Will Smith e a mulher discutem caso extraconjugal ao vivo no Facebook

Era das redes sociais redefine o comportamento de artistas famosos em relação ao público. A exposição da intimidade pode chegar a assuntos que antes eram tabu

Pedro Galvão 25/07/2020 04:00
Valérie Macon/AFP
Will Smith e Jada Pinkett-Smith discutiram com transmissão ao vivo pelo Facebook o envolvimento amoroso que ela teve com o rapper August Alsina (foto: Valérie Macon/AFP)
Um dos maiores astros de Hollywood, o ator e cantor Will Smith recebeu uma avalanche de atenção neste mês de julho não por alguma atuação em um blockbuster, mas por um episódio familiar e íntimo. 

No que chamou de um desabafo, o rapper August Alsina contou ter tido uma história de amor com Jada Pinkett-Smith, casada com Will. Segundo Alsina, Will Smith deu sua “bênção” para a relação, o que intensificou os rumores que circulam há tempos de que um dos mais poderosos casais de Hollywood mantém um “casamento aberto”. 

Se antes um tema tabu como esse motivaria um sumiço temporário das figuras envolvidas, nos tempos atuais, a estratégia do casal foi escancarar sua intimidade para o público. No talk-show Red Table Talk, comandado por Jada, os dois conversaram sobre a relação de Jada e Alsina, em transmissão ao vivo pelo Facebook, no último dia 10.

Como se estivessem na sala de casa, entraram em detalhes sobre como se sentiam a respeito. A diferença é que a conversa podia ser acompanhada no mundo inteiro. 

O exemplo do casal Smith não é o único em que celebridades tratam na esfera pública de aspectos de sua vida antes considerados estritamente privados. Alguns mantêm mesmo uma rotina de dividir com seus seguidores em redes sociais fatos corriqueiros. 

Pesquisadora no campo dos estudos de celebridades e professora da PUC-Minas, Fernanda Medeiros observa que “o interesse na vida pessoal dos artistas existe desde o século 18, ou até antes, de acordo com alguns autores”.

Ela aponta que “artistas sempre carregaram uma aura especial na perspectiva do público, mas há uma evolução e um amadurecimento dessa perspectiva, que faz o público deixar de perceber essa aura e enxergar a celebridade como ‘gente como a gente’”.

Fernanda Medeiros integra o Grupo de Pesquisa em Imagem e Sociabilidade da UFMG (GRIS). Segundo ela, as transformações midiáticas ajudam a entender o fenômeno. 

Jean-Baptiste Lacroix/AFP
Kim Kardashian abordou o distúrbio bipolar do marido, Kanye West, e pediu empatia (foto: Jean-Baptiste Lacroix/AFP )

EVOLUÇÃO “São vários aspectos sociais que dizem sobre essa evolução. Se  formos pensar num modelo de celebridade mais tradicional, elas tinham que chegar ao público através de determinadas mídias hegemônicas. Um filme ou uma novela, no Brasil, por exemplo. As chamadas novas mídias saem dessa hegemonia. No Instagram, por exemplo, há a prática de mostrar o bastidor. Então, a fama vai sendo desmitificada. Antes das redes sociais só era possível saber da vida das celebridades pelas revistas de fofoca. Ou seja, a vida pessoal delas chegava ao público cheia de mediações - do jornalista, do assessor, da maquiagem. O que vemos hoje é um número bem menor de camadas de mediação, já que cada artista ou celebridade tem a chance de se colocar em primeira pessoa nas redes sociais”, afirma a pesquisadora.

As possibilidades que as novas mídias deram ao público, de maior autonomia para acompanhar, interagir e escolher, têm seu correspondente na atitude das celebridades de se expor e até mesmo atender demandas nesse sentido. 

“O público quer saber detalhes, saber sobre tudo que não está ao alcance dos olhos, desde sempre. Em muitos casos, é mais um desejo do público atendido do que uma vontade própria de se expor”, diz a pesquisadora, ressaltando as muitas diferenças de perfis entre as celebridades. 

No caso, por exemplo, de Whindersson Nunes, que durante a quarentena se separou da cantora Luísa Sonza e nunca demonstrou dificuldade em falar sobre o assunto em suas redes sociais, Fernanda Medeiros observa que pesa o fato de o humorista ter despontado para o estrelato já nesse ambiente, como influenciador digital.  

Até que ponto essa autoexposição é realmente autêntica é um aspecto a ser considerado. Dedicada a estudar a performance da polêmica influenciadora digital Gabriela Pugliesi, Fernanda Medeiros cita o caso da blogueira Gabriela Pugliesi como exemplo. 

“Ela começou a falar sobre fitness em 2012, quando pouca gente o fazia. Mas isso é ser autêntico? Muita gente acha que sim, muita gente acha que ela finge várias situações que compartilha. Mas muita gente tenta trilhar um caminho semelhante ao dela e não consegue. O público escolhe em quem vai acreditar.”

Ali Karakas/Divulgação
Gabriela Pugliesi foi alvo da cultura do cancelamento, ao exibir uma festa durante a pandemia (foto: Ali Karakas/Divulgação )

ROTINA Elevada ao posto de celebridade por sua trajetória como blogueira de temas ligados ao corpo, forma física e alimentação traduzidos como estilo específico de vida, Pugliesi tem mais de 4 milhões de seguidores no Instagram. 

Por lá ela compartilha detalhes de sua rotina. Inclusive uma festa que ofereceu durante a pandemia do novo coronavírus. A reação foi tão intensa que a blogueira se afastou temporariamente das redes sociais. 

“A medida em que o público cancela algumas figuras públicas, também mostra para a sociedade e para outras figuras públicas onde estão seus interesses desejos, e expectativas. Isso é interessante de observar na cultura do cancelamento”, diz Medeiros. 

Entretanto, a pesquisadora também questiona a validade de tal atitude. “Cancelaram a Anitta, mas cancelaram mesmo? A Pugliesi foi cancelada nas redes sociais, mas não perdeu contratos, voltou a ter gente seguindo. Não defendo a cultura do cancelamento, mas ela diz muito sobre quem está cancelando. Da mesma forma, determinadas pessoas são famosas porque o público as fez famosas. Isso diz muito sobre um novo papel do público na comunicação. É como se estivesse em outro patamar”, argumenta.

Nesse contexto, além de aspectos de sua vida pessoal e intimidade, artistas e famosos também vêm expondo engajamento em causas de interesse e posicionamento político. Não só em mensagens nas redes, como em atitudes. 

Nos EUA, alguns artistas aderiram aos protestos contra o racismo e a violência policial, depois do assassinato de George Floyd. Foi o caso da diva pop Ariana Grande, da modelo e atriz Emily Ratajkowski e do ator Timothée Chalamet.

Segundo a pesquisadora, a pandemia pode colaborar com as mudanças que fazem parte do fenômeno. “Temos percebido nos últimos meses que há certa revisão e questionamento dos valores que orientam a relação público-celebridade. Pessoas vivendo dificuldades, pela doença, pelo desemprego, passam a questionar a postura da celebridade que posta que a vida dela é linda”, observa.

Ela ainda cita o filósofo francês Edgar Morin, de 99 anos, um dos mais reverenciados no estudo das celebridades. “Ele trata as celebridades como deuses olimpianos. Metade deuses e metade pessoas normais. É um jeito de olharmos para celebridades. São figuras públicas, que carregam essa face, do glamour da fama, mas ao mesmo tempo são pessoas. Essa divindade da figura pública está sendo apagada, muito em função do movimento relacional das comunicações por causa do público”, afirma.

PAZ Na complexidade dos novos formatos midiáticos, ainda há aqueles que preferem resguardar sua privacidade e expor a própria figura apenas em ocasiões profissionais. Kim Kardashian, autoridade em termos de compartilhamento da própria intimidade, mundialmente famosa pela participação no reality show Keeping up with the Kardashians, que tinha justamente esse foco, fez um clamor por um pouco de paz. Pelo menos em nome do marido, Kayne West.

O rapper, candidato à presidência dos EUA, vem surpreendendo o público com uma série de declarações inusitadas, muitas delas sobre o relacionamento com Kim, que segundo ele, teria tentado interná-lo por conta de seu transtorno bipolar. Diante de muito alvoroço, a socialite fez um apelo nas rede sociais, pedindo que “esqueçam” um pouco de West.

“Eu nunca falei publicamente sobre como isso tem nos afetado em casa, porque eu sou muito protetora em relação aos meus filhos e ao direito de Kanye à privacidade quando se trata da saúde mental dele. Mas, hoje, sinto que devo comentar sobre isso por causa do estigma e equívocos sobre a saúde mental. Aqueles que entendem a doença mental ou mesmo o comportamento compulsivo sabem que a família não tem poder, a menos que o membro (afetado pelo distúrbio) seja menor de idade. As pessoas que desconhecem ou estão distantes dessa experiência podem julgar e não entender que o próprio indivíduo precisa se engajar no processo de obter ajuda, por mais que a família e os amigos tentem", publicou Kim, que, segundo o site TMZ, proibiu as câmeras do Keeping up with the Kardashians de registrar qualquer coisa sobre os problemas psicológicos do marido. 

Mas há também uma lista de celebridades que prefere se manter longe das redes sociais. Figuras como as atrizes Kristen Stewart, Sandra Bullock, Angelina Jolie, Julia Roberts e Scarlett Johansson não têm um perfil no Instagram ou no Twitter. 

O mesmo vale para os atores George Clooney, Keanu Reeves, Brad Pitt, o “Harry Potter” Daniel Radcliffe, entre muitos outros. No Brasil, grandes nomes do cinema e da TV também se resguardam nesse sentido. É o caso do ator Wagner Moura e da atriz Adriana Esteves, por exemplo.  

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