Samba-rock anima as noites de BH

Ritmo conquista os adolescentes do século 21. Várias bandas se dedicam ao gênero, que surgiu nos anos 1960 e se eternizou nas batidas de Jorge Ben Jor

por Walter Sebastião 13/07/2014 06:00

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Acervo pessoal
Criado em 2011, a banda Trem dos Onze atrai jovens fãs do samba-rock a seus shows na capital (foto: Acervo pessoal)

“Tá rolando na cidade/ Lá no morro, na favela/ No asfalto, na passarela/ Um tal de samba-rock.” A canção de Tino Fernandes está no disco Sambarock, do grupo mineiro Erê. O sambinha suingado e sensual é ouvido em todos os cantos da capital mineira. Pode ser apenas instrumental ou ter letra, tradicional ou bem moderno. Estilo difícil de definir, o samba-rock é fácil de reconhecer. O inventor é Jorge Ben Jor, que, nos anos 1960 e 1970, usou a guitarra para criar um “esquema novo” para os batuques do Brasil. A partir dos anos 2000, a moçada deu continuidade à empreitada.

Como quem batuca sempre aumenta um toque, os balanços vão se multiplicando. Cavaquinista e vocalista do Erê, David de Souza Leão, de 34 anos, conta que o grupo nasceu da amizade de garotos do Bairro Aparecida, na Região Norte da capital, que tocavam samba tradicional misturado com pop-rock. Foi assim que David acabou descobrindo o “pandeiro junto com guitarra”, como ele gosta de dizer. Gravado em 2012, o disco voltado para o gênero celebrou os 15 anos do Erê. Traz oito faixas autorais e regravações de canções de Zeca Pagodinho, Cidade Negra e de Jamie Cullum (essa em inglês ).

“Cada um que faz samba-rock mistura o estilo com mais alguma coisa. Tem sempre coisa nova”, conta David Leão, explicando que o ritmo é diferente do samba e do rock. “Ele pode ser acelerado ou suave, tem harmonia simples e rica, letra interessante e refrão forte, fazendo com que todos possam cantar e dançar”, explica. “Essa música tocou ontem, toca hoje e vai ser tocada daqui a 10 anos”, garante.

Detalhe: samba-rock combina com qualquer lugar – casas noturnas, festas de casamento, comemorações de aniversário, eventos de empresa e praças. A presença do gênero na história da MPB é antiga. “O repertório reúne músicas que as pessoas já nascem sabendo”, brinca Téo Pereira, do grupo Trem dos Onze, criado em 2011.

Téo se surpreende com o sucesso entre os adolescentes de canções de Jorge Ben Jor e Tim Maia, repertório lançado antes de eles terem nascido. Com sua alta comunicabilidade, o samba-rock joga em todas as posições, lembra o vocalista e ritmista. Serve tanto para chamar o público para o salão, no início do show, como para manter a pista fervendo. “É a mais suingada das vertentes do samba”, observa.



Namoro

João Dornas, do grupo Joãozito e a Parceira, criado em 2008, diz que a cena do samba-rock belo-horizontina é para lá de animada. Há várias bandas em atividade: Sambock, Tequila, Black Sonora, Balanço 2x4, Tô de Cara e Angu Stereo Club, entre outras. As linhagens “raiz” e “rock” namoram em BH. “Isso é um reflexo do ambiente da cidade, que tem samba legal”, argumenta Dornas. Se em outros lugares o gênero tem dicção mais pop, na capital mineira ele é movido por cavaquinho, surdo e pandeiro. A longevidade dessa música, cruzando décadas, não tem mistério: “Samba-rock é moderno, não fica preso ao purismo dos autores clássicos e as letras são muito atuais”.

O estilo vai além da música. Suas coreografias diferem da gafieira – na internet, vários vídeos ensinam os passos. Criado em 2005, o grupo Veríssimo e Os Gigantes surgiu da iniciativa do professor de dança que dá nome à banda. “Faço música para as pessoas dançarem”, explica Lucas Veríssimo. Nos shows, ele usa microfone sem fio para descer do palco e interagir com a plateia. “Essa música sedutora leva à dança, mesmo que seja só balançando o pé no cantinho do salão”, observa.

 “O samba-rock não é um gênero, mas um modo de tocar, uma pegada que pode ser levada para muitas músicas”, acrescenta Lucas Veríssimo, lembrando que há “gravações estupendas” antigas e novas, de artistas conhecidos, esquecidos ou anônimos. “Ela retrata o cidadão comum que tem como valor a amizade, seus relacionamentos, a autoexpressão. Nesse sentido, é diferente do funk, que tem dança bonita, mas cultiva valores superficiais e monetários”, conclui.

CURIOSIDADES


» Início
É difícil estabelecer a origem do samba-rock, ainda que todos apontem como berço do gênero a periferia de São Paulo no fim dos anos 1950, com dança que misturava passos de samba e de rock. A fusão de sonoridades pode ser ouvida nos experimentos do músico Bola Sete em Baccará, gravação de 1957/58. A expressão samba-rock aparece na canção Chiclete com banana (1959), de Gordurinha e Almira Castilho.



» Jorge Ben jor (foto)
A unanimidade veio com o reconhecimento de Jorge Ben Jor, que, ao tocar com o Trio Mocotó, sintetizou o gênero ao interpretar samba com guitarra. A mistura de samba, rock, jovem guarda, soul e jazz, entre outros gêneros, ecoaria na produção de artistas da passagem dos anos 1960/1970, como Erasmo Carlos, Wilson Simonal e Bebeto.

» Contemporâneos
A partir dos anos 2000, o gênero foi revigorado por Seu Jorge, Funk Como Le Gusta, Sambasonics e Clube do Balanço. Os músicos contemporâneos reabilitaram autores esquecidos. Essa turma resgatou, por exemplo, 16 toneladas, de Noriel Vilela, integrante dos Cantores de Ébano, assim como fez releituras de sambas antigos como Eu bebo sim e Com que roupa?.

» Eletrônica
Clássicos do pop, como Sunday bloody sunday, da banda irlandesa U2, ganharam releitura samba-rock do grupo Sambô. Na cena eletrônica, DJs incluíram o gênero em suas set-lists. Carolina Carol bela, de Jorge Ben Jor e Toquinho, ganhou remix de Marky e bombou nas pistas europeias.



Palavra de
especialista


Gustavo Maguá
cantor e compositor

Pegada brasileira

“Ouvi samba-rock desde muito cedo. Sempre gostei da pegada e do balanço de samba tocado com guitarra. Essa música é quente, feliz, empolgante, brasileira. Ela ganha as pessoas por ser humilde e suburbana, por falar de coisas populares e valorizar o indivíduo. Às vezes acho que o samba-rock é a música mais popular do Brasil. Você pode tocar desse jeito em qualquer lugar do mundo, em Betim ou no Mangabeiras – as pessoas entendem. Não é um estilo que está na moda, pois, desde que surgiu, nunca saiu da moda. Pode estar, no máximo, mais ou menos em evidência. De alguma forma, considero-me uma continuação desse balanço. É uma das portas de acesso ao que faço”.

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