Padre Marcelo Rossi fala sobre depressão, política e anorexia em entrevista

Pároco lança em outubro o álbum 'O tempo de Deus', influenciado pela depressão e lamenta: "O Brasil precisa de propostas"

por Luiza Maia 18/10/2014 10:50

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Pároco acredita que novo CD vai ajudar as pessoas. Foto: Marcos Hermes/Divulgação
Padre Marcelo acredita que novo CD vai ajudar as pessoas (foto: Pároco acredita que novo CD vai ajudar as pessoas. Foto: Marcos Hermes/Divulgação)
Com uma abertura impressionante, o padre Marcelo Rossi fala sobre os distúrbios alimentares e psicológicos pelos quais passou nos últimos anos. Para os que se espantaram com a magreza exibida no último domingo, no programa 'Fantástico' (Globo), questionada por internautas, ele alivia: “minha saúde está ótima”.

Os quilos a menos são assegurados por uma dieta balanceada - nada de água, alface e hambúrguer, como no ápice da anorexia - e cerca de dez quilômetros diários percorridos na esteira. O hábito é anterior à batina: o pároco do Santuário Mãe de Deus, em São Paulo, é formado em educação física. Mas também pelo jejum ao qual se submeteu durante a composição das 14 canções do novo disco, 'O tempo de Deus' (Sony, R$ 10).

O projeto é o primeiro influenciado pela depressão e anorexia. “O CD vai ajudar muito as pessoas tristes. Muita gente pensa que depressão é frescura. Não cheguei a uma depressão forte, mas foi um princípio. Até então eu não sabia o que era isso. Eu estava sem remédio ou psicólogo. Foi através da oração e conscientização”, confessa.

No próximo ano, ele deve percorrer cidades brasileiras para divulgar o livro 'Philia', já entregue à Editora Globo. “É contra 14 males, como depressão, ansiedade, autoestima baixa. Eu vou poder ajudar muito às pessoas”, acredita o religioso. Para ele, compartilhar as próprias experiências é uma forma de chamar a atenção das pessoas para o problema.

'O tempo de Deus' tem 14 faixas escritas por Rossi, que abdicou dos direitos autorais para reduzir o valor de venda, R$ 10. conta. A renda será revertida para a capela dele.

Entrevista // Padre Marcelo Rossi

O senhor foi um dos primeiros a despontar como padre cantor e este segmento se mantém muito forte. Por quê?
Se pensar bem, na mídia do mundo, eu fui o primeiro, em 1998. Tive o contato com o papa João Paulo II em 1997 e ele que nos incentivou a ir aos veículos. Terminei com o filme, 'Maria: Mãe do filho de Deus'. O cardeal Ratzinger não só reconheceu meu trabalho mas me presenteou com a honraria Van Thuân (em 2010). Agora, eu sentei com a Sony e disse “quero um CD de R$ 10”. A inflação está mascarada, mas incrível, eu queria um produto barato. “Eu serei o autor de todas as músicas”. Eu sempre pegava uma música minha, mas também de outros, para divulgar. Minha preocupação era ter algo de qualidade, espiritualidade e saiu essa bênção. Está lindo. Ele vai envolvendo você. Eu renunciei à parte autoral. Só recebo como intérprete. E mesmo assim, todo o dinheiro vai para a capelinha do santuário.

Por que esse preço (R$ 10)?
Eu fiz uma pesquisa. A maioria das pessoas, o grande público que me acompanha e da classe C. Eu sei pelo Santuário. Para a classe C, um CD a R$ 20 é muito caro. No Santuário, tem pessoas que compram três, quatro, cinco. Todos já lançaram, porque sabiam que o fim do ano seria terrível. Agora, eu vou em todos os programas, sem negar nenhum, levando essa novidade.

A música é importante para divulgar a religiosidade?
É fundamental. No fim do quarto século, Santo Agostinho escreveu “quem ama canta”. O livro também é importante. Com 'Ágape', foram dez milhões de exemplares. Foi o livro mais vendido fora a Bíblia aqui no Brasil. A música é fundamental. Já estou terminando um livro. 'Philia' é contra 14 males, como depressão, ansiedade, autoestima baixa. Eu vou poder ajudar muito as pessoas. Vou lançar no ano que vem, em cidade por cidade, como Ágape, coisa que não fiz com Kairós. Olha a diferença: 'Ágape' vendeu 10 milhões de cópias. 'Kairós', dois milhões. Mas eu estava muito inchado, tomando anti-inflamatório. Depois fiquei viciado no remédio. Meu médico disse para parar com o remédio, que não tinha mais nada. Eu tinha medo de a dor voltar. Fiz a dieta, exagerei. Fiquei meio mal.

Você indica psicólogo para pessoas em depressão?
Sinceramente, sim e não. Para que serve o padre? É um médico de almas. A grande maioria das pessoas está carente. Elas não têm com quem falar. Você precisa ensinar as pessoas a se abrir com Deus. Meus amigos psicólogos concordam. O CD é antidepressivo. A primeira faixa é uma declaração, são momentos em que estava muito angustiado. Gravei esse CD jejuando. Por isso também emagreci bastante. Fiquei sem comer, a pão e água, só alface. Jesus fala que a oração é fundamental. Tanto que fiz o CD, o livro já está com a editora Globo.

Então é por isso que o senhor está mais magro?
Estou com o mesmo peso. Pega o filme 'Maria' e me compara. Estou igual. As pessoas estão estranhando o peso 80 e poucos, mas cheguei a 60 quilos. E ao pico máximo de 125. Estava quase obeso mórbido. Não quero músculo. Diariamente, faço 10 km por dia, entre corrida e caminhada. Com esse peso, me aliviou outro problema. Nunca reclamei, mas tenho problema na coluna, na lombar. Estava tomando mais remédio, só que isso destrói o fígado. Imagina com dor. Tenho discopatia degenerativa, como uma dor faquinha incomodando. Essa foi minha grande libertação. Esse peso que estou agora é o que eu quero. Tenho que manter a alimentação regrada. Tenho 1,95m. É difícil entrevistar alguém, porque você está preocupado com o que vai dizer e não ficar com a coluna corcunda. Uma das coisas que aprendi quando vou fazer esteira é olhar para a televisão. Para cair, é rapidinho (ele já se acidentou na esteira). Quando fico sem esteira, meu dia já é outro, porque você libera endorfina, que existe também no chocolate.

O senhor come chocolate?
Na verdade, não. Mas, se deixar, como uma caixa inteira. Vou confessar: na semana passada, me deu um ataque de fome e comi a caixa inteira. Como estou bem magro, tudo bem. É minha tentação, porque injeta para você a endorfina.

Então sua saúde está bem? E o senhor não está mais comendo só alface?
Está ótima. E dieta balanceada. Não posso nem ver hambúrguer ou alface.

Suas primeiras músicas eram marcadas por melodias dançantes. 'O tempo de Deus' tem outro ritmo, mais lento...
Esse CD está realmente buscando ajudar a quem passa por uma situação difícil. Todo mundo estava preocupado se o padre Marcelo está bem. Quis um CD mais profundo, intimista. Esse é o segredo do CD. E o povo está amando. Eles estão apaixonados. Vai ser uma bênção.

O senhor acha que vivemos um momento em que as pessoas se distanciam da Igreja, da religião?
Uma das minhas grandes preocupações é as pessoas se esqueceram de Deus. Sem Deus, ele cai em depressão, bebida, droga. Ela cai em alguma coisa errada. Mais do que nunca, falta Deus. Eu vou tentar falar muito na televisão sobre isso. O CD vai ajudar as pessoas a se encontrar com Deus. São inúmeras forças que querem o nosso mal, inveja... É importante sentir a proteção divina.

A renda dos seus discos é doada?
Eu tenho um santuário com capacidade para 100 mil pessoas. E sou pároco agora. As grandes celebrações, tudo bem, mas não vou usar aquele espaço enorme para fazer missa diária. Preciso fazer uma capela. E fiz o santuário sem pedir dinheiro para ninguém. Você nunca me viu pedir dinheiro. Eu trabalho e eu doou. Eu poderia ficar para mim. É meu, é lícito.

O que o senhor acha do Tempo de Salomão?
É a cópia da bíblia. Mas não vivemos o Antigo Testamento, vivemos o novo. Depois de Jesus, quem é Salomão? O Salomão acaba sendo um templo de esplendor. Uma coisa magnífica, mas o importante é ter um lugar abençoado. A gente passa e ele fica. No santuário que construí, os padres podem ser enterrados lá. Quando morrer, vai ter alguém celebrando a missa por mim.

'Tempo de Deus' tem apenas composições suas. Como é seu processo de criação?
Nossa, foi muito legal. Foi uma experiência muito mística. Não fui eu, foi Deus. Eu trabalhei em um momento difícil. Cada música foi um momento difícil e uma resposta que Deus me deu. 'Sonhos de Deus' foi o momento em que eu estava começando a ficar com anorexia. Apesar de as pessoas falarem “você está magro”, você se enxerga gordo. A letra ajuda muito.

Como apoia os jovens que querem seguir o caminho da música religiosa?
Eu procuro ajudar sempre que posso. Divulgo na rádio que tenho. O CD não tem faixa etária. A depressão é o mal do século. Acomete até crianças. Eu acho que é muita informação e pouca formação. Eu passei por isso.

O senhor se considera uma pessoa vaidosa?
Já fui muito. A cada dia, estou me libertando. Eu trabalhava com educação física. Querendo ou não, fui muito vaidoso, com culto ao corpo. Tanto que muita gente fala “volta a treinar, você fica forte”. Não quero estar magro de doente, como no ano passado, que estava sem energia. Estou com o peso que sempre tive, meu biótipo. Minha referência é 2012, no filme Maria.

Em quem vai votar nessas eleições?
A igreja católica nunca apoia ninguém. A igreja aprendeu que não se une política e religião. Eu sou contra padres que tentam eleição. Ele largou tudo para ser padre ou pastor. Não dá para misturar líder espiritual com político. Está errado.

Uma das grandes discussões do debate eleitoral foi o preconceito contra a comunidade LGBT. O que o senhor achou do teor das afirmações?
Sinceramente, eu procuro ficar fora dessa discussão. Estou tão triste. Hoje tem o debate. Muito para mim vai ser desse debate, que vai ser importantíssimo. Como eu, pessoas estão esperando. Até agora, tem sido muito ataque, poucas propostas. O Brasil precisa de propostas. Estarei lá, assistindo, às 22h15. Se, até 23h, sentir que descamba pra o ataque, desligo a TV.

E anula o voto?
Sou contra. Quero tentar o menos pior. Nunca deixei de votar. Só digo isso, nunca deixe de votar. Estou rezando para que eles tenham o equilíbrio de falar ideias. Não me interessa isso de jogar a culpa.

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