Autor desvenda queda da indústria musical

por Guilherme Sobota 19/09/2015 08:30

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Carlo Allegri/REUTERS
O magnata da indústria musical Doug Morris (D), que "escorregou na banana do mp3", mas se reergueu idealizando o canal Vevo (foto: Carlo Allegri/REUTERS)

Com pitadas de thriller jurídico, informações didáticas sobre a gênese tecnológica do mp3 e dois perfis jornalísticos carregados de empatia, o jornalista americano Stephen Witt monta um tripé consistente para explicar, em novo livro publicado aqui pela Intrínseca, Como a música ficou grátis.

Lançado em junho nos EUA, o livro-reportagem recebeu elogios de todos os cantos – inclusive foi pirateado antes de ser publicado, o que, segundo o autor, é como um prêmio (“não que os meus editores concordem”).

Em pouco mais de 270 páginas, Witt narra a possante ascensão do formato mp3 e da era do computador pessoal e como isso afetou a grande indústria da música, que teve o faturamento global reduzido três vezes em um período de poucos anos. Só isso daria uma grande história, mas Witt foi além e arranjou o personagem dos sonhos para qualquer escritor de não ficção interessado no assunto: Bennie Lydell Glover, um até então anônimo morador de Shelby, cidade de 15 mil habitantes a 20 minutos da fábrica de CDs da Polygram (depois EDC, braço do Universal Music Group), em Kings Mountain, Carolina do Norte, EUA.

Em 1995, “Dell” Glover iniciou sua carreira no chão de fábrica talvez ainda sem pistas de que se tornaria “o paciente zero da pirataria” mundial. Witt o encontrou ao fuçar justamente os processos do Departamento de Justiça dos EUA – um deles fez Glover passar três meses na cadeia, em 2010. Basicamente por ter sido o mais importante membro do RNS, um grupo da Scene on-line que compartilhava arquivos desde os primórdios da web pessoal.

Até 2009, em 11 anos, o RNS vazou mais de 20 mil álbuns, muitos deles oriundos da fábrica em que Glover trabalhava – discos de Eminem, 50 Cent, Foo Fighters, Strokes, Beyoncé, Madonna, Morrissey, Korn, My Chemical Romance e muitos outros. “Ele foi a principal fonte e ponto de conexão de centenas de milhões – talvez até bilhões – de arquivos mp3 duplicados. E, por causa da posição predominante da Universal nesse período, era improvável que houvesse uma única pessoa com menos de 30 anos cuja lista do iPod não incluísse um mp3 ligado a Glover”, escreve Witt. “Foi o maior pirata de música de todos os tempos.”

PERFIL

“É ilegal”, comenta Witt, sobre o compartilhamento de músicas na web. “Você pode se envolver em muitos problemas, ser processado, até mesmo ir para a prisão. Moralmente, apesar disso, a questão ainda está aberta”, opina – atualmente, ele escreve sobre tecnologia em jornais. Testemunha da entrada dos computadores pessoais na vida de todo mundo e da popularização do acesso à internet e do mp3, Witt traça no livro um outro perfil importante: o de Doug Morris, magnata da indústria musical que esteve à frente das três maiores gravadoras dos EUA.

Julgá-lo como inimigo seria fácil: Witt vai além e narra, apesar de tudo, a bem-sucedida carreira de Morris, que, como a maioria dos seus colegas, escorregou na banana do mp3, mas que nos últimos anos conseguiu se levantar. Ele hoje pode se gabar de ser um dos idealizadores do Vevo, canal de streaming pioneiro no quesito “fazer dinheiro”.

Witt também toca nesse assunto. “Lá por 2007, 2008, as pessoas começaram a mudar do ambiente de desktop para o ambiente móvel, que é muito mais centralizado, e aí, sim, os caras da tecnologia foram capazes de recapturar o controle”, analisa. “É mais difícil piratear coisas diretamente no smartphone. Foram criadas várias barreiras.”

Para ele, essa é uma das razões de as pessoas mais jovens terem parado de piratear. “As gravadoras erraram muito nos anos 1990, mas não vão cometer os mesmos erros novamente. Eles calcularam o jogo do streaming”, afirma ainda Witt.

Mas nem todos estão satisfeitos com a nova “revolução”. Taylor Swift e Neil Young são dois exemplos. Por aqui, a Associação Procure Saber se mantém nos noticiários e nas redes sociais reivindicando pagamentos mais justos. Os serviços não abrem faturamento nem número total de streamings, dois dados fundamentais nas fórmulas de cálculo de remuneração. Witt assinala que eles são parte fundamental do futuro da indústria.

“Uma assinatura custa para o consumidor US$ 120 por ano. É muito dinheiro. 70% acabam sendo pagos para detentores dos direitos (gravadoras, distribuidoras, compositores e músicos). Em última instância, quando centenas de milhões de pessoas estiverem assinando os serviços, isso representará dezenas de bilhões de dólares em receita”, explica. Para uma indústria que parecia destinada ao declínio contínuo, o número parece bem atraente. (Estadão Conteúdo)

COMO A MÚSICA FICOU GRÁTIS
. Autor: Stephen Witt
. Tradução: Andrea Neves
. Editora: Intrínseca
. 272 págs., R$ 39

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