Brasil perde Modesto Carone, o tradutor de Kafka

Escritor e intelectual paulista traduziu praticamente toda a obra do autor tcheco para o português do Brasil. Professor, deu aulas na USP, Unicamp e na Universidade de Viena

Estado de Minas 17/12/2019 06:00
acervo
Modesto Carone ganhou o Prêmio Jabuti com o livro Resumos de Ana (foto: acervo)
O escritor, ensaísta e tradutor Modesto Carone morreu na segunda-feira (16), aos 82 anos. Principal tradutor de Franz Kafka no Brasil, ele foi também professor universitário em São Paulo, Campinas e Viena. O corpo do intelectual será velado nesta terça-feira (17), no Salão Nobre da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista.

Carone começou a traduzir Kafka justamente pela obra mais célebre do tcheco, A metamorfose, em 1983. Até 2002, verteu para o português toda a obra do escritor.

Modesto também publicou diversos ensaios, contos e a novela Resumos de Ana (1998), livro vencedor do Prêmio Jabuti no ano seguinte. Em 1999, também recebeu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) de melhor livro de ensaio/crítica por Lição de Kafka.

Nascido em 1937 em Sorocaba (SP), Carone concluiu o bacharelado na Faculdade de Direito do Largo São Francisco no início da década de 1960. Mudou-se para a Áustria em 1965, para ser professor de língua e cultura brasileira na Universidade de Viena.

No retorno ao Brasil, poucos anos depois, fez doutorado em letras anglo-germânicas na Universidade de São Paulo (USP). Em 1975, recebeu o título de livre-docente em letras e literatura comparada.

Sua estreia na literatura ocorreu com o livro de contos As marcas no real (1979). Dois anos depois, iniciou sua carreira no Instituto de Letras da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde permaneceu por 15 anos.

A partir de 2000, trabalhou como professor visitante do Departamento de Teoria Literária da Faculdade de Letras da USP.

A maior parte da sua obra no Brasil foi editada pela Companhia das Letras, que lamentou a morte do intelectual nas redes sociais.

Outras instituições, colegas, leitores e admiradores do intelectual também usaram a internet para prestar homenagens. “Uma das coisas bonitas que tive a oportunidade de ver: Modesto Carone falando sobre traduzir Kafka e Freud, sobre se aproximar do texto de partida e se preocupar fazê-lo soar em português parecendo simples, ainda que carregue ideias complexas. Vá em paz, professor”, escreveu a jornalista e tradutora Stephanie Borges.

“Morreu Modesto Carone, escritor e tradutor literário, principal responsável por verter a obra de Franz Kafka para o português. Em homenagem, o IMS relembra sua tradução dos Aforismos reunidos do escritor tcheco, publicados na revista Serrote nº 1”, registrou o Instituto Moreira Salles.

“Dia triste. Morreu Modesto Carone, maior tradutor de Kafka para o português, autor de O resumo de Ana, um dos livros que adoro”, lamentou Kelly Marciano, escritora e conterrânea do intelectual.

KAFKA POR CARONE
“O verdadeiro caminho passa por uma corda que não está esticada no alto, mas logo acima do chão. Parece mais destinada a fazer tropeçar do que a ser percorrida.”

“Muitas sombras dos que morreram ocupam-se apenas em lamber as ondas do rio dos mortos, porque ele corre a partir de nós e ainda tem o gosto salgado dos nossos mares. O rio então recua de nojo, flui em sentido contrário e atira os mortos de volta à vida. Estes, porém, estão felizes, cantam canções de graça e acariciam o fluxo indignado.”

“A partir de certo ponto não há mais retorno. É este o ponto que tem de ser alcançado.”

. Aforismos reunidos, de Franz Kafka, tradução de Modesto Carone para a revista Serrote (IMS)


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