João, o primogênito do cantor e compositor pernambucano, conta que o processo para se tornar músico não foi tão natural como se imagina. Na adolescência, ele se aproximou do ofício de escrever, tanto é que optou pelo jornalismo no vestibular. “Escrevia crônicas, exercitava o texto e sempre gostei de brincar com as palavras. Nos tempos de escola, tinha colegas que chegaram a ser músicos, mas estava afastado desse ambiente. Quando entrei na faculdade, acabei sendo convidado para participar de uma banda e assim começou tudo”, recorda.
A avaliação de Lenine sobre a escolha do filho, no primeiro momento, não foi das mais entusiasmadas. “Não chegou a ter uma reação proibitiva, mas a predileção era por uma carreira mais estável”, lembra João. O pai diz que os filhos, sobretudo o mais velho, sabiam das dificuldades que uma carreira musical enfrenta, mas a partir do momento em que eles tomaram a decisão, apoiou-os em todos os momentos.
“João sentiu na própria pele o que significava investir numa carreira autoral. Ele pode mensurar isso. E ele viu o que passei. A vida sorriu amarelo para mim durante um bom tempo, e isso gera uma série de incertezas. Mais do que ninguém, ele tinha certa indecisão que foi até um determinado momento, assim como com os demais, Bruno e Bernardo, que também estão completamente imersos no mundo musical. Mas já que estão aí, vibro, jogo e apoio os três. Sou um pai babão e todos eles mostram uma competência infinitamente maior do que a minha”, celebra.
Influências
Apesar de João Cavalcanti ter ficado bem marcado com seu trabalho no samba, sua primeira influência é a música nordestina. Mesmo tendo nascido no Rio de Janeiro, passou toda a juventude e seus verões no Recife, terra da família do pai, e acabou se familiarizando bastante com a cultura pernambucana, sobretudo com seus ritmos. “É natural que em algum momento isso tenha se deflagrado e refletido no meu primeiro disco solo, 'Placebo', que tem um pouco de frevo, do coco, das cirandas. Para você ter ideia, o primeiro samba com o qual tive contato foi o do Jackson do Pandeiro (paraibano), que era coquista (cantador de coco), forrozeiro e sambista. Nessa minha composição heterogênea, o samba ocupa uma posição importante, mas sempre digo que jamais vou conseguir me descrever como sambista”, diz João.
Lenine e João costumam dar palpite no trabalho do outro e, eventualmente, sobem ao palco juntos. Mas a primeira vez que tiveram uma apresentação registrada foi em 2011, na gravação do DVD em comemoração aos 10 anos do Casuarina, na Lapa, no Rio. “Como documento, aquela foi a nossa estreia. Mas estou sempre junto; sou torcedor dele antes mesmo de o Casuarina surgir”, garante Lenine.
João diz que o encontro no DVD foi uma espécie de “saída do armário da relação pai e filho”, já que nunca fez questão de omitir e nem de sublinhar a ligação familiar. Ele enfatiza que tudo foi conduzido de maneira espontânea e que era normal que ele passasse pela construção da própria personalidade.
Tanto é que tudo está caminhando para que a dupla assine a primeira parceria, que deve ocorrer no próximo disco de Lenine. “É bem possível que façamos nossa primeira música em conjunto. João tem o recurso da palavra. Tem composto ao lado de gente não só da geração dele como da minha”, destaca o compositor pernambucano.
Canções para orquestra
A apresentação com a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais (OSMG), aos pés da árvore Tamboril, em Inhotim, no mês passado, foi tão especial que ficou com gostinho de quero mais. Tanto é que o cantor e compositor Lenine está de volta a BH neste domingo para reapresentar o mesmo show-concerto realizado no Centro de Arte Contemporânea. “Foi justamente em decorrência daquele encontro que decidimos fazê-lo novamente, mas agora no Palácio das Artes. Foi maravilhosa aquela conjugação de música e arte, porque não foi simplesmente tocar num parque, num jardim. Tivemos essa noção clara de uma empatia entre a orquestra e o meu trabalho e todo aquele ambiente”, ressalta Lenine.
No programa constam 14 músicas do repertório do artista, que foram apresentadas junto com a OSMG, como 'Chão', 'Se não for amor eu cegue', 'Tudo por acaso', 'Que baque é esse', 'Paciência', 'Lavadeira do rio', 'Leão do Norte', entre outras. “Tenho tocado muito com orquestras e cada uma tem um sotaque, um relevo sonoro e sua própria autoralidade. E isso é muito interessante”, observa Lenine.
Tributo ao mestre Dorival
Não é a primeira vez que o Casuarina – que está completando 13 anos de carreira – lança um trabalho em BH. Assim foi com 'Trilhos – Terra firme', em 2011, no Music Hall, e agora a dose se repete com 'No passo de Caymmi'. Para João Cavalcanti (tam-tam e voz), que integra o grupo ao lado de Daniel Montes (violão de 7 cordas), Gabriel Azevedo (pandeiro e voz), João Fernando (bandolim e vocais) e Rafael Freire (cavaquinho e vocais), a escolha da capital mineira, além dos motivos de agenda, se deve ao fato de a banda ser sempre muito bem recebida na cidade. “O público é muito caloroso, cúmplice e condescendente com a gente. Está sempre disposto a nos ouvir e ver a gente crescendo no palco”, diz João Cavalcanti.
'No passo de Caymmi' é o sexto trabalho do Casuarina e traz 17 canções representativas de todas as fases da carreira do compositor baiano. No repertório, 'É doce morrer no mar', 'O bem do mar', 'Dora', 'Marina', 'A vizinha do lado' e 'Requebre que eu dou um doce'.
Este é o primeiro CD gravado exclusivamente pelos cinco integrantes do grupo, sem overdubs (técnica de gravação que consiste em adicionar novos sons), músicos convidados ou instrumentos “estrangeiros” à formação do grupo. “O disco soa o mais natural possível e a gente o reproduz quase integralmente no show. Tem arranjos bem delicados, que voltam à nossa essência. Foi um processo enriquecedor e de autoconhecimento”, conclui o músico.
Lenine e Orquestra Sinfônica de Minas Gerais
Domingo, às 19h, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). Ingressos: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia-entrada). Informações: (31) 3236-7400
Casuarina
Show de lançamento do CD No passo de Caymmi. Sexta, às 21h, no Teatro Bradesco (Rua da Bahia 2.244, Lourdes ). Ingressos: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia). Ingressos promocionais antecipados: os 100 primeiros ingressos serão vendidos pelo valor de R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia). Classificação livre. Informações: (31) 3516-1360.
Ouça um teaser de 'Requebre que eu dou um doce', com João Cavalcanti e o grupo Casuarina: