidade, tanto das músicas, ao fazer a pessoa dançar, com um som veloz e cheio de energia, quanto das letras, por se comunicar com o público de forma direta”, explica o baterista Mauro Novaes, que já fez parte de outras bandas ramoníacas, como as extintas Jet Kids e Silicones, além do Marrones, que era um cover dos ídolos.

Outro integrante do Dead Pixels, Claudão Pilha, um dos proprietários da Obra, também vê sua carreira musical guiada pelo quarteto do Queens. “Olha o que o Ramones se tornou e o imagine tocando lá no CBGB, em 1976, para 50 pessoas. Qualquer um que visse podia pensar que também seria capaz, e é mesmo! Eu sempre ouvi os clássicos do rock, mas para você querer ser o Led Zeppelin é preciso ser muito virtuoso. Quando ouvi Ramones, pensei: ‘Opa, isso eu posso fazer também’”, conta o guitarrista da banda, que lançou seu primeiro EP em 2014 e já tocou em importantes festivais, como o Goiânia Noise e o Primeiro Campeonato Mineiro de Surf.

A casa de shows na Savassi, frequentemente comparada ao berço do punk rock de Nova York, é fruto, na verdade, da proposta do próprio Ramones, nas palavras de Claudão: “Nossa inspiração não é nem o CBGB, era o próprio Ramones. Há 20 anos, faltava lugar para ter show em BH, com DJ bacana, não víamos nada que nos agradasse na noite, por isso resolvemos arregaçar as mangas e fazer nosso próprio lugar, assim como eles fizeram”, conta um dos responsáveis pela boate, que recebe pelo menos dois shows semanais de bandas autorais.

ALÉM DO PUNK O Ramones inspira até mesmo aqueles que caminham para além do punk rock, misturando outros ritmos. Formada em 2013, a Evil Matchers, que acaba de lançar seu primeiro EP, pode ser enquadrada em outros subgêneros como o glam, garage e o stoner, mas o legado de quem criou o punk rock também se faz presente. “É uma grande influência pra gente, desde o jeito de vestir. Afinal, não tem nada que me deixa mais confortável que uma jaqueta de couro, uma calça e um tênis surrado, até no jeito de compor, que é simples e direto”, define o guitarrista Luiz Bueno.  

O baixista do grupo, Léo Alves, vai além e classifica a existência do Ramones como determinante para a presença dele e de outras pessoas no meio da música: “O primeiro disco deles é um marco para mim, é a verdadeira simplicidade que é a magia do rock’n roll. Se não fossem eles, não só eu, mas acho que o rock seria diferente. Talvez eu nem seria um músico hoje, pois nunca fiz aulas nem sou virtuoso, graças ao Ramones vi que era possível”, explica.

O jeito Ramones de ser é exemplo de atitude não apenas para homens. Criada também em 2013, a Dopaminas, formada apenas por garotas, também presta reverência e se identifica com a gangue de Joey, Johnny e Dee Dee. “Nós surgimos com uma proposta autoral, sincera e ‘faça você mesmo’. Não criamos nosso trabalho por interesse comercial, mas por ter prazer e amor em fazer música e pensamos nas composições de um jeito ‘meio Ramones’: pegamos a letra, montamos uns riffs principais de três ou quatro power chords, encaixamos nos versos, e por aí vamos derivando”, explica Nathália Xavier, baixista da banda, que lançou seu primeiro EP no fim do ano passado.

Nathália conta ainda que o primeiro álbum do Ramones foi decisivo para sua formação musical, fazendo a ponte do rock “enlatado”, mais comercial, que ela ouvia para o underground: “O Ramones se tornou meu anti-herói. Se aquele cara esquisito, rebelde, de voz estranha chamado Joey, diferente dos bonitinhos do pop, conseguia fazer um som e uma apresentação tão potentes, eu também conseguiria. Isso me deu muita força para botar minha primeira banda para frente e me apresentar”, explica.

Ramones em BH
Ao longo das duas décadas de carreira, os Ramones vieram a Belo Horizonte uma única vez, em novembro de 1994. O show foi no Parque de Exposições da Gameleira e fez parte da turnê que a banda fez pelo Brasil ao lado do Sepultura, que estava no auge da carreira. Além das duas lendas, Overdose e Viper também se apresentaram, tornando a noite épica para quem assistiu ao show.

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